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09 março 2010

COMA INDUZIDO EM HOSPITAIS PÚBLICOS ACREANOS: ATESTADO DE ÓBITO ANTECIPADO?

Será que tem algo de errado com a UTI da Fundação Hospitalar? Porque tanta infecção hospitalar?

Evandro Ferreira
Blog Ambiente Acreano

Algumas semanas atrás perdi um sobrinho. Meu primeiro sobrinho, o Henry Evaristo Macambira. Ele faleceu na UTI da fundação hospitalar.

A causa da morte foi infecção generalizada derivada de pneumonia grave e infecção hospitalar. Um amigo médico que leu o atestado de óbito disse que a maior razão da morte dele foi mesmo a infecção hospitalar.

Segundo ele, morte por complicações derivadas de pneumonia nos dias de hoje é coisa rara. E quando ocorre, é mais comum em idosos ou crianças prematuras, ou em pessoas com histórico de doenças e outras complicações de saúde. Em adultos com 35 anos de idade com a saúde relativamente boa é quase impossível. O Henry, a despeito do excesso de peso, não era portador de nenhuma doença grave.

Ele foi internado em meados de janeiro no Pronto Socorro com um quadro de pneumonia grave e com muita dor. Por mais grave que fosse a sua situação, imagino que um tratamento adequado teria resolvido o problema. No entanto, antes de morrer na UTI da Fundação Hospitalar depois de quase um mês de internação, ele foi induzido ao coma, seu rim paralisou e ele passou a ser submetido a hemodiálise. Foi feito ainda uma traqueostomia.

Não pude visitá-lo, mas minhas irmãs foram lá várias vezes. E pelo que me contaram o índice de infecção hospitalar em pacientes internados na UTI da Fundação deve ser bem alto. Elas observaram que apesar dos visitantes terem de vestir roupas apropriadas para adentrar no recinto onde ficam os pacientes, médicos e enfermeiras entram e saem do ambiente, muitas vezes para tirar dúvidas de familiares dos internos, usando a mesma roupa. Em ambientes de UTI essa é uma situação de risco para os pacientes.

No Acre isso não é surpresa para ninguém. Quem nunca viu médicos e enfermeiros do Pronto Socorro atravessando a rua para ir almoçar ou lanchar em restaurantes das redondezas vestidos com as mesmas roupas que mais tarde estarão usando para atender pacientes nas mais variadas condições?

O corpo do Henry não suportou a sobrecarga a que foi submetido. Morreu na madrugada da terça-feira de carnaval.

O que podemos pensar? Erro médico? Não sabemos. Nunca saberemos.

O que sei de concreto é que do ponto de vista de trabalho demandado e tempo consumido para executar procedimentos médicos, é mais 'fácil' cuidar de alguém em coma (induzido) que não fala, não reclama de dor, não questiona, não expressa o que sente, do que alguém que pode se comunicar - inclusive via gestos -, que pode informar se algo está errado, que talvez seja melhor mudar de médico ou de hospital.

E com a instalação de leitos de UTI nos hospitais públicos locais, induzir coma em pacientes parece estar se tornando um procedimento corriqueiro no Acre. Embora facilite o trabalho da equipe de atendimento, ele aumenta sobremaneira o risco de morte do paciente.

[...]

Na semana passada estava contando o caso para os colegas de trabalho e fui surpreendido pela informação, por parte de um deles, que uma amiga também tinha facelido de infecção hospitalar na UTI da Fundação.

O caso foi similar: seu coma foi induzido e depois de algumas semanas ela faleceu.

Portanto, muito cuidado quando médicos de hospitais públicos informarem que irão 'induzir coma' em parentes internados para facilitar o seu tratamento e recuperação. Indução de coma é algo extremo e se aplica mais frequentemente em pacientes internados com doenças/acidentes neurológicos.

Nota do Blog: em uma rápida busca bibliográfica, encontrei um trabalho que deixa claro os riscos de morte para pacientes em UTIs de unidades hospitalares brasileiras.

"Pereira et al. (2000), afirmam que "Embora, os leitos destinados para terapia intensiva representem menos de 2% dos leitos hospitalares disponíveis no Brasil (PEDROSA, 1999), eles contribuem com mais de 25% das infecções hospitalares, com significativo impacto nos índices de morbidade e mortalidade (PEDROSA, 1999; TRILLA, 1994). Em muitos serviços as taxas [de mortalidade] chegam a ser 5-10 vezes maior neste grupo de pacientes (TRILLA, 1994)."

Referências citadas:

PEREIRA, M. S.; PRADO, M. A.; SOUSA, J. T.; TIPPLE, A. F. V.; SOUZA, A. C. S. - Controle de Infecção Hospitalar em Unidade de terapia Intensiva: desafios e perspectivas. Revista Eletrônica de Enfermagem (online), Goiânia, v.2, n.1, out-dez. 2000. Disponível: http://www.revistas.ufg.br/index.php/fen

RILLA, A. Epidemiology of nosocomial infections in adult intensive care units. Intensive Care Med., 20 (suppl. 3): 51-4, 1994.

PEDROSA, T.M.G. & COUTO, R. C. Prevenção de infecção em terapia intensiva de adultos e pediátrica. In: COUTO, R. C. ; PEDROSA, T. M. G.; NOGUEIRA, J.M. Infecção Hospitalar: epidemiologia e controle. Belo Horizonte: MEDSI, 1999. p. 527.