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21 janeiro 2008

O MITO DA DESCENTRALIZAÇÃO DA SAÚDE

Descentralização de serviços de saúde prejudicou o combate à leishmaniose no Paraná

Renata Moehlecke
Agência Fiocruz de Notícias

Avaliar as mudanças ocorridas no atendimento ambulatorial oferecido aos pacientes de leishmaniose tegumentar americana antes e após a descentralização do serviço de saúde pública em 11 municípios da região noroeste do estado do Paraná. Esse era o objetivo do estudo realizado por pesquisadores da Universidade Estadual de Maringá, que concluiu: o rigor no auxílio aos doentes diminuiu. A pesquisa foi publicada na edição de dezembro da revista Cadernos de Saúde Pública da Fiocruz e, segundo dados do Ministério da Saúde (MS) apresentados, a incidência da doença no Brasil tem aumentado nos últimos 20 anos. Dos cerca de 12 mil e 300 casos registrados no Sul do país (entre 1980 e 2003), 99,3% se encontraram na área analisada.

O flebotomíneo, vetor da leishmaniose tegumentar americana (Foto: Sucen)

No artigo, os pesquisadores explicam que, até 2002, a estruturação do atendimento aos pacientes da doença era realizado de forma centralizada, ou seja, concentrado no ambulatório de especialidades do Centro Noroeste do Paraná (Ciscenop), referência regional para as doenças dermatológicas de interesse em saúde pública. Em 2002, a descentralização do serviço foi iniciada de forma gradual, incluindo os municípios com maior prevalência da enfermidade, a fim de facilitar o acesso da população local ao diagnóstico, ao tratamento e melhorar o acompanhamento dos pacientes. O processo atingiu todos os municípios da região avaliada em 2003.

Para análise, os pesquisadores verificaram informações contidas nos prontuários de 288 pacientes diagnosticados com leishmaniose tegumentar americana entre os anos de 2001 e 2004, segundo os indicadores epidemiológicos (faixa etária, sexo, escolaridade, área residencial rural ou urbana etc) e operacionais (diagnóstico laboratorial, acompanhamento, desfecho do caso, cura clínica, abandono, óbito e outros) do MS. “Observou-se que no atendimento centralizado a avaliação clínica e os registros médicos foram mais completos e criteriosos; o tratamento iniciou-se mais prontamente”, afirmam os estudiosos, que complementam que houve o acompanhamento do desfecho da doença em 95% dos pacientes e em 100% dos casos combatidos com duas séries de tratamento. Após a descentralização, “detectou-se que 72,6% do acompanhamento dos pacientes foi inadequado e 84% das avaliações clínicas não foram realizadas”.

Os pesquisadores destacam que no atendimento centralizado, o número de pacientes que atingiu a cura clínica foi de 95%. Já no descentralizado, foi de 75%. “O que pode ser explicado pelo acompanhamento inadequado dos pacientes no decorrer do tratamento, visto que o número de prontuários sem registro no final do tratamento foi estatisticamente significante”, comentam. Além disso, eles apontam que os doentes tiveram maior número de consultas médicas e de enfermagem no auxílio centralizado e que os exames clínicos nesse foram mais criteriosos e detalhados. Outro aspecto que chamou atenção dos cientistas foi o fato de que em 80% dos casos de atendimento descentralizado a pacientes com mais 50 anos de idade, não foi efetuado um acompanhamento rigoroso. “Os pacientes acima desta faixa etária requerem maior atenção, pois há restrições para o tratamento deles”.

O estudo demonstrou, de acordo com os pesquisadores, que não houve benefícios significativos com a descentralização dos serviços de saúde no combate a leishmaniose tegumentar americana e nem melhoras na qualidade da informação sobre os pacientes da doença. “Esforços devem ser empreendidos para melhorar a qualidade do atendimento pelas equipes”, sugerem. “Para tanto é necessário maior sensibilização dos profissionais a fim de valorizarem adequadamente o papel da informação em saúde, melhorando a qualidade dos registros dos procedimentos nos prontuários dos serviços”.