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09 agosto 2016

COMPARANDO A SECA DESTE ANO COM AS DE 2005 E 2010

Foster Brown*, Ednéia Santos** e Ivanilson Oliveira***

Secas fazem parte da história da Amazônia. A Antropóloga Betty Meggers juntou evidências de que Mega El Niños de centenas de anos atrás causaram secas que colapsaram sociedades Indígenas Amazônicas. Mais recentemente a seca de 1925-26, também associada a um El Niño, durou vários meses além do normal aqui na Amazônia Sul-ocidental. Mas durante estes períodos não existiam nesta parte da Amazônia cidades de dezenas a centenas de milhares de pessoas e grandes áreas plantadas com capim que queima facilmente.

Este ano estamos caminhando para uma seca forte e, por causa das implicações, vale a pena analisar um pouco mais profundamente as similaridades e diferenças com duas outras secas Amazônicas recentes – as de 2005 e 2010. A chuva média estimada para Rio Branco pelo INMET (Instituto Nacional de Meteorologia aqui do Brasil) é de 32 mm em junho e de 44 mm em julho, o que servirá como referência para a região. Em 2005, foram registrados 25 mm e 6 mm para os dois meses. No caso de 2010, os valores foram 32 mm e 1 mm, respectivamente. Para este ano, os dados de junho e julho são 2 mm e 12 mm. A soma das chuvas de junho e julho coloca este ano como mais seco do que os outros dois anos.

Mas a chuva é somente parte da equação que determina a seca. Outra parte é a evapotranspiração que tira água do solo, rios, açudes e vegetação e a coloca na atmosfera. A evapotranspiração depende de vários fatores, mas para simplificar, vamos considerar que ela sobe com a temperatura.

A média de temperaturas máximas em junho para os três anos foi de 31 a 32 graus, com a mais baixa sendo a de 2016. Muitos de vocês lembram as friagens sucessivas que tivemos em junho, das quais já temos saudade. Em julho, porém, esta relação mudou de cerca de 31 graus em 2005 e 2010 para 35 graus em 2016!

Podemos ver esta situação mais claramente com o número de dias com temperaturas maiores ou iguais a 35 graus. Em julho de 2005 e de 2010, três dias tiveram temperaturas tão altas, porém este ano 17 dias tiveram temperaturas nesta faixa, cinco vezes mais do que nos outros anos.

E para continuar com a tendência, nos primeiros 7 dias de agosto deste ano todas as temperaturas máximas foram acima de 37 graus! Em todo 2010 somente 10 dias tiveram estas temperaturas mais altas e em 2005 a contagem foi de 17 dias. Quase todos os dias com temperatura acima de 37 graus foram entre meados de agosto e outubro.

Então, além de ter chovido pouco, as temperaturas de julho e agosto deste ano indicam que vamos ter temperaturas bem mais altas do que as dos outros dois anos. Isto significa que a água está evaporando mais rapidamente do que nos outros anos também e agravando a seca caso não tenhamos chuvas que compensem essa água transpirada e evaporada, além do estresse térmico para pessoas e ecossistemas.

Bem, se esta história de pouca chuva e temperaturas mais altas ainda não foi suficiente para distinguir 2016 dos outros anos, temos os dados dos níveis dos rios e queimadas para ajudar nessa distinção. No registro da Defesa Civil Estadual de quarenta anos, o recorde do nível mais baixo do Rio Acre em Rio Branco foi 1.50 m no dia 11 de setembro de 2011. Este recorde foi quebrado no dia 29 de julho deste ano. No dia 7 de agosto o nível tinha baixado a 1.36 metros na referência da Defesa Civil.

No entanto, esta altura não é a mesma encontrada perto da ETA II, onde a maior parte da água para a cidade de Rio Branco é captada. O Deputado Estadual Jenilson Lopes Leite e o primeiro autor atravessaram o Rio Acre nesta data e a água estava abaixo das suas cinturas, indicando menos de um metro de profundidade. A redução do nível do Rio Acre em Rio Branco é cerca de 1 a 2 centímetros por dia durante os primeiros dias de agosto.

As queimadas são inferidas via focos de calor capturados pelo satélite Aqua no período da tarde, quando o mesmo passa acima desta parte da Amazônia Sul-Ocidental. Para o dia 7 de agosto, os focos cumulativos de calor desde 1 de janeiro em 2016 para o Acre foram mais de 1,3 vezes maior do que os do mesmo período de 2005 ou 2010. No caso de Madre de Dios, Peru e Pando, Bolívia, o valor foi 5 vezes e 2 vezes, respectivamente.

Em suma, a nossa região parece mais seca do que em 2005 e 2010, com temperaturas mais altas e queimadas mais frequentes para o início de agosto. Se não tiver chuvas fora de época, enfrentaremos uma redução da disponibilidade de água nos próximos meses. A seca, combinada com numerosos focos de calor, significa que a probabilidade de extensas queimadas de áreas de pasto, áreas agrícolas e florestas é extremamente alta, com o potencial de ser pior do que em 2005 e 2010.

De imediato temos que cuidar muito bem da água que ainda nos resta. Também devemos manter em mente que não podemos queimar antes das primeiras chuvas sem arriscar incêndios de grandes proporções, especialmente nas florestas. Umas poucas horas de incêndio são suficientes para danificar florestas que levaram centenas de anos para se desenvolver. Não podemos esquecer que estas florestas funcionam como bombas de água que ajudam a manter e garantir as chuvas na nossa região.

Olhando um pouco para o futuro próximo, é garantido que teremos outros eventos semelhantes a seca deste ano. Se os modelos de mudanças climáticas estiverem certos, podemos esperar eventos até mais intensos e frequentes nas próximas décadas.

Está na hora de nos prepararmos para colhermos o que plantamos.

*Foster Brown, Pesquisador do Centro de Pesquisa de Woods Hole, Cientista do Programa LBA e do Grupo de Gestão de Riscos de Desastres do Parque Zoobotânico (PZ) da UFAC.

**Ednéia Araújo dos Santos, Engenheira florestal com mestrado em botânica do INPA, bolsista de LBA.

***Ivanilson Dias de Oliveira, Geógrafo, Analista Jr. De Geoprocessamento da FUNCATE.