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Na Web No BLOG AMBIENTE ACREANO

16 agosto 2009

NÃO SOU UM PROJETO MESSIÂNICO

Entrevista de Marina à revista Isto É:

ISTOÉ - A sra. esperava que a repercussão da sua candidatura fosse tão grande?
Marina Silva -
Acho que fomos todos surpreendidos. Vejo isso como muito positivo. O Brasil precisa fazer jus à potência ambiental que é. Essa luta tem 30 anos e tem uma densidade muito significativa nos vários segmentos da sociedade. Diante de uma crise econômica que só se soluciona resolvendo a crise ambiental, e uma crise ambiental que, ao se resolver, não pode negar a questão econômica, o tema aparece com alguma densidade.

ISTOÉ - Qual a importância de o tema da sustentabilidade entrar no debate?
Marina -
Essa questão está colocada na minha trajetória de vida há muito tempo. Estou comprometida com a luta da sustentabilidade. E esse desafio não pode estar presente só numa candidatura do PV. Quando Juscelino Kubitschek resolveu industrializar o Brasil, ele partiu de uma visão antecipatória de País. Nesse caso, é uma visão antecipatória para a civilização. O Obama entrou em cena e os EUA são como os superatletas: quando entram em cena fazem a diferença. Com a capacidade técnica e de recursos que eles têm, eles podem fazer a diferença. Mas o Brasil talvez seja o único que tenha condições de fazer o que os EUA fizeram no passado. Nós temos os recursos. O Brasil tem um potencial enorme de hidroeletricidade, tem 30 anos de tecnologia na produção de etanol, 350 milhões de hectares de área agricultável e 11% da água doce do planeta. Pode dobrar sua produção sem derrubar mais uma árvore.

ISTOÉ - A sra. falou para um amigo que estava recebendo um chamamento, como se fosse alguma coisa bíblica.
Marina -
Não vou me colocar nesse lugar de projetos messiânicos. Eu estava me baseando em um texto muito bonito de Joseph Campbell, que é um dos maiores mitólogos do mundo. Ele diz que nós temos que fazer acerto de contas conosco mesmo. Às vezes, a gente é chamada interiormente para dar uma resposta.

"O afastamento seria o melhor para a sociedade, para o Congresso e para o próprio presidente Sarney"

ISTOÉ - Como a sra. vê a pesquisa que a coloca na frente da ministra Dilma Rousseff?
Marina -
Não vou prender a minha decisão a pesquisas. Não vou me surpreender se outro jornal amanhã disser que estou com apenas um tracinho nas pesquisas.

ISTOÉ - É possível um candidato de partido pequeno chegar a presidente sem composição, repetindo o Obama nos Estados Unidos, numa terceira via?
Marina -
Temos que dar a palavra ao eleitor. É nisso que acredito. Temos uma cultura patrimonialista muito arraigada. Alguém diz: 'Você tira voto de fulano'. O voto não é do Serra, nem da Dilma, nem do Lula, nem de ninguém. O voto é do eleitor. O voto é a única coisa que você nunca tem. No momento que você o recebe, já é passado e o eleitor já está livre para votar em quem ele quiser. As pessoas já estão cansadas que se façam as coisas para elas. É melhor se dispor a fazer com elas, com os jovens, os empresários, as mulheres, os idosos e os formadores de opinião. Foi essa questão que o Obama colocou na cultura americana, que era muito polarizada. O Obama foi capaz de transitar entre as duas coisas para estabelecer uma ponte. A humanidade precisa cada vez mais de pontes.

"O voto não é do Serra, nem da Dilma, nem do Lula, nem de ninguém. O voto é do eleitor"

ISTOÉ - Como a sra. recebeu as declarações do ex-ministro José Dirceu, dizendo que o mandato da sra. pertence ao PT?
Marina -
Acho que o ex-deputado José Dirceu não falaria isso em tom de ameaça. Ele é uma pessoa que trabalhou o tempo todo na organização partidária, muito zeloso pelo estatuto, por essas coisas. Ele olha para a legislação. Nunca me senti intimidada por outras ameaças muito perigosas, imagina por uma pessoa como o Zé Dirceu. Isso não é algo que me faria mudar de ideia.

ISTOÉ - Como a sra. acompanha a crise no Senado?
Marina -
Com muita preocupação. O Congresso é a representação da sociedade, aqui se estabelece o debate, se realizam os acordos sociais mediados, que deveriam ser por meio de um debate consequente. Lamentavelmente isso está interditado por essa crise. Acho que não devemos encará-la com um discurso udenista simplesmente, que não vai nos tirar do buraco. São as investigações que têm de ser feitas pela Polícia Federal, pelo Ministério Público, com a anulação de atos. É preciso fazer isso com equidistância para que a sociedade creia que de fato esteja sendo feito, porque já há um descrédito a priori. Foi por isso que apresentamos a ideia à bancada que deveria ser um afastamento temporário do senador José Sarney. Seria o melhor para a sociedade, para o Congresso e para o próprio presidente Sarney.

ISTOÉ - Qual é a frase da "Bíblia" que mais inspira a vida da sra.?
Marina -
É uma frase do apóstolo Paulo: 'Examinai tudo e retende o bem'. Com essa frase, ele diz que não se deve ter preconceito contra ninguém, nenhuma ciência e filosofia. E você não pode impor sua vontade aos outros.

"Às vezes, a gente é chamada interiormente para dar uma resposta"

ISTOÉ - O presidente Lula fez um comentário elogioso a sua possível candidatura. Como está o relacionamento com ele?
Marina -
Não mudou. Digo que tenho tido bons mantenedores de utopia. Quando eu era uma jovem, talvez mais sonhadora do que hoje, a gente tinha bons mantenedores de utopia, tínha Chico Mendes, Darci Ribeiro, Celso Furtado, Leonardo Boff, Luiz Inácio Lula da Silva, Fernando Henrique Cardoso. Mas, aos 51 anos, ainda sou uma sonhadora. E quero ser mantenedora de utopia.

ISTOÉ - A sra. ainda inclui o presidente Lula como mantenedor de utopia?
Marina -
Ele é um realizador de utopias. Fazer a política social que ele está fazendo é a realização de uma utopia.

ISTOÉ - A sra. se aconselhou com Leonardo Boff. Ele deu alguma sugestão sobre a candidatura?
Marina -
Ele disse que eu escutasse o meu coração.

ISTOÉ - E o que diz seu coração?
Marina -
Meu coração está me sussurrando.