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28 novembro 2008

AIDS NO BRASIL

Pesquisa comprova que, quanto maior a vulnerabilidade, maior o risco de não-adesão ao tratamento anti-retroviral

Fernanda Marques
Agência Fiocruz de Notícias

Analisar a relação entre a vulnerabilidade ao HIV e a não-adesão ao tratamento anti-retroviral foi o objetivo de um estudo feito em Belo Horizonte. Pesquisadores da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) entrevistaram cerca de 300 portadores do HIV atendidos por duas instituições públicas de referência em Aids. Os resultados mostraram que se trata de uma população muito heterogênea, com grupos expostos à grande vulnerabilidade, e que a incidência de não-adesão ao tratamento é elevada. O estudo gerou um artigo publicado na edição de novembro da revista Cadernos de Saúde Pública, periódico científico da Fiocruz.

A não-adesão ao tratamento anti-retroviral pode trazer conseqüências que vão além dos prejuízos à saúde do próprio paciente. Somada a comportamentos de vulnerabilidade, como relações sexuais sem camisinha, essa não-adesão expõe ao risco do HIV as pessoas com quem o paciente se relaciona. Por outro lado, pesquisas já constataram também que, devido ao sucesso do tratamento anti-retroviral, capaz de reduzir a carga de HIV e garantir aos indivíduos uma vida normal, alguns pacientes acabam se descuidando: por exemplo, por se sentiram bem, acreditam equivocadamente que podem, às vezes, abrir mão dos medicamentos e da camisinha.

No estudo em Belo Horizonte, participaram pacientes que estavam recebendo sua primeira prescrição médica de anti-retrovirais. Eles foram entrevistados quando retornavam aos centros de saúde para o acompanhamento médico de rotina. Nessas entrevistas, os pesquisadores observaram que cerca de 37% dos pacientes relataram algum episódio de não-adesão ao tratamento – definido como a ingestão de menos de 95% da dose prescrita de um anti-retroviral ao longo dos três dias anteriores à consulta médica. Quanto ao uso da camisinha, entre aqueles que relataram atividade sexual no mês anterior, 35% praticaram sexo sem preservativo.

“Os participantes, em sua maioria, tinham entre 30 e 39 anos de idade, eram do sexo masculino, afrodescendentes e de baixa renda, compreendiam a necessidade de tomar os anti-retrovirais e contaram ser portadores do HIV para alguém próximo”, dizem no artigo a pesquisadora Palmira de Fátima Bonolo e co-autores. Apesar dessas características atribuídas à média dos participantes, estes constituíam uma população bastante diversificada. A metodologia utilizada pelos pesquisadores (chamada Grade of Membership) permitiu dividir os entrevistados em três grupos (P1, P2 e P3), em ordem crescente de vulnerabilidade ao HIV.

No grupo P1 foram incluídos indivíduos com três características de vulnerabilidade: ser do sexo feminino, ter uma razão pessoal e uma indicação médica para fazer o teste do HIV e não ter contado a ninguém sobre o resultado positivo do exame. Já o grupo P2 era formado por indivíduos com sete características de vulnerabilidade, entre as quais uso irregular de camisinha e consumo de álcool no último mês. Por fim, os indivíduos do grupo P3 apresentavam 14 categorias de vulnerabilidade, como não ter parceiro sexual fixo e usar drogas ilícitas.

De acordo com o estudo, o grupo P3 teve uma maior associação com a não-adesão ao tratamento anti-retroviral. Por isso, os pesquisadores recomendam que os profissionais da saúde fiquem mais atentos às vulnerabilidades dos pacientes, especialmente daqueles com perfil P3. “Com base nos perfis encontrados no estudo, os profissionais da saúde deveriam focar nas vulnerabilidades individuais tais como ser jovem, julgar que não precisa dos anti-retrovirais e viver sozinho, de modo a oferecer a estes pacientes aconselhamento médico contínuo e encaminhá-los aos grupos alternativos de apoio, por exemplo, às organizações não-governamentais”, sugerem os autores no artigo.

Foto: Grupo de percussão Batalá, durante manifestação em Brasília para lembrar o Dia Mundial de Luta contra a Aids, em 2007 (Roosewelt Pinheiro/Agência Brasil)