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18 janeiro 2008

JUDICIÁRIO E POLÍTICA PARTIDÁRIA NO BRASIL

O Judiciário e a amarelinha da oposição

A quantas andará o Estado de Direito quando um juiz da mais alta instância do Poder Judiciário do país orienta uma das partes e antecipa o veredicto? O que temos aqui?

Gilson Caroni Filho
Agência Carta Maior

O jogo da oposição, nos primeiros dias de 2008, guarda semelhanças com uma brincadeira infantil que povoa a memória da maioria dos adultos: o jogo da amarelinha. Com pequenas variações, o modo de brincar é sempre o mesmo. No transcurso da peleja, não vale deixar a pedra cair ou pisar na linha. Se uma das duas coisas ocorrer, a criança perde a vez e tem que torcer pelo erro do adversário para ter uma nova chance.

Tentando evitar tropeços e chegar ao "céu", a oposição conservadora risca o chão com uma trinca cada vez mais articulada: a judicialização da política, a politização do judiciário e a partidarização da imprensa. Com ela tenta manter o equilíbrio, evitando colocar as mãos no solo ou pisar fora dos limites das casas.

No que diz respeito ao papel desempenhado pelo Judiciário, o ministro do Supremo Tribunal Federal, juiz Marco Aurélio Mello é significativo demais para ser ignorado. Com sua atração por holofotes, tem se notabilizado por ignorar o insulamento jurídico, jogando-se de corpo e alma em um ativismo preocupante para a democracia.

Embaralhando as fronteiras entre a aplicação da lei e as demandas políticas, os posicionamentos de Mello demonstram a disposição de tratar questões jurídico-legais como ator engajado, sempre ao sabor das circunstâncias mais favoráveis ao demo-tucanato. Para tal empreitada, conta com o apoio da grande imprensa, sempre pronta a apresentá-lo como dono do giz que risca o traçado do jogo. Se for o caso, novas linhas sempre poderão ser reinventadas. O importante é colocar uma pedra em cada projeto do governo, ir saltando num só pé através de todo arcabouço legal e voltar em 2010, com o derrotado projeto de sucateamento do país.

Ao repetir a ação do DEM (PFL), que na segunda-feira (07/01) havia protocolado Ação direta de inconstitucionalidade (Adin) contra a elevação da alíquota do IOF, os tucanos, na verdade, já contavam com respaldo jurídico prévio. Vejamos o jogo de perto. Em 2 de janeiro, Marco Aurélio Mello afirmou que, caso fosse provocado, o tribunal deveria derrubar o mecanismo criado pelo governo que obriga instituições financeiras a repassarem semestralmente à Receita Federal dados sobre a movimentação financeira de pessoas físicas e jurídicas. A quantas andará o Estado de Direito quando um juiz da mais alta instância do Poder Judiciário do país orienta uma das partes e antecipa o veredicto?

Dois dias depois, o ministro, que preside o TSE, voltaria à carga, dessa vez, sobre a elevação das alíquotas sobre a Contribuição sobre Lucro Líquido (CSLL) que incide somente no sistema financeiro. Para o ministro, o reajuste sobre a atividade bancária pode ser contestado na Suprema Corte. Segundo ele, havia inclusive um parecer de sua autoria em que ele considera que o "princípio da anterioridade" também se aplica para majorações muito elevadas de contribuições. Por este princípio, o governo não pode criar um novo imposto ou contribuição e aplicá-la no mesmo ano.

O que temos aqui? Uma instância fiscalizadora ou um ministro que incorpora o cargo de Procurador-Geral da Oposição? Pode um governo ser subtraído de instrumentos fiscais que viabilizem sua política macroeconômica ou democracia se confunde com política de terra arrasada?

Em entrevista ao jornal Estado de S. Paulo, em outubro de 2007, o cientista político Fábio Wanderley, manifestava preocupação com a interferência direta do Judiciário na política, dando como exemplos a fidelidade partidária, a cláusula de barreira e a verticalização. Para ele "a excessiva “judicialização” da vida política pode conduzir a outro extremo: a “politização” do Judiciário, quando juízes demonstram parcialidade de um lado ou outro, trazendo a insegurança jurídica a todo o processo político".

Quando o STF torna-se instância fundadora da vida política e um juiz apresenta-se como ser intocável, aparentemente acima de particularismos, duas coisas perigosas estão ocorrendo: a hipertrofia de um dos Poderes e a desmoralização da representação política. As primeiras casas da amarelinha da oposição não apontam para o aperfeiçoamento democrático. Muito pelo contrário. As linhas são erráticas. Trata-se de acuar o Estado, mesmo sabendo que, quando ele recua, quem avança é o mercado. E esse prescinde de conceitos vagos como direitos sociais e cidadania. Todo cuidado é pouco quando o reacionarismo dá o tom com toga e mídia a seu bel-prazer.

Gilson Caroni Filho é professor de Sociologia das Faculdades Integradas Hélio Alonso (Facha), no Rio de Janeiro, e colaborador do Jornal do Brasil e Observatório da Imprensa.