DIVERSIDADE E IMPORTÂNCIA ECONÔMICA DAS PALMEIRAS DA AMAZÔNIA BRASILEIRA
Resumo Expandido publicado nos Anais 56° Congresso Nacional de Botânica realizado em Curitiba, Paraná, entre 09 a 14 de outubro de 2005
Evandro José Linhares Ferreira
Doutor em Botânica, Pesquisador do Núcleo de Pesquisas do Acre, Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia-INPA, Campus Universitário da UFAC, BR 364, km 4, Distrito Industrial, CEP 69.915-900, Rio Branco-Acre, e-mail: evandroferreira@yahoo.com.
Introdução
As palmeiras ainda são uma das famílias botânicas mais importantes da região amazônica em razão de sua ampla distribuição, abundância nos mais diversos ecossistemas e, principalmente, da diversidade de usos e importância sócio-cultural e econômica de um grande número de espécies nativas. Este cenário, entretanto, deverá mudar com a consolidação das transformações sociais, econômicas e ambientais verificadas atualmente na Amazônia. A destruição da floresta para a implantação de cultivos agrícolas e criações de animais, a intensificação da exploração seletiva de espécies madeireiras, as migrações para as áreas urbanas e a perda de identidade cultural das populações tradicionais são os fatores principais que contribuirão para a perda gradual da diversidade natural das palmeiras e a diminuição de sua importância como fonte de alimentos, materiais de construção e outras utilidades para a população da região.
Diversidade de palmeiras na Amazônia
A Amazônia abriga a maior diversidade de palmeiras do território brasileiro. Nela são encontrados 35 dos 42 gêneros e cerca de 150 das 193-208 espécies reconhecidas para o Brasil (Henderson et. al., 1995; Lorenzi et al., 2004). Destes 35 gêneros encontrados na Amazônia, 22 têm sua distribuição restrita à região. Proporcionalmente à sua área, que corresponde à cerca de 60 % do território nacional, a diversidade de palmeiras da região amazônica é relativamente baixa. Comparativamente, na região fitogeográfica correspondente à América Central (sensu Henderson et al., 1995), podem ser encontrados 25 gêneros e cerca de 150 espécies.
Os gêneros mais diversificados na Amazônia brasileira são Bactris e Geonoma, respectivamente. Juntos eles representam cerca de 43% das espécies amazônicas. Astrocaryum, Attalea, Oenocarpus, Syagrus, Desmoncus, Euterpe e Leopoldinia são outros gêneros importantes que representam cerca de 30% da diversidade de espécies da região. Desta forma, podemos observar que os 9 gêneros listados acima (cerca de 1/4 dos gêneros nativos da região), representam mais de 70% da diversidade de espécies. Quinze gêneros (mais de 40% do total), são monoespecíficos.
A maior riqueza de palmeiras é encontrada na parte ocidental da Amazônia. Uma possível explicação para essa alta diversidade talvez seja a sua proximidade com os Andes, cujas espécies eventualmente se distribuem nas florestas de terras baixas adjacentes (Henderson, 1995). Dos gêneros amazônicos, Aiphanes, Aphandra, Chamaedorea, Chelyocarpus, Dictyocaryum, Iriartea, Itaya, Pholidostachys, Phytelephas, Wendlandiella e Wettinia estão restritos à Amazônia ocidental. Barcella, Elaeis e Leopoldinia se restringem à Amazônia central. Raphia só é encontrado na Amazônia oriental. Hyospathe, Lepidocaryum e Socratea estão amplamente distribuídos pela região.
Importância econômica das palmeiras amazônicas
A maioria das palmeiras nativas da Amazônia possui algum tipo de utilidade para os habitantes da região (Balick & Beck, 1990; Campos & Ehringhaus, 2003). Isso se deve, principalmente, ao fato da maioria das espécies possuir frutos comestíveis, estipes, raízes, folhas e outras partes passíveis de algum tipo de aproveitamento. Além disso, as palmeiras estão amplamente distribuídas e geralmente são muito abundantes, chegando a formar extensas florestas oligárquicas. Elas também são muito eficientes na colonização e sobrevivência em novos habitats, especialmente naqueles alterados pelo homem.
Apesar da grande diversidade de espécies e de utilidades, poucas palmeiras nativas da Amazônia podem ser consideradas importantes economicamente, estando, efetivamente, inseridas no mercado regional ou nacional. Vale ressaltar que entre as 550 espécies de palmeiras nativas das Américas (Henderson et al., 1995), somente uma foi domesticada e tem sido cultivada: a pupunha (Bactris gasipaes). Desta espécie podem ser obtidos frutos comestíveis e o palmito industrial. As outras espécies nativas têm sido exploradas em seu ambiente natural. Entre estas se destacam: (a) o açai-de-touceira (Euterpe oleracea), nativo do Pará, com frutos e palmitos comercializados regional e nacionalmente; (b) o açaí solteiro (Euterpe precatoria), nativo da Amazônia ocidental, com frutos comercializados para a extração da polpa usada na elaboração do “vinho” e sorvetes, as sementes vendidas para a confecção de artesanatos; (c) tucumã-do-amazonas (Astrocaryum aculeatum) e tucumã-do-pará (Astrocaryum vulgare): grande quantidade dos frutos são comercializados para consumo in natura e elaboração de sorvetes no Amazonas e Pará; (d) bacaba (Oenocarpus bacaba e O. mapora): frutos comercializados no Pará e Amazonas para a extração da polpa usada no preparo do “vinho” de bacaba; (e) buriti (Mauritia flexuosa): frutos comercializados para a extração da polpa usada na elaboração de “vinho”, doce e sorvetes, o pecíolo das folhas usados na confecção de móveis e as fibras foliares usadas na confecção de artesanatos; (f) babaçu (Orbignya phalerata): no Maranhão o endosperma das sementes é comercializado e usado para a produção de óleo; (g) murmuru (Astrocaryum ulei): no Acre as sementes são comercializadas e usadas para a extração de gordura visando à produção de cosméticos; (h) piassaba (Leopoldinia piassaba): intensivamente explorada no Amazonas para a produção de fibras usadas na confecção de vassouras; (i) jarina (Phytelephas macrocarpa): no Acre grande quantidade de sementes são comercializadas para a confecção de objetos artesanais.
Conclusão
Apesar dos recentes avanços sobre o conhecimento da diversidade de palmeiras da Amazônia brasileira (Ferreira, 2004; Henderson, 1995; Henderson et al., 1995; Lorenzi et al., 1995; Lorenzi et al., 2004; Miranda et al., 2001), ainda não se pode afirmar que a flora de palmeiras amazônicas seja bem conhecida. Existem extensas áreas da região com poucas ou nenhum amostragem de palmeiras. Entre estas se destacam a região entre os rios Purus e Juruá a partir do rio Solimões, o sul do Pará e norte de Mato Grosso, o norte do Pará, entre o rio Trombetas e a divisa do estado do Amapá.
Henderson (1995) sugere que faltam amostras de palmeiras de aproximadamente metade da área da Amazônia. Esta deficiência não se justifica no contexto atual, onde se dispõe de extensa rede de rodovias e facilidades de transporte aéreo e fluvial que permitem atingir com rapidez e custo relativamente baixo a maioria das áreas pouco coletadas.
Um maior conhecimento sobre a diversidade de espécies e o potencial de aproveitamento das mesmas em seu ambiente natural é uma das estratégias a serem utilizadas para combater a atual tendência de destruição da região pois as florestas úteis são menos suscetíveis a ações predatórias. Para isso, vai ser importante investir no desenvolvimento de técnicas de exploração sustentável dos numerosos recursos oferecidos pelas palmeiras nativas, no desenvolvimento de sistemas de cultivos de algumas delas e, principalmente, na educação da população da região para despertar na mesma a idéia de que o desenvolvimento social e econômico não é incompatível com a preservação da paisagem local, que, por um capricho da natureza, é rica em palmeiras.
Referências Bibliográficas
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FERREIRA, E. J. L. F. Manual das palmeiras do Acre, Brasil. Disponível em:
http://www.nybg.org/bsci/acre/www1/manual_palmeiras.html. Acesso em: 10 ago 2005.
HENDERSON, A. J. The palms of the amazon. New York: Oxford University Press, 1995. 362p.
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LORENZI, H.; SOUZA, H. M. de.; COSTA, J. T. de M.; CERQUEIRA, L. S. C. de.; BEHR, N. Von. Palmeiras no Brasil: nativas e exóticas. Nova Odessa: Instituto Plantarum, 1995. 320p.
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MIRANDA, I. P. de A.; RABELO, A.; BUENO, C. R.; BARBOSA, E, M.; RIBEIRO, M. N. S. Frutos de palmeiras da Amazônia. Manaus: Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, 2001. 120p.
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