ESTUDO CONSTATA QUE PROCESSO EVOLUTIVO DO MOSQUITO DA DENGUE É RÁPIDO
Resistência
a alguns inseticidas, habilidade de se reproduzir em volumes menores de água que
não precisa estar tão limpa e capacidade de atacar à noite, são algumas das mudanças
constatadas
Karina
Toledo | Agência FAPESP – No que se refere à capacidade de adaptação ao
ambiente hostil das grandes cidades, talvez nenhuma espécie de mosquito tenha
conseguido tanto sucesso quanto o Aedes
aegypti – aquele com o corpo coberto de listras brancas que, para azar dos
humanos, é capaz de transmitir doenças como dengue, febre amarela, febre
chikungunya e zika.
Além de
resistência a alguns inseticidas, a espécie vem adquirindo a habilidade de se
reproduzir em volumes cada vez menores de água – que nem precisa estar tão
limpa quanto no passado. Os insetos, que antes só picavam durante o dia,
passaram a atacar também à noite, bastando apenas alguma luz artificial a
revelar o caminho até a vítima.
Um estudo
recentemente publicado na revista PLoS One por um grupo de pesquisadores do
Instituto Butantan pode ajudar a entender de onde vem esse potencial adaptativo
tão superior ao de outras espécies de mosquito.
Os
pesquisadores acompanharam durante 14 meses (cinco estações climáticas) uma
população do inseto presente na Subprefeitura do Butantã, em São Paulo.
Mensalmente, foram coletados ovos, larvas e pupas, que foram divididos em cinco
grupos – cada um representando uma estação climática. Ao todo, foram estudadas
aproximadamente 20 gerações de mosquitos de uma mesma população. Por dois
métodos diferentes, os pesquisadores investigaram e compararam os grupos a
variabilidade genética existente entre os indivíduos, ou seja, como era a
variação de alelos de DNA ao longo do tempo.
“Desde a
primeira amostragem até a última, em todas as comparações feitas mês a mês,
encontramos diferenças estatísticas significativas. Como se estivéssemos
comparando indivíduos de populações diferentes, ou seja, coletados em locais
distintos. Essa alta variabilidade genética indica que é uma espécie com muita
capacidade de evoluir rapidamente e pode significar que se adapta rapidamente
às adversidades”, afirmou Lincoln Suesdek, coordenador do estudo apoiado pela
FAPESP.
O trabalho
foi feito durante a Iniciação Científica de Caroline Louise, sob orientação de
Suesdek. Segue uma linha de pesquisa que teve início durante o doutorado de
Paloma Oliveira Vidal, também bolsista da FAPESP. “Durante o
doutorado, coletei amostras de mosquito de várias cidades do Estado de São
Paulo em uma única época do ano. Comparei então a variabilidade genética entre
as diferentes populações em uma única geração. Os resultados foram parecidos
com os obtidos no projeto que comparou uma mesma população ao longo de várias
gerações”, contou Vidal.
De acordo
com Suesdek, nos dois projetos foram usados dois diferentes métodos para aferir
a variabilidade genética. Um deles é tradicionalmente usado em estudos de
parentesco: os marcadores microssatélites. Eles avaliam unidades de repetição
de pares de bases do DNA e acusam as variações evolutivas mais recentes. O
método tem ligeira semelhança ao usado em testes de paternidade.
O outro
método, ainda inédito nesse tipo de estudo, foi a avaliação da morfologia da
asa. Nesse caso os pesquisadores elegeram alguns pontos da asa do mosquito como
marcos anatômicos. Uma série de softwares avalia a variação posicional entre
esses pontos nos diferentes grupos.
“Os
marcadores microssatélites são bem informativos, mas esse método é caro e
trabalhoso. Queríamos testar um marcador mais simples e barato. Estudos
anteriores indicavam que a forma da asa dos mosquitos, assim como a fisionomia
dos seres humanos, está ligada à herança familiar. Mas é difícil perceber a
olho nu”, contou Suesdek.
O objetivo
do grupo era avaliar se os dois marcadores usados seguiriam o mesmo padrão. Os
resultados indicaram que de fato há uma correlação, mas que ela não é de 100%. “Conseguimos
prever uma parte da variabilidade genética estudando a asa, mas o método não
substitui a análise do DNA. Pode ser uma metodologia preliminar, a ser usada
quando não se conhece nada sobre uma população e se deseja fazer um teste rápido
para entender a microevolução”, disse Suesdek.
Controle
ao longo do ano
Ao
comparar o resultado das análises feitas durante seu projeto com dados da
literatura científica, Louise concluiu que a dinâmica evolutiva do Aedes em São
Paulo é mais acelerada do que em outras cidades onde há registros semelhantes. “Acreditava-se
que no inverno a variabilidade seria menor, pois com o frio a reprodução do
inseto se torna mais lenta. De fato a taxa reprodutiva é menor nos meses de
inverno, mas a variabilidade genética se manteve alta em todos os meses
avaliados. Esse resultado reforça a necessidade de combater o mosquito o ano
inteiro, não apenas no verão”, disse Louise.
Na
avaliação de Louise, a melhor forma de controlar o mosquito é a adoção de
medidas combinadas, como a eliminação de criadouros e a rotação de inseticidas,
para que não ocorra a seleção de indivíduos resistentes.
Suesdek também ressaltou a necessidade de se investir em pesquisas voltadas ao desenvolvimento de novos métodos de controle químico e biológico, como novos inseticidas e mosquitos transgênicos. “O cenário é preocupante e todas as pessoas têm uma parcela de responsabilidade. Tanto o governo quanto a população precisam fazer sua parte”, afirmou a equipe.
Suesdek também ressaltou a necessidade de se investir em pesquisas voltadas ao desenvolvimento de novos métodos de controle químico e biológico, como novos inseticidas e mosquitos transgênicos. “O cenário é preocupante e todas as pessoas têm uma parcela de responsabilidade. Tanto o governo quanto a população precisam fazer sua parte”, afirmou a equipe.
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