FALTA DE CONTROLE DO MPF, ABUSO NOS GRAMPOS E VISÃO BRANDA SOBRE CRIMES FINANCEIROS
'No Estado de direito não se pode ter poder absoluto'
Blog do Frederico Vasconcelos
Folha Online
Procurador critica falta de controles no MPF, abuso nos grampos e visão branda sobre crimes financeiros
Em longa entrevista à Folha (*), na edição deste domingo (9/8), o procurador da República Celso Antônio Três, de Santa Catarina, diz que o Ministério Público Federal não tem controles sobre a atuação das várias unidades do órgão. "Quando falo de controle, não é reprimir o procurador que extrapola. É para reprimir a inércia, a falta de atitude", diz.
"Se o procurador não quiser fazer nada, ele não faz nada. E não acontece nada", diz.
Três participou da força-tarefa que investigou a megalavagem de dinheiro do caso Banestado, no Paraná, no final dos anos 90. Ele obteve na Justiça a quebra do sigilo bancário de todas as contas CC5 no país, no total de US$ 124 bilhões. Em agosto de 2003, ele responsabilizou a cúpula da Procuradoria Geral da República e a Polícia Federal pela "aberrante morosidade" na investigação.
"Na época, a impunidade era maior, a atuação da Polícia Federal foi uma piada. O Banco Central não fez nada. Hoje, nós temos uma estrutura muito boa, até porque o Estado fez investimentos na Polícia Federal e no Judiciário".
Eis alguns trechos da entrevista concedida ao editor deste Blog:
"A correição ordinária, aquela visitação de órgão superior para verificar o trabalho de cada procurador em cada unidade, isso não existe".
"A independência do Ministério Público brasileiro talvez não exista em lugar nenhum. Nesse aspecto, é bom. Mas leva ao outro extremo, vira 'o dono da situação'".
"A Procuradoria tem que contemporizar a independência, ter mecanismos de controle, porque no Estado de direito não se pode ter poder absoluto".
"Nós tivemos no período do Brindeiro [ex-procurador-geral Geraldo Brindeiro, que atuou no governo Fernando Henrique Cardoso] uma famosa catacumba, uma gruta onde eram colocados processos do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça. Ficavam anos parados, porque não havia cobrança".
"Um procurador regional da República que atuava no TRF-1, em Brasília, foi promovido a subprocurador-geral, cargo máximo da instituição, com 700 processos parados. Foi promovido e deixou a herança para os colegas".
"Tradicionalmente, há na instituição procuradores que sempre tiveram uma posição muito branda em relação ao direito penal do colarinho branco. Pediram muito arquivamento de sonegação fiscal. Uma visão um tanto abolicionista. E eles estão nessas varas de lavagem de dinheiro".
"É claro que aquela pena que o juiz Fausto De Sanctis deu, na condenação do Daniel Dantas, é uma coisa exorbitante, enorme. Isso não é um juízo ético, é um juízo técnico, acompanhando a jurisprudência".
"Se no lugar do juiz De Sanctis atuar um juiz com uma visão abolicionista, que entende que crime econômico não é crime mesmo, se tem uma visão minimalista do direito penal, vai ser difícil ele autorizar a interceptação telefônica. Para aprovar uma busca e apreensão vai ser mais difícil ainda. E prisão temporária, nem imaginar. Isso evidentemente cria um desequilíbrio brutal. A favor da defesa, há quatro instâncias. Não tem em lugar nenhum do mundo".
"Qual é o critério para ver se há abuso [na quebra de sigilo telefônico]? É aquela situação em que você não tem um fato a ser apurado. Você pega alguém para achar alguma coisa".
"Quem é que aguenta dois anos grampeado? Nem Jesus Cristo. Você pode pegar o papa Bento 16. Se grampear durante dois anos, vai achar um monte de pecados. Isso é um abuso do Estado. É um vício que nós temos".
"É muito cômodo, uma barbada, ficar escutando os outros, convenhamos. Você tem que fazer a campana, levantar documentos, fazer pesquisas".
"Tem que grampear com moderação. O problema é que muitos grampos se eternizam".
Blog do Frederico Vasconcelos
Folha Online
Procurador critica falta de controles no MPF, abuso nos grampos e visão branda sobre crimes financeiros
Em longa entrevista à Folha (*), na edição deste domingo (9/8), o procurador da República Celso Antônio Três, de Santa Catarina, diz que o Ministério Público Federal não tem controles sobre a atuação das várias unidades do órgão. "Quando falo de controle, não é reprimir o procurador que extrapola. É para reprimir a inércia, a falta de atitude", diz.
"Se o procurador não quiser fazer nada, ele não faz nada. E não acontece nada", diz.
Três participou da força-tarefa que investigou a megalavagem de dinheiro do caso Banestado, no Paraná, no final dos anos 90. Ele obteve na Justiça a quebra do sigilo bancário de todas as contas CC5 no país, no total de US$ 124 bilhões. Em agosto de 2003, ele responsabilizou a cúpula da Procuradoria Geral da República e a Polícia Federal pela "aberrante morosidade" na investigação.
"Na época, a impunidade era maior, a atuação da Polícia Federal foi uma piada. O Banco Central não fez nada. Hoje, nós temos uma estrutura muito boa, até porque o Estado fez investimentos na Polícia Federal e no Judiciário".
Eis alguns trechos da entrevista concedida ao editor deste Blog:
"A correição ordinária, aquela visitação de órgão superior para verificar o trabalho de cada procurador em cada unidade, isso não existe".
"A independência do Ministério Público brasileiro talvez não exista em lugar nenhum. Nesse aspecto, é bom. Mas leva ao outro extremo, vira 'o dono da situação'".
"A Procuradoria tem que contemporizar a independência, ter mecanismos de controle, porque no Estado de direito não se pode ter poder absoluto".
"Nós tivemos no período do Brindeiro [ex-procurador-geral Geraldo Brindeiro, que atuou no governo Fernando Henrique Cardoso] uma famosa catacumba, uma gruta onde eram colocados processos do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça. Ficavam anos parados, porque não havia cobrança".
"Um procurador regional da República que atuava no TRF-1, em Brasília, foi promovido a subprocurador-geral, cargo máximo da instituição, com 700 processos parados. Foi promovido e deixou a herança para os colegas".
"Tradicionalmente, há na instituição procuradores que sempre tiveram uma posição muito branda em relação ao direito penal do colarinho branco. Pediram muito arquivamento de sonegação fiscal. Uma visão um tanto abolicionista. E eles estão nessas varas de lavagem de dinheiro".
"É claro que aquela pena que o juiz Fausto De Sanctis deu, na condenação do Daniel Dantas, é uma coisa exorbitante, enorme. Isso não é um juízo ético, é um juízo técnico, acompanhando a jurisprudência".
"Se no lugar do juiz De Sanctis atuar um juiz com uma visão abolicionista, que entende que crime econômico não é crime mesmo, se tem uma visão minimalista do direito penal, vai ser difícil ele autorizar a interceptação telefônica. Para aprovar uma busca e apreensão vai ser mais difícil ainda. E prisão temporária, nem imaginar. Isso evidentemente cria um desequilíbrio brutal. A favor da defesa, há quatro instâncias. Não tem em lugar nenhum do mundo".
"Qual é o critério para ver se há abuso [na quebra de sigilo telefônico]? É aquela situação em que você não tem um fato a ser apurado. Você pega alguém para achar alguma coisa".
"Quem é que aguenta dois anos grampeado? Nem Jesus Cristo. Você pode pegar o papa Bento 16. Se grampear durante dois anos, vai achar um monte de pecados. Isso é um abuso do Estado. É um vício que nós temos".
"É muito cômodo, uma barbada, ficar escutando os outros, convenhamos. Você tem que fazer a campana, levantar documentos, fazer pesquisas".
"Tem que grampear com moderação. O problema é que muitos grampos se eternizam".
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