Google
Na Web No BLOG AMBIENTE ACREANO

12 março 2011

CLASSIFICAÇÃO DA VEGETAÇÃO DO PARQUE ESTADUAL CHANDLESS, ACRE, BRASIL

Uma análise mais acurada demonstra que a classificação da vegetação adjacente a cursos de água no oeste da Amazônia é bem mais complexa do que a encontrada em livros e relatórios usados como referências básicas. Este excerpt da análise da vegetação do Parque Estadual Chandless trás à luz uma nova proposta de classificação da vegetação destas áreas

As Formações Pioneiras de Influência Aluvial (FPIF)*

Evandro Ferreira
Blog Ambiente Acreano

[Figura 1. Representação esquemática do transecto aberto entre a praia e a Floresta Primária (Foto e diagrama esquemático: E. Ferreira)]

As Formações Pioneiras de Influência Aluvial (FPIF) são uma classificação inédita no âmbito do sistema brasileiro de classificação da vegetação (IBGE, 1992), e correspondem, no complexo de formações vegetais adjacentes a cursos de água no oeste da Amazônia, à região compreendida entre a praia e os pontos onde se observa o início da ocorrência de florestas primárias (Figura 1).

A partir do leito dos rios, as FPIFs podem ser facilmente observadas nas margens opostas aos terraços mais elevados destes cursos de água. Estes terraços mais elevados geralmente abrigam florestas primárias de terra firme que são constantemente erodidas pela força das águas.

No âmbito do Parque Estadual Chandless, elas encontram-se localizadas ao longo das margens dos principais corpos de água que drenam o PE Chandless, geralmente estabelecidas em solos formados por deposição fluvial (Neossolo flúvico) ou em solos com lençol freático alto (Gleissolos) (Fig. 2a).

[Figura 2 - Aspectos das formações vegetais com influência aluvial: a) Formação Pioneira de Influência Aluvial (FPIF) em área de deposição aluvial; b) Floresta Primária em terraço alto não inundável sujeito a erosão; c) Floresta Primária em terreno consolidado, sujeito a inundações periódicas; d) Zona de transição entre a Floresta Primária (direita) e a FPIF (esquerda) (Fotos: E. Ferreira)]

Opostas a estas formações pioneiras, se encontram Florestas Primárias em terraços elevados sob pressão erosiva (Fig. 2b), e Florestas Primárias sobre terreno consolidado (não aluvial), baixos e passíveis de inundações temporárias no período das cheias dos rios (Fig. 2c). Esta última formação corresponde às Florestas Aluviais e suas variações, descritas em ACRE (2006).

A correta delimitação em mapas das formações descritas acima é praticamente impossível, pois para isso seria necessário anotar, ao longo dos rios, as margens de deposição e as de erosão aluvial. Durante a AER, entretanto, foi possível observar com clareza as zonas de transição entre as FPIFs e as Florestas Primárias nas áreas de terra firme (Fig. 2d).

É interessante notar que tanto ACRE (2000), como ACRE (2006) ignorou a ocorrência da Vegetação com Influência Aluvial (sensu IBGE, 1992), e as Formações Pioneiras de Influência Aluvial (FPIF) descritas acima. Talvez isso tenha ocorrido pela escala muito ampla do trabalho, que deixou de lado as particularidades destas formações tão freqüentes ao longo dos principais rios e respectivos afluentes por todo o Estado.

Um estudo conduzido durante a segunda campanha da Avaliação Ecológica Rápida do Parque Estadual Chandless procurou investigar a composição florística ao longo de um transecto que se iniciava na margem do rio (praia) e encerrava quando a Floresta Primária deixava de apresentar sinais de influência florística da FPIF.

Foi observado que a vegetação na praia consistia, majoritariamente, em ervas anuais cujo desenvolvimento é desencadeado pela baixa do nível das águas. Estas ervas são, em sua maioria, das famílias Solonaceae, Asteraceae, Euphorbiaceae e Poaceae. Apenas a planta conhecida popularmente como orana Adenaria floribunda Lythraceae se apresentava como um arbusto lenhoso perene capaz de resistir ao período da cheia dos rios.

A maioria do componente florístico das FPIFs é formada por espécies pioneiras, dentre as quais se destacam o assa-peixe Vernonia ferruginea, canarana Gynerium sagitatum Poaceae, embaúba Cecropia spp. Cecropiaceae e, às vezes, o algodoeiro Ochroma pyramidale Bombacaceae.

A Floresta Primária adjacente às FPIFs apresentava dossel com árvores de grande porte, com até 30 m de altura, como a guariúba Clarisia racemosa e manitê Brosimum sp. As espécies do estrato intermediário observadas incluíram a maparajuba Manilkara sp., ingá branca Inga sp., uricuri Attalea phalerata e maraximbé branco Trichilia pleeana. O canela de velho Rinorea viridifolia, pimenta longa Piper hispidinervum e japécanga Smilax sp., eram algumas das principais espécies arbustivas. Heliconias, Araceae e Poaceae representavam a maioria das espécies do componente herbáceo.

O gradiente de variação do solo ao longo do transecto foi de areia pura na margem do rio, passando por uma espécie de argissolo sob as FPIFs, e solo predominantemente argiloso sob a floresta primária. O solo mais promissor sob o ponto de vista de riqueza em matéria orgânica era o encontrado na área das FPIFs, que se beneficiam da constante deposição de matéria-orgânica em função da variação constante do nível das águas no período das chuvas. Essa vantagem, entretanto, parece ser relativa pois na medida em que se aprofunda, este solo vai ficando mais argiloso. Essa condição interfere na velocidade infiltração da água, que é muito rápida na superfície e lenta em subsuperfície, tornando o solo extremamente suscetível à erosão severa.

de Jong (2001) e Kalliola et alii, (1992), em estudos realizados no Peru, demonstraram a importância das formações pioneiras que ocorrem nas áreas de deposição aluvial e comentam que a dinâmica destas formações podem ter influência não apenas ecológica, mas econômica tendo em vista que os solos onde elas crescem são geralmente muito férteis.

Referências citadas

ACRE. 2000. Governo do Estado do Acre. Programa Estadual de Zoneamento Ecológico-Econômico do Estado do Acre. Zoneamento Ecológico-Econômico do Acre Fase I: recursos naturais e meio ambiente - documento final. Rio Branco: SECTMA. V. 2, 116p.

ACRE. Governo do Estado do Acre. Programa Estadual de Zoneamento Ecológico-Econômico do Estado do Acre. Zoneamento Ecológico-Econômico do Acre Fase II: documento Síntese – Escala 1:250.000. Rio Branco: SEMA. 354p.

De Jong W. 2001. Secondary forest dynamics in the Amazon floodplain in Peru. Forest Ecology and Management, 150(1-2): 135-146.

IBGE. 1992. Manual técnico da vegetação brasileira (IBGE, ed.), Rio de Janeiro. 92p.

Kalliola, J.; Salo R. M; Puhakka, M.; Rajasilta, M.; Hame T.; Neller, R. J.; Rasanen M. E. & Danjoy-Arias, W. A. 1992. Upper amazon channel migration. Naturwissenschaften Volume 79, Number 2: 75-79.

*Texto originalmente publicado no Relatório Final do componente Vegetação do Plano de Manejo do Parque Estadual Chandless.

1 Comments:

Blogger Terra said...

Evandro, parabéns pelo post. Quando focamos o olhar vemos muito mais do nosso Acre.
Na Ufac, o Dr. Latrubesse orientou uma dissertação de Mestrado sobre esse tema,orientado ? Helio ? Guedes.
Foram feitos e analisados transectos no Rio Purus, possivelmente no Estado do Amazonas à montante de Boca do Acre.

12/03/2011, 09:51  

Postar um comentário

<< Home