EMISSORAS QUERIAM MUDAR O FUSO HORÁRIO DO PAÍS
Vejam no artigo de Cristina Charão, do Observatório do Direito à Comunicação, originalmente publicado em outubro de 2007, que o lobby dos empresários de comunicação da região norte era forte para a revogação da Portaria 1.1220/2007 do Ministério da Justiça.
Já naquele época, vendo que não seria tão fácil conseguir mudar ou impedir a entrada em vigor da norma, passaram a tentar mudar o fuso horário da região. No caso do Acre eles já conseguiram.
Emissoras agora querem mudar fuso horário do país*
Cristina Charão, do Observatório do Direito à Comunicação
Originalmente publicado no dia 22.10.2007
Ainda inconformados com a necessária adaptação da programação aos diferentes fusos horários, medida complementar à Classificação Indicativa de programas de TV, empresários do setor agora apostam na revogação da geografia do país. Representantes das emissoras têm procurado parlamentares das duas casas no Congresso para propor a sincronização dos relógios de todo o país ao horário de Brasília. Desta forma, pretendem contornar o dispositivo da Portaria 1.220/07 que determina que a vinculação entre as diferentes categorias de classificação e hora de exibição respeite os diferentes horários vigentes no país.
Desde 1913, o Brasil é oficialmente dividido em quatro fusos horários. Além da hora de Brasília, há um horário diferenciado para as ilhas oceânicas (+1 hora em relação à Brasília), um para a maior parte da região Norte e Centro-Oeste (- 1 hora) e outro para o Acre e a parte mais à oeste do Amazonas (- 2 horas). A divisão, que também acontece nos EUA, existe conta da extensão territorial do país, adaptando a divisão política interna do país ao horário estabelecido pelos padrões internacionais.
Já a vinculação de horário à classificação indicativa passa a valer a partir de 9 de janeiro. Nesta data, vencem os seis meses de prazo de adequação concedido pela Portaria 1.220 do Ministério da Justiça para que as emissoras de TV das regiões Norte e Centro-Oeste passem a considerar o horário local para transmitir programas classificados (filmes, novelas e outros programas gravados). Hoje, na maior parte das duas regiões, uma novela classificada como própria para maiores de 14 anos, que só deve ir ao ar a partir das 21h, é transmitida às 20h. No Acre e na porção mais oeste do Amazonas, às 19h. Com o horário de verão, a diferença de horário aumenta ainda mais.
O empresariado da radiodifusão afirma, no entanto, que esta adaptação é impossível porque acarretaria perdas muito grandes no faturamento das emissoras regionais. Como a tese por trás da portaria – evitar que crianças e adolescentes destas regiões fossem prejudicados em seus direitos – dificilmente será contestada publicamente, os radiodifusores viram na unificação dos fusos horários a chance de burlar o dispositivo legal.
Para isso, os empresários, nas palavras do próprio presidente do Sindicato das Emissoras de Rádio e TV do Amazonas (Sinderpam), Rui Alencar, tentaram “pegar uma carona” em projeto do senador Tião Viana (PT-AC) que já tramitava no Congresso.
Projeto inicial
A proposta original do senador, apresentada em novembro de 2006, era extinguir o fuso horário do Acre e de parte do estado do Amazonas, acertando os ponteiros do estado com o restante da região Norte.
Como o projeto já havia sido aprovado em primeira votação no Senado, as atenções do empresariado voltaram-se para a Câmara, onde o projeto está para ser apreciado pelas comissões competentes. “O senador nos disse que não se oporia a mudanças propostas na Câmara”, contou Alencar, que é diretor-executivo da TV A Crítica, afiliada da Rede Record no Amazonas.
Tião Viana, que assumiu interinamente a Presidência do Senado, não respondeu à solicitação de entrevista sobre o tema, mas sua assessoria confirma que Viana foi procurado por empresários do setor de comunicação para conversar sobre o assunto.
Em seu blog, o senador comenta a sugestão dos empresários. Já admitindo que estaria “acertado que a própria Câmara dos Deputados fará um substitutivo ao seu projeto de lei, propondo a unificação dos quatro fusos horários do Brasil”, Viana afirma que “o horário é que deve se adaptar às pessoas e não as pessoas ao horário”. O texto ainda registra que o senador mostrou-se “totalmente favorável à proposta”.
Sem substitutivo
Na Câmara, porém, o substitutivo ainda não apareceu. A relatora do parecer sobre o projeto na Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informação (CCTCI), Rebecca Garcia (PP-AM), entregou seu relatório no fim da última semana apenas com voto favorável à proposta original do senador Tião Viana.
Questionada sobre as razões para não apresentar a proposta de unificação total do horário brasileiro, a deputada federal do Amazonas afirmou que fez a opção baseada nas informações de ordem técnica recebidas do Observatório Nacional e do Ministério de Minas e Energia. “A adaptação do fuso do Acre ao do resto da Amazônia, segundo nos informou o Observatório Nacional, significaria para o organismo um impacto equivalente a 17 minutos. Mas 1 hora e 17 minutos já é muita coisa”, justificou a deputada, referindo-se ao que poderia ser o novo horário do Acre.
Membro da família que controla a TV Rio Negro, afiliada à Rede Bandeirantes, e o jornal Estado do Amazonas, Rebecca é também pré-candidata à Prefeitura de Manaus.
Sua decisão surpreendeu o presidente do Sinderpam, Rui Alencar. Informado por este Observatório do voto da deputada, Alencar disse que a deputada “estava disposta e propensa” a apresentar o substitutivo. “O próprio presidente da Câmara (Arlindo Chinaglia, do PT-SP) já tinha conhecimento disso e tinha dito que iria conversar com as lideranças para acelerar a tramitação”, comentou.
Outras vias
Porém, a deputada Rebecca, não exclui a possibilidade de outro colega apresentar a proposta. A própria parlamentar e radiodifusora lembra que a Comissão de Amazônia, Integração Nacional e de Desenvolvimento Regional já realizou audiência sobre o tema da Classificação Indicativa e seus impactos para a região.
“Qual a preocupação verdadeira da região: o atraso da informação. Se eu só vou assistir o jornal uma hora depois, tenho uma hora de atraso na informação”, disse Rebecca, fazendo referência ao que teria sido o resultado da audiência.
O comentário reforça a tese defendida por Rui Alencar, do Sinderpam: “Num mundo em que se vive em tempo real, nós teríamos de voltar ao tempo da gravação em fita para transmissão uma hora mais tarde.” Segundo Alencar, o custo desta gravação seria alto demais para boa parte das emissoras da região amazônica.
O arrazoado do diretor-executivo da TV A Crítica e da deputada, entretanto, desconsidera que programas ao vivo, esportivos e de cunho jornalístico não estão sujeitos à classificação indicativa e, portanto, não precisam ter sua veiculação adaptada ao horário local.
Ainda assim, argumentos semelhantes multiplicam-se entre parlamentares das duas Casas do Congresso. O senador Expedito Júnior (PR-RO) acredita que a TV aberta sairá perdendo em seu estado com a entrada em vigor da totalidade da Portaria 1.220/07. “Considero injusta esta portaria, porque ela beneficia a TV a cabo. A publicidade vai se transferir para a TV por assinatura junto com a audiência no caso dos eventos transmitidos ao vivo, como os jogos de futebol”, disse o senador.
Expedito Júnior é autor de requerimento de realização de audiência pública na CCTCI do Senado para rediscutir a vinculação da classificação à faixa de horário local. O pedido foi aprovado, mas não há data prevista para realização da audiência.
A assessoria do senador explicou que o requerimento se baseava apenas na possibilidade de revisão do teor da portaria, ou seja, na revogação do parágrafo único do artigo 19 da portaria, que cita a necessidade de respeito ao fuso. No entanto, por solicitação de outros senadores, o tema da unificação do horário nacional deverá ser incluído na pauta da reunião.
Já naquele época, vendo que não seria tão fácil conseguir mudar ou impedir a entrada em vigor da norma, passaram a tentar mudar o fuso horário da região. No caso do Acre eles já conseguiram.
Emissoras agora querem mudar fuso horário do país*
Cristina Charão, do Observatório do Direito à Comunicação
Originalmente publicado no dia 22.10.2007
Ainda inconformados com a necessária adaptação da programação aos diferentes fusos horários, medida complementar à Classificação Indicativa de programas de TV, empresários do setor agora apostam na revogação da geografia do país. Representantes das emissoras têm procurado parlamentares das duas casas no Congresso para propor a sincronização dos relógios de todo o país ao horário de Brasília. Desta forma, pretendem contornar o dispositivo da Portaria 1.220/07 que determina que a vinculação entre as diferentes categorias de classificação e hora de exibição respeite os diferentes horários vigentes no país.
Desde 1913, o Brasil é oficialmente dividido em quatro fusos horários. Além da hora de Brasília, há um horário diferenciado para as ilhas oceânicas (+1 hora em relação à Brasília), um para a maior parte da região Norte e Centro-Oeste (- 1 hora) e outro para o Acre e a parte mais à oeste do Amazonas (- 2 horas). A divisão, que também acontece nos EUA, existe conta da extensão territorial do país, adaptando a divisão política interna do país ao horário estabelecido pelos padrões internacionais.
Já a vinculação de horário à classificação indicativa passa a valer a partir de 9 de janeiro. Nesta data, vencem os seis meses de prazo de adequação concedido pela Portaria 1.220 do Ministério da Justiça para que as emissoras de TV das regiões Norte e Centro-Oeste passem a considerar o horário local para transmitir programas classificados (filmes, novelas e outros programas gravados). Hoje, na maior parte das duas regiões, uma novela classificada como própria para maiores de 14 anos, que só deve ir ao ar a partir das 21h, é transmitida às 20h. No Acre e na porção mais oeste do Amazonas, às 19h. Com o horário de verão, a diferença de horário aumenta ainda mais.
O empresariado da radiodifusão afirma, no entanto, que esta adaptação é impossível porque acarretaria perdas muito grandes no faturamento das emissoras regionais. Como a tese por trás da portaria – evitar que crianças e adolescentes destas regiões fossem prejudicados em seus direitos – dificilmente será contestada publicamente, os radiodifusores viram na unificação dos fusos horários a chance de burlar o dispositivo legal.
Para isso, os empresários, nas palavras do próprio presidente do Sindicato das Emissoras de Rádio e TV do Amazonas (Sinderpam), Rui Alencar, tentaram “pegar uma carona” em projeto do senador Tião Viana (PT-AC) que já tramitava no Congresso.
Projeto inicial
A proposta original do senador, apresentada em novembro de 2006, era extinguir o fuso horário do Acre e de parte do estado do Amazonas, acertando os ponteiros do estado com o restante da região Norte.
Como o projeto já havia sido aprovado em primeira votação no Senado, as atenções do empresariado voltaram-se para a Câmara, onde o projeto está para ser apreciado pelas comissões competentes. “O senador nos disse que não se oporia a mudanças propostas na Câmara”, contou Alencar, que é diretor-executivo da TV A Crítica, afiliada da Rede Record no Amazonas.
Tião Viana, que assumiu interinamente a Presidência do Senado, não respondeu à solicitação de entrevista sobre o tema, mas sua assessoria confirma que Viana foi procurado por empresários do setor de comunicação para conversar sobre o assunto.
Em seu blog, o senador comenta a sugestão dos empresários. Já admitindo que estaria “acertado que a própria Câmara dos Deputados fará um substitutivo ao seu projeto de lei, propondo a unificação dos quatro fusos horários do Brasil”, Viana afirma que “o horário é que deve se adaptar às pessoas e não as pessoas ao horário”. O texto ainda registra que o senador mostrou-se “totalmente favorável à proposta”.
Sem substitutivo
Na Câmara, porém, o substitutivo ainda não apareceu. A relatora do parecer sobre o projeto na Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informação (CCTCI), Rebecca Garcia (PP-AM), entregou seu relatório no fim da última semana apenas com voto favorável à proposta original do senador Tião Viana.
Questionada sobre as razões para não apresentar a proposta de unificação total do horário brasileiro, a deputada federal do Amazonas afirmou que fez a opção baseada nas informações de ordem técnica recebidas do Observatório Nacional e do Ministério de Minas e Energia. “A adaptação do fuso do Acre ao do resto da Amazônia, segundo nos informou o Observatório Nacional, significaria para o organismo um impacto equivalente a 17 minutos. Mas 1 hora e 17 minutos já é muita coisa”, justificou a deputada, referindo-se ao que poderia ser o novo horário do Acre.
Membro da família que controla a TV Rio Negro, afiliada à Rede Bandeirantes, e o jornal Estado do Amazonas, Rebecca é também pré-candidata à Prefeitura de Manaus.
Sua decisão surpreendeu o presidente do Sinderpam, Rui Alencar. Informado por este Observatório do voto da deputada, Alencar disse que a deputada “estava disposta e propensa” a apresentar o substitutivo. “O próprio presidente da Câmara (Arlindo Chinaglia, do PT-SP) já tinha conhecimento disso e tinha dito que iria conversar com as lideranças para acelerar a tramitação”, comentou.
Outras vias
Porém, a deputada Rebecca, não exclui a possibilidade de outro colega apresentar a proposta. A própria parlamentar e radiodifusora lembra que a Comissão de Amazônia, Integração Nacional e de Desenvolvimento Regional já realizou audiência sobre o tema da Classificação Indicativa e seus impactos para a região.
“Qual a preocupação verdadeira da região: o atraso da informação. Se eu só vou assistir o jornal uma hora depois, tenho uma hora de atraso na informação”, disse Rebecca, fazendo referência ao que teria sido o resultado da audiência.
O comentário reforça a tese defendida por Rui Alencar, do Sinderpam: “Num mundo em que se vive em tempo real, nós teríamos de voltar ao tempo da gravação em fita para transmissão uma hora mais tarde.” Segundo Alencar, o custo desta gravação seria alto demais para boa parte das emissoras da região amazônica.
O arrazoado do diretor-executivo da TV A Crítica e da deputada, entretanto, desconsidera que programas ao vivo, esportivos e de cunho jornalístico não estão sujeitos à classificação indicativa e, portanto, não precisam ter sua veiculação adaptada ao horário local.
Ainda assim, argumentos semelhantes multiplicam-se entre parlamentares das duas Casas do Congresso. O senador Expedito Júnior (PR-RO) acredita que a TV aberta sairá perdendo em seu estado com a entrada em vigor da totalidade da Portaria 1.220/07. “Considero injusta esta portaria, porque ela beneficia a TV a cabo. A publicidade vai se transferir para a TV por assinatura junto com a audiência no caso dos eventos transmitidos ao vivo, como os jogos de futebol”, disse o senador.
Expedito Júnior é autor de requerimento de realização de audiência pública na CCTCI do Senado para rediscutir a vinculação da classificação à faixa de horário local. O pedido foi aprovado, mas não há data prevista para realização da audiência.
A assessoria do senador explicou que o requerimento se baseava apenas na possibilidade de revisão do teor da portaria, ou seja, na revogação do parágrafo único do artigo 19 da portaria, que cita a necessidade de respeito ao fuso. No entanto, por solicitação de outros senadores, o tema da unificação do horário nacional deverá ser incluído na pauta da reunião.
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