‘ESTRADAS PARA A DESTRUIÇÃO’ NO INTERIOR DO ACRE
Evandro Ferreira
Blog Ambiente Acreano
[Revisado e corrigido em 22/04/2015]
[Revisado e corrigido em 22/04/2015]
Já faz alguns anos que políticos em
campanha fazem promessas de abrir estradas para ‘tirar do isolamento’ as
cidades de Santa Rosa do Purus, Jordão, Porto Valter e Marechal Taumaturgo. Detalhe:
desde sempre todas essas cidades são acessíveis por rios e as estradas
prometidas deverão ser construídas paralelas a esses rios, rasgando áreas de
florestas pristinas.
[Foto ICMBIO/RO]
Esses políticos já deveriam ter aprendido que a abertura de estradas na Amazônia nem sempre é sinônimo de progresso econômico porque na maioria das vezes o caos social e ambiental chega junto com as mesmas. Em Rondônia, aqui ao lado, todas as cidades estão integradas por estradas. O custo dessa integração, entretanto, foi a maior taxa de desmatamento entre todos os Estados da Amazônia brasileira e sob o ponto de vista ambiental a situação em nosso vizinho pode ser classificada como um desastre sem precedentes. No Acre temos um desastre ambiental em gestação: uma estrada ‘pirata’ aberta entre a cidade de Jordão, no alto rio Tarauacá, e a comunidades de Novo Porto, no alto rio Muru. Com apenas 40 km de extensão e cortando terras públicas e particulares, a via foi construída com recursos do governo estadual sem licenças ou estudos de impacto ambiental.
[Foto ICMBIO/RO]
Esses políticos já deveriam ter aprendido que a abertura de estradas na Amazônia nem sempre é sinônimo de progresso econômico porque na maioria das vezes o caos social e ambiental chega junto com as mesmas. Em Rondônia, aqui ao lado, todas as cidades estão integradas por estradas. O custo dessa integração, entretanto, foi a maior taxa de desmatamento entre todos os Estados da Amazônia brasileira e sob o ponto de vista ambiental a situação em nosso vizinho pode ser classificada como um desastre sem precedentes. No Acre temos um desastre ambiental em gestação: uma estrada ‘pirata’ aberta entre a cidade de Jordão, no alto rio Tarauacá, e a comunidades de Novo Porto, no alto rio Muru. Com apenas 40 km de extensão e cortando terras públicas e particulares, a via foi construída com recursos do governo estadual sem licenças ou estudos de impacto ambiental.
Em diversas regiões do Brasil, onde
mais de 50% das cargas trafegam por rodovias, geralmente a abertura de estradas
resulta em benefícios à região recém-integrada, com destaque para o acesso a outras
cidades com melhores hospitais e escolas, e centros
financeiros estruturados. Na Amazônia, entretanto, abrir estradas ligando
pequenas comunidades isoladas, como as do interior do Acre, geralmente resultam
em problemas ambientais, exploração florestal ilegal, conflitos agrários e
violência. Em 2006, quando a ocupação, a exploração e o desmatamento na Amazônia
estavam no seu auge, o Mapa da Violência dos Municípios Brasileiros mostrava
que cinco das dez cidades mais violentas do país localizavam-se na região.
Uma das primeiras consequências da
abertura de estradas na Amazônia é o desmatamento, visto por muitos como um
passo indispensável para o progresso. Pesquisas científicas, entretanto, mostram
que o desmatamento não é sinônimo de progresso. Um estudo realizado por pesquisadores
brasileiros e ingleses publicado em 2009 na prestigiosa revista científica Science concluiu que pessoas em
municípios da Amazônia brasileira que derrubaram suas florestas não viviam
melhor do que aquelas estabelecidas em lugares onde houve pouco desmatamento.
O estudo, que comparou 286 municípios em diferentes estágios de desmatamento,
demonstrou que a prosperidade gerada pela destruição da floresta é temporária e
caracteriza-se por uma rápida ascensão e queda na economia local. Além disso, regiões
muito desmatadas geralmente apresentavam piores IDH (Índice de Desenvolvimento
Humano), ou seja, maior analfabetismo e menores expectativas de vida e renda
per capita.
Aos que defendem cegamente a ligação
terrestre das cidades isoladas do interior do Acre é importante esclarecer que
as possíveis vantagens da integração – acesso o ano inteiro, barateamento nos preços
dos produtos de primeira necessidade, entre outros – não tem garantia de
perenidade. Vejam que dificuldades financeiras dos governos Federal e Estadual
deixaram a rodovia BR-364 entre Rio Branco e Cruzeiro do Sul sem manutenção. Resultado:
fechamento da estrada – por algumas horas, é verdade – nesse final de período
chuvoso. Como as condições econômicas do país não irão melhorar nos próximos
meses, essas interrupções poderão ser tornar recorrentes. Se você leitor
acredita que em Feijó e Tarauacá o preço dos alimentos de primeira necessidade
e dos combustíveis – agora transportados pela BR-364 a partir de Rio Branco –
são mais acessíveis que no passado, sugiro uma visita in loco para comprovar que, apesar da maior diversidade e oferta de
produtos no mercado, os preços estão na estratosfera e poucos moradores podem adquiri-los de forma regular.
Se por um lado é inegável que a pavimentação
da BR-364 facilitou o acesso e diminuiu consideravelmente o custo para chegar a
Rio Branco, onde os hospitais e as escolas são mais equipados e de melhor
qualidade, por outro parece ser evidente um aumento considerável na violência
urbana, pobreza e problemas com drogas nas cidades localizadas ao longo da
estrada. As administrações dessas cidades também enfrentam sérias dificuldades
financeiras em razão do aumento na demanda por serviços públicos resultantes da
expansão urbana provocada pela pavimentação da estrada. Nem a carne vendida
nessas cidades é mais barata ou de melhor qualidade. Em Tarauacá, por exemplo,
o filé e a picanha são, literalmente, ‘carne de pescoço’ porque os animais
abatidos para venda local são, em sua maioria, ‘vacas velhas’ descartadas
dos plantéis. Os melhores animais, com carne tenra e de alta qualidade, são
enviados para Cruzeiro do Sul e Rio Branco.
Uma avaliação isenta provavelmente
mostraria que o custo social do progresso proporcionado pela pavimentação da BR-364
no interior do Acre deve ser muito alto e se vantagens e desvantagens fossem
colocadas em uma balança, a primeira não superaria a segunda por larga margem. Ela
também mostraria que os maiores beneficiários da estrada são comerciantes de
produtos alimentícios de primeira necessidade, combustíveis, materiais de
construção, fazendeiros e madeireiros. Em síntese: a minoria que já era rica, ficou mais rica. A maioria da população, especialmente os
trabalhadores não qualificados recém-chegados da zona rural que se instalam em
bairros periféricos, enfrenta duras condições de vida, sem moradias
dignas e sobrevive de subempregos.
Quem paga a construção de estradas em
nossa região é a sociedade como um todo e os recursos utilizados nesses
empreendimentos não caem do céu ou saem de um poço sem fundo: eles derivam do
seu, do meu, dos impostos, taxas e contribuições que pagamos diariamente. É
justo continuar pagando por obras públicas que beneficiam de forma excessiva a minoria da sociedade? Vejam o caso da carne em Tarauacá: enquanto a
população come ‘carne de pescoço’ os fazendeiros, com a pavimentação da BR-364,
‘economizam e embolsam’ o custo extra que tinham antes para enviar seus animais
em estradas precárias aos centros consumidores.
A construção da estrada entre os rio
Tarauacá e Muru foi denunciada pelos indígenas daquela região ao Ministério
Público Federal alertando que a distribuição de lotes de terra ao longo da
mesma beneficia apenas políticos, comerciantes e fazendeiros pressionados pelo
ICMBIO a abandonar ocupações ilegais na ‘Reserva Extrativista Alto Tarauacá’. Eles
citaram ainda a exploração ilegal de madeira ao longo da estrada e a realização de expedições
de caça predatória. Esta situação apenas confirma uma realidade inegável na
Amazônia: estradas abertas na região, especialmente em terras públicas, cedo ou
tarde passam a funcionar como caminhos para a destruição e apropriação indevida
de riquezas naturais.
Mesmo sabendo que as populações das cidades isoladas do Acre são a favor das
estradas – porque ficam anestesiadas com a perspectiva de sua abertura –, temos
que ser firmes na oposição à construção dessas ‘estradas de destruição’ no
interior do Estado. De outra forma, o legado do nosso comodismo para as futuras
gerações vai continuar a ser o pior possível: pobreza, violência e destruição
ambiental.
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