ABSURDOS BRASILEIROS (3)
Repasse é facilitado porque a lei permite que militares adquiram novas armas para uso particular a cada 2 anos. Segundo um pesquisador, depois da compra os policiais não prestam contas sobre o uso das armas.
Luciana Nunes Leal, luciana.nunesleal@grupoestado.com.br
Rastreamento realizado pelo Exército a pedido da Subcomissão de Armas e Munições da Câmara mostra que uma em cada quatro armas ilegais apreendidas no Estado de São Paulo teve como primeiro dono o poder público, principalmente a Polícia Militar. Essa estatística refere-se apenas às armas que foram vendidas legalmente e depois desviadas para o crime.
O Departamento de Fiscalização de Produtos Controlados (DFPC) do Exército rastreou 4.200 armas apreendidas
Os militares e policiais podem comprar diretamente das fábricas ou nas lojas de armamentos. Para isso, segundo as regras do Exército, precisam de autorização de um superior e ter conduta exemplar no exercício da profissão. As portarias exigem que as armas compradas para uso pessoal sejam registradas. O problema, diz o pesquisador da violência Gláucio Ary Dillon Soares, é que, depois da compra, os policiais não têm de prestar contas sobre o uso das armas. Soares é professor do Instituto Universitário de Pesquisa do Rio de Janeiro, Iuperj .
"A segurança pública está armando bandidos", diz o presidente da subcomissão, deputado Raul Jungmann (PPS-PE), que, no ano passado, fez parte da CPI do Tráfico de Armas. Jungmann encaminhou ao Exército uma relação de 34.087 armas apreendidas
Segundo Jungmann, é muito provável que a maior parte das 1.134 armas vendidas para o poder público e que acabaram no mercado clandestino tenha sido de propriedade particular de policiais militares. O acesso às armas é facilitado por portarias do Exército que autorizam militares das Forças Armadas e policiais a comprar armamentos e munição. A cada dois anos, cada um pode comprar uma arma de porte, uma arma de caça de alma raiada e uma arma de caça de alma lisa. Na definição das normas do Exército, arma de porte é 'curta ou de defesa pessoal', revólver ou pistola. Arma de caça de alma raiada, para caça ou esporte, é carabina ou fuzil. O terceiro tipo, também para caça ou esporte, é espingarda ou 'congêneres'.
"Em pouco tempo, o policial tem um arsenal particular", diz Jungmann . "Depois, essas armas serão vendidas, desviadas, roubadas, enfim, vão parar nas mãos de bandidos." Para Gláucio Soares, policiais que têm armas próprias deveriam ser obrigados a apresentá-las no serviço, uma vez por ano, com o devido registro. Com isso, ficariam impedidos de vender as armas.
O Instituto Viva Rio analisou o resultado da pesquisa e identificou que a maior parte dos armamentos foi produzida a partir de 1990. "Fica quebrado com isto o mito de que as armas curtas brasileiras na mão do crime são armas velhas ou obsoletas", diz o estudo. O Viva Rio diz também que a maior parte das armas foi apreendida na ilegalidade oito anos depois da fabricação.
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