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22 janeiro 2008

VIVA O DENDÊ!

Evandro Ferreira
Blog Ambiente Acreano

Recente relatório do Parlamento Britânico sugere que a Comunidade Européia deveria renunciar à promoção indiscriminada dos biocombustíveis porque causam mais danos que benefícios para o meio ambiente e prejudicam a economia dos países mais pobres. Apesar de parcialmente verdadeira e procedente, a preocupação do parlamento britânico deixar ver que existe muito mais do que mera preocupação ecológica e econômica no fato.

No caso do cultivo do dendê (Elaeis guineensis), é importante discutir a atual tendência de parte da imprensa mundial, incluindo alguns importantes meios de comunicação brasileiros, em usar o dendê como "o exemplo" perfeito do tipo de cultivo para a produção de biocombustível que causa destruição e outros males para o meio ambiente e a economia de quem o produz.

É muito comum, por exemplo, a gente ler que o cultivo do dendê para a produção de biocombustíveis tem causado a aceleração da destruição das florestas asiáticas. Quem conhece ou se interessa em ler um pouco sobre o assunto chega a uma conclusão inexorável: não é verdade! A destruição de florestas asiáticas para o plantio de dendê ocorreu de forma "agressiva" e rápida há 20-30 anos, quando a expansão da cultura para a produção de óleo comestível foi muito beneficiada pelo alto preço que o óleo de palma tinha no mercado internacional.

Na época, o óleo de dendê tomou o mercado mundial de óleos comestíveis "por assalto" e se apresentava como uma séria ameaça ao então "soberano" óleo de soja, dominado internacionalmente pelos EUA. A reação do principal produtor mundial de soja foi brutal e eficiente. Em pouco tempo "o mundo ocidental" foi devidamente abastecido de informações que indicavam que o óleo de dendê era pouco benéfico para a saúde humana. A mensagem era: as pessoas deveriam evitar o consumo do óleo de dendê. Até hoje a campanha, dissimulada é verdade, ainda existe.

Com isso, a febre pelo óleo de dendê passou e os preços da nova commodite se acalmaram. Sem perspectivas de crescimento do consumo mundial, o avanço da cultura se estagnou. Até o advento do uso do óleo de dendê para a produção de biocombustível os agricultores asiáticos apenas cuidaram dos plantios existentes. Para quem não conhece a cultura, um dendezal pode ficar produtivo por 20-30 anos, desde que o material genético usado seja de boa qualidade e se proceda a adubação adequada.

Essa nova "onda" contra o dendê, agora atacando o seu uso como biocombustível é mais propaganda do que realidade. Senão vejamos. Depois de plantado, o dendê pode levar 4-5 anos, ou mais para atingir a sua plenitude de produção. Esta tendência de uso em massa de biocombustíveis (excluindo a cana-de-açúcar) se iniciou há pouco mais de 3 anos e não existem dados concretos que indiquem que, definitivamente, o dendê é a solução. Em minha opinião ele é uma das mais promissoras.

Afirmar que hoje as florestas asiáticas estão seriamente ameaçadas em razão de plantios em larga escala do dendê para a produção de biocombustível parece exagerado. Seria preciso que os empresários asiáticos tivessem uma bola de cristal para ver o futuro e ter a certeza de que seus investimentos estariam mais que garantidos. Cultivar algumas dezenas de hectares de dendê não é barato, especialmente pelo fato de que os investimentos iniciais são altíssimos e o início da produção leva alguns anos. Sem mercado 100% garantido então...

Então porque se fala tanto sobre os plantios de dendê na Ásia? Por que lá estão os maiores plantios mundiais. Mas eles foram feitos muitos anos atrás. Como é uma cultura perene, que não necessita ser renovada anualmente como a soja, plantios antigos, que causaram a destruição de florestas nativas, são encontrados por toda a parte. Portanto, a destruição de florestas em larga escala aconteceu no passado!

Além disso, se cultivar dendê para a produção de biocombustível é um negócio tão bom, como explicar que ainda hoje a maior parte da produção de dendê na Ásia é usada para a elaboração de óleo comestível?

Isso cheira a coisa orquestrada pelos grandes produtores de petróleo da Europa: Inglaterra e Noruega. Eles são os maiores beneficiários do atual boom no preço do petróleo e graças aos altos preços, a exploração de jazidas "inexploráveis" quando o preço do petróleo era mais baixo está em pleno curso na atualidade. Tirar petróleo do Mar do Norte é bem mais caro do que tirar do deserto do oriente médio...

Também não se pode deixar de lembrar que o óleo de dendê é produzido em um sistema de cultivo perene, sem o uso intensivo de produtos químicos (herbicidas e fertilizantes). Por esta razão ele sempre foi e será ferozmente combatido pelo lobby americano envolvido com o cultivo da soja: produtores de sementes certificadas (agora transgênicas), herbicidas, fertilizantes e os próprios produtores e comerciantes da soja.

O dendê não representa mercado algum para as grandes multinacionais do setor agrícola. A soja, por outro lado, é a galinha dos ovos de ouro. Ela venceu a guerra contra o dendê e nada indica que este último terá a menor chance de ressurgir no campo de batalha para propor algum tipo de desafio para a soja.

Portanto, vale a pena perguntar: a quem interessa a paralisação do avanço do cultivo do dendê no mundo? Mantida esta condição, quem sempre vai ganhar com isso? E quem vai perder?

Quem vai ganhar a gente já sabe. Quem vai perder também: as florestas tropicais, os rios e solos contaminados pelos produtos químicos usados no complexo soja. É isso. No caso do Brasil, por exemplo, está mais que claro que a soja vai avançar sobre a floresta amazônica. Especialmente se, no maior dos absurdos, o governo e os produtores de soja conseguirem convencer a sociedade que a melhor alternativa brasileira para a produção de biodiesel é a soja.

Temos que reconhecer que tanto a soja como o dendê causam destruição e ocupam, especialmente no caso do dendê, áreas onde antes existiam florestas nativas. Mas vale a pena, antes de sair atirando indiscriminadamente contra o dendê, fazer uma comparação justa sobre os benefícios e prejuízos de cada um deles.

O dendê pode produzir por 30 anos, depois de 2-3 não requer uso de herbicidas para o controle de ervas daninhas, e seu ciclo de produção emprega um número muito maior de mão-de-obra rural. O acesso a material genético de qualidade deste cultivo não é complicado ou caro. A soja, por outro lado, é uma cultura anual. Requer maquinário caro, agrotóxico em grande quantidade, usa baixa quantidade de mão-de-obra e é um cultivo cujos principais insumos estão nas mãos das grandes corporações internacionais cujas sedes estão na Europa ou nos EUA.

Agora deu para entender porque os políticos de alguns países europeus estão tão preocupados com o avanço do dendê? Toda moeda tem sempre dois lados.

Viva o dendê!

Crédito das imagens: (1) Wikipedia, sem crédito de autoria; (2) Ceplac; (3) Virtual Palm Encyclopedia

1 Comments:

Blogger Unknown said...

Chama-me a atenção o quanto o dendê ainda não é uma opção corrente em nossa culinária. Percebo seu uso bastante restrito à determinados pratos ou ainda incorporado às tradições de culto afro brasileiras. Parece-me que esse fato remonta ao desprezo secular que a cultura africana ainda hoje encontra em sua busca de expressão.
A urgência com que os rumos políticos e sócio-econômicos necessitam ser revistos nos impele à optar pelo simples, levando em conta o intercâmbio menos agressivo com a natureza. Pelo que as informações apontam, o dendê frente à esse critério, se apresenta como uma alternativa mais viável do que a soja. Realmente, descontando a subordinação aos interesses estrangeiros, não consigo ver, por que outra razão o Brasil optaria pela soja.

22/11/2009, 14:17  

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