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01 outubro 2008

AMAZÔNIA: ECOLOGIA E MODISMO

Isaac Melo

A Amazônia é um assunto que está em voga e virando modismo. De uma pragmática séria e urgente, vê-se reduzida a discursos e chavões políticos cada vez mais intensos, assim como vazios. De tanto se discutir a Amazônia por meio de livros de meia tigela ou de “especialistas” de araque, a discussão séria em torno de como mantê-la e preservá-la torna-se muitas vezes banalizada e levada como um fato de consciência individual, quando na verdade deveria ser primeiramente de responsabilidade do Estado. Não se trata de eximir a responsabilidade de cada um. O que se percebe muitas vezes é a incapacidade do Estado no que se refere à preservação da Amazônia, onde o mesmo até contribui (in) diretamente para esta devastação (como os incentivos à soja e pecuária, os mais nítidos, por exemplo). Frente essa incapacidade, apela às responsabilidades do cidadão, como se nesse estivesse a causa e a solução.

Falar da Amazônia dá ibope, pois é um assunto no qual todos se voltam neste momento, seja porque estão motivados por um despertar da consciência ou para obter vantagens. Ser uma empresa ecologicamente correta virou mais uma jogada de marketing que um compromisso sério. Um exemplo disso são as empresas que se dizem amigas da natureza por plantarem uma arvorezinha aqui outra acolá, enquanto lançam resíduos diretamente em rios, etc. ou se utilizam de matérias-primas extraídas ilegalmente da natureza.

O ecologismo é um desvirtuamento da ecologia. Ecologismo é achar que a culpa por não ter água potável para todo mundo é porque a dona Maria usou água para lavar toda a sua calçada ou porque o João lavou seu carro. Ecologismo é achar que o problema ambiental vai se resolver quando cada um plantar uma árvore, escovar os dentes com a torneira fechada (isso quem tem o luxo de ter torneira), passar o menor tempo possível no chuveiro, etc. Não que estas pequenas práticas não devam ser observadas. O problema é que se tenta culpabilizar os indivíduos enquanto as grandes corporações e até o próprio Estado (que deveria ser o primeiro a zelar) se eximem de suas responsabilidades.

Em se tratando de Amazônia, vez por outra, encontro alguém que me coloca o Acre no nordeste. E se não bastasse ainda encontramos aquela velha e ingênua (para não dizer aquela outra palavra) visão de uma Amazônia romantizada, de índios nus, cobras nas ruas, onças e assim vai. Infelizmente novela nesse país não ensina Geografia. E são muitos os ignorantes. Entres estes, estão muitos dos ditos “doutores” e gente de universidade. E são estes, que depois vem com esse discurso de bom menino, dos modismos e ecologismos acerca da questão ambiental, principalmente em relação à Amazônia. Gente que fala a partir de livros e revistas medíocres, se detendo apenas na superficialidade e absorvendo os conceitos do momento ou aquilo que a mídia (im) põe, sem fazer um exame crítico e mais aprofundado. Se a questão ecológica continuar a enveredar por este viés, sem dúvida a Amazônia continuará a ser devastada e a ceder lugar para os pastos e a soja, realidade esta, que já está escancarada para quem quiser ver.

Os governos comemoram uma redução dos desmatamentos quando na verdade os desmatamentos não param, ou seja, os governos fingem que a situação está sob controle, os que desmatam fingem que cumprem as leis e nós os “bons selvagens” fingimos acreditar que tudo está bem. Assim é no reino do Faz de conta assim é na Terra Papagalli.

Precisamos de práticas e medidas consistentes, que visem não apenas a proteção da Amazônia enquanto bioma, mas na sua totalidade, isto é, sem excluir o homem que vive nela e dela sobrevive. Aliás, os povos da floresta são excluídos quando se fala em preservação da Amazônia. Precisamos preservar a floresta e cuidar do homem, para que o homem assuma a responsabilidade de zelar pela floresta. Os povos típicos da Amazônia vivem a mercê do abandono, isolados e sem assistência. Salvemos os bichos da Amazônia, a começar pelo “bicho” homem!

Mais do que nunca a Amazônia tem sido alvo das atenções dos próprios brasileiros assim como do mundo. Não sei se estão mais conscientes e preocupados do que antes, sei que muitos interessem emergem nesse pano de fundo, onde é cada vez mais difícil separar o trigo do joio. Enquanto isso nos tornamos vítimas de um próprio sistema do qual nós mesmos legitimamos.

Ecologismo é bandeira ideológica vazia e tendenciosa, arma e discurso político. Reproduz o que está aí, engole sem mastigar, sem inquirir. Semelhante assim também é o modismo, que mexe com as multidões, sem cair numa prática, num estudo mais sério e comprometido. É blábláblá que passa de boca em boca.

Não dá para ficarmos numa “ecologia superficial”, onde o homem é a figura central e, que por isso, o meio ambiente deve ser preservado somente por causa da sua importância (utilidade) para o ser humano. Precisamos pensar numa ecologia numa visão mais holista, abrangente. Nessa perspectiva, o filósofo norueguês Arne Naess (1912), propôs a chamada “ecologia profunda”, que não visa apenas medidas imediatistas, mas um processo de medidas contínuas e de longo prazo. A idéia central da “ecologia profunda” é que a natureza, cuja evolução é eterna, possui valor em si mesma, independentemente da utilidade econômica que tem para o ser humano que vive nela. O ser humano está intrinsecamente ligado com a natureza; preservá-la não para garantir os seus recursos naturais e riquezas apenas, mas porque nós fazemos parte dela e dela dependemos. Em certa medida, a destruição da natureza é a destruição do próprio homem também.

Dessa forma, é urgente repensar a maneira como tem sido encarada e abordada essa problemática ambiental na qual está inserida a Amazônia, não de forma imediatista e simplista como muitos tem feito. Não se trata de encontrar culpados, embora alguém deva ser responsabilizado. Já teorizamos demais e obtemos poucos avanços. Agora é uma questão de necessidade e não apenas de vontade política.

Finalizo citando Carlos Cardoso Aveline no seu livro "A Vida Secreta da Natureza" (Santa Catarina: FURB, 1999) em que afirma, que um dos caminhos para a superação da crise ambiental é atacar as causas “ocultas” da devastação, projetar e estimular o surgimento de uma nova civilização culturalmente solidária, politicamente participativa e ecologicamente consciente. Só assim, se superará os modismos e ecologismos, e se poderá lançar bases para uma sociedade socialmente justa e ecologicamente sustentável, onde o meio ambiente seja preservado não como fim utilitarista, mas como garantia da presença humana futuramente sobre a terra. Pois, há milhares de anos atrás a terra foi praticamente destruída, os dinossauros foram extintos, mas a natureza se recompôs e permanece até hoje. No entanto, nada garante que o homem tenha essa mesma “sorte” que a natureza teve...