A REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA NA AMAZÔNIA
Mangabeira considera regularização fundiária o maior problema na Amazônia
Alex Rodrigues
Repórter da Agência Brasil
Foto: Valter Campanato/ABr
Brasília (21/09/2009) - Na última parte da entrevista concedida à Agência Brasil, o ministro de Assuntos Extraordiários, Mangabeira Unger, explica as medidas propostas no Plano Amazônia Sustentável (PAS) para resolver o problema fundiário na região.
Segundo ele, seriam organizadas e regularizadas propriedades abaixo de 1500 hectares, criando condições para que o Estado brasileiro retome as áreas ilegalmente ocupadas acima de 2500 hectares.
Numa primeira fase, propriedades entre 1500 e 2500 hectares "ficariam em um limbo", não sendo retomadas, mas também não seriam regularizadas.
A conseqüência disso, na prática é que seria construído um modelo econômico e social que privilegia o pequeno e o médio produtor, resistindo às tendências de concentração das propriedades, predominante durante toda a história do país.
"Seria absurdo caracterizar isso como favorecimento à grilagem. Pelo contrário. Estamos falando de um ato de justiça histórica que finalmente criará condições para tornar a preservação ambiental e a produção sustentável mais proveitosa do que o saque".
Agência Brasil: Qual a real dimensão do problema fundiário na Amazônia?
Mangabeira Unger: De todos os problemas locais, que são vários, o maior é o da regularização fundiária. Menos de 4% das terras em mãos de particulares na Amazônia têm sua situação jurídica esclarecida. Há um caos fundiário que resulta em males enormes, suscitando a violência, consagrando a grilagem e tornando o saque mais proveitoso do que a preservação e a produção. Ninguém vai investir em preservação ou em produzir se não confia na continuidade de seu controle sobre a terra. Toda a população da Amazônia se sente chantageada, já que sua base física não está segura, estando sujeita ao vaivém das pressões econômicas. Temos que acabar com isso.
ABr: E como fazer isso?
Mangabeira: Estou trabalhando com os ministros que compõem a Comissão Interministerial de gestão do Plano Amazônia Sustentável (PAS) e com os nove governadores amazônidas [da região] para desdobrar o plano em iniciativas concretas. Já há um consenso de que a prioridade na região é resolver o problema fundiário, sem o que não conseguiremos avançar em nenhum dos outros eixos.
ABr: Que outros eixos, ou problemas, seriam esses?
Mangabeira: Os eixos escolhidos para esse desdobramento são a regularização fundiária e o zoneamento ecológico e econômico regional. O segundo é o combate ao desmatamento à partir da construção de um regime de leis praticáveis que permitam que, preservada, a floresta tenha mais valor que derrubada. O terceiro eixo é assegurar alternativas ambientalmente seguras e economicamente viáveis às populações de pequenos produtores que atuam na zona de transição entre a floresta e o Cerrado. O quarto eixo é a reconstrução da agricultura brasileira na Amazônia Legal e no Cerrado, democratizando-a e agregando-lhe valor. O quinto eixo é o regime de incentivos à criação de pólos industriais. Há ainda as medidas para o transporte multimodal, para que superemos o isolamento amazônico. Por fim, tratamos também de investimentos em ciência, capacitação e ensino. Queremos identificar algumas microrregiões onde possamos adensar [implementar] essas iniciativas.
ABr: A “reinvenção da agricultura” e a instalação de pólos industrias na Amazônia com certeza provocarão grande polêmica.
Mangabeira: Estamos convictos de que podemos dobrar a área atualmente cultivada e triplicar nosso produto agrícola sem tocar em uma única árvore. Quanto aos pólos industriais, na Amazônia florestada seriam instaladas indústrias capazes de transformar produtos madeireiros e não-madeireiros, produzindo tecnologias apropriadas ao manejo sustentável. Já na região amazônica de Cerrado seriam instaladas indústrias que agreguem valor à transformação de produtos agrícolas e minerais.
ABr: Voltando à regularização fundiária, o senhor chegou a propor ao presidente Lula a criação de uma nova autarquia federal que cuidasse exclusivamente do tema na Amazônia. Posteriormente, o senhor disse ter sido convencido de que havia outra opção melhor. Em que ponto está essa discussão?
Mangabeira: Havia duas teses iniciais. Uma era reforçarmos o Incra [Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária] com mais recursos financeiros e humanos para que ele mesmo, em colaboração com os institutos de terra estaduais, fizesse a regularização. A segunda sugestão, apresentada por mim, era estabelecer uma autarquia diretamente ligada à Presidência da República que, também em colaboração com os governos estaduais, cuidasse do tema. Na penúltima quinta-feira [11], governadores e ministros chegamos a um consenso sobre como resolver esse problema.
ABr: A criação de uma agência “enxuta”, ao invés da autarquia que o senhor havia sugerido?
Mangabeira: Sim. Um defeito da minha sugestão é que demoraria tempo para criar, dotar dos recursos humanos necessários e colocar em funcionamento uma autarquia como a que eu propunha. Durante a discussão com os governadores surgiu a sugestão de que organizemos uma entidade leve e enxuta que trabalhe em parceria com os estados fazendo a regularização fundária. Essa agência funcionaria nos moldes do Inmetro [Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial]. Os governadores me convenceram de que esta sugestão é melhor que a minha.
ABr: Mas o Inmetro é uma autarquia vinculada Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior.
Mangabeira: Há ainda certas sutilezas jurídicas que precisam ser discutidas. Pelo direito público brasileiro uma agência tem que ser ou uma autarquia ou uma fundação pública. Provavelmente seria uma autarquia, mas de natureza diferente da que eu havia sugerido anteriormente. Ela não faria o trabalho na base, que seria realizado pelos estados. A função desse órgão seria coordenar, apoiar, monitorar e, em algumas circunstâncias, transferir terras públicas para os estados. Como nenhuma dessas tarefas envolvem a execução direta da regularização, ela não exigiria grande estrutura humana ou financeira, mas sim uma enorme capacidade de gestão.
ABr: O senhor então está convencido de que o Incra, da forma como está organizado hoje, não daria conta de resolver o problema da legalização das propriedades na Amazônia?
Mangabeira: O Incra tem responsabilidades nacionais e, ao longo de sua trajetória, seu foco principal se tornou a reforma agrária e a política de assentamentos e não a regularização fundiária. Como temos pressa para encontrar uma solução para o problema, me pareceu que precisamos de uma entidade que cuide somente da regularização fundiária. Também já há consenso de que só vamos solucionar o problema dando um papel central aos estados e aos seus institutos de terra. O governo federal não vai conseguir resolver esse problema sozinho.
ABr: Então basta criar um novo órgão para solucionar um problema que se arrasta há tanto tempo?
Mangabeira: Não. A solução contempla pelo menos quatro componentes, sendo que o mais importante deles é a simplificação das leis, das regras e dos procedimentos de regularização fundiária na Amazônia. Isso é um consenso. Independente de quem seja o agente institucional responsável por regularizar a posse das terras, nenhuma medida vai resolver o problema se não mudarmos as leis. Há um emaranhado de regras que impedem a regularização fundiária. Esse é, de longe, o aspecto mais importante da discussão e pensamos em sugerir mudanças em três níveis, feitas de uma só vez.
ABr: Que mudanças seriam essas?
Mangabeira: Precisamos saber quem são os titulares das terras, esclarecendo inclusive quando proprietário é o governo federal, o estadual ou o municipal. Sequer isso está claro em grande parte do território amazônico. Depois temos que acelerar a legalização das posses inseguras, resolvendo o problema fundiário de forma sistêmica. Não se consegue regularizar uma propriedade sem resolver os problemas fundiários de todas as propriedades circundantes. Também temos que ordenar as medidas administrativas e os recursos judiciais sem ferir o direito constitucional de alguém recorrer à Justiça quando se sentir prejudicado. Hoje, quando um território está em vias de ser regularizado, alguém recorre a um juiz e consegue uma liminar que paralisa todo o processo. Algumas normas de georeferenciamento também têm que ser revistas, já que o tornam ineficazes.
ABr: Quais os prováveis efeitos da aplicação dessas medidas?
Mangabeira: Organizaríamos a regularização de propriedades abaixo de 1500 hectares, criando condições para que o Estado brasileiro retome as áreas ilegalmente ocupadas acima de 2500 hectares. Numa primeira fase, propriedades entre 1500 e 2500 hectares ficariam em um limbo, não sendo retomadas, mas também não seriam regularizadas. A consequência prática é que iremos construir um modelo econômico e social que privilegia o pequeno e o médio produtor, resistindo às tendências de concentração das propriedades, predominante durante toda a nossa história. Seria absurdo caracterizar isso como favorecimento à grilagem. Pelo contrário. Estamos falando de um ato de justiça histórica que finalmente criará condições para tornar a preservação ambiental e a produção sustentável mais proveitosa do que o saque.
ABr: Durante sua primeira viagem à região amazônica, em janeiro deste ano, antes mesmo de assumir a coordenadoria do Plano Amazônia Sustentável (PAS), o senhor discutiu com os governadores locais algumas propostas de desenvolvimento econômico para a região. Na ocasião, o senhor já destacava a importância de que as intenções fossem transformadas em ações concretas para engajar a sociedade. De lá para cá, o senhor assumiu outras atribuições e passou a apresentar propostas para a estratégia de defesa nacional, para a educação e até mesmo para políticas sociais do governo. Quantas dessas sugestões já foram colocadas em prática e quais seus efeitos?
Mangabeira: Inicialmente, ao assumir a Secretaria de Assuntos Estratégicos, eu apenas formularia um projeto conceitual a respeito do futuro. Só que eu concluí que se fizesse apenas isso, tudo ficaria apenas no papel. Então, reorientei meu trabalho para a definição de uma série de iniciativas que encarnassem um novo modelo de desenvolvimento e que devem ser construídas em colaboração com os demais ministros, governadores e com a sociedade. Em um segundo momento, recebi do governo responsabilidades mais concretas em relação à Amazônia [a coordenadoria do PAS] e à Defesa [a coordenadoria do comitê interministerial responsável por elaborar o Plano Estratégico de Defesa Nacional]. Minha pasta não tem nenhum recurso orçamentário, nenhum poder normativo. Eu não posso baixar portarias. Tudo que eu posso fazer é propor e colaborar. É isso que eu estou fazendo. Algumas dessas iniciativas estão mais próximas de serem implementadas do que outras, mas todas compõem um ideário de reconstrução do nosso modelo de desenvolvimento. Minha grande aflição é ver essa dinâmica iniciada.
Alex Rodrigues
Repórter da Agência Brasil
Foto: Valter Campanato/ABr
Brasília (21/09/2009) - Na última parte da entrevista concedida à Agência Brasil, o ministro de Assuntos Extraordiários, Mangabeira Unger, explica as medidas propostas no Plano Amazônia Sustentável (PAS) para resolver o problema fundiário na região.
Segundo ele, seriam organizadas e regularizadas propriedades abaixo de 1500 hectares, criando condições para que o Estado brasileiro retome as áreas ilegalmente ocupadas acima de 2500 hectares.
Numa primeira fase, propriedades entre 1500 e 2500 hectares "ficariam em um limbo", não sendo retomadas, mas também não seriam regularizadas.
A conseqüência disso, na prática é que seria construído um modelo econômico e social que privilegia o pequeno e o médio produtor, resistindo às tendências de concentração das propriedades, predominante durante toda a história do país.
"Seria absurdo caracterizar isso como favorecimento à grilagem. Pelo contrário. Estamos falando de um ato de justiça histórica que finalmente criará condições para tornar a preservação ambiental e a produção sustentável mais proveitosa do que o saque".
Agência Brasil: Qual a real dimensão do problema fundiário na Amazônia?
Mangabeira Unger: De todos os problemas locais, que são vários, o maior é o da regularização fundiária. Menos de 4% das terras em mãos de particulares na Amazônia têm sua situação jurídica esclarecida. Há um caos fundiário que resulta em males enormes, suscitando a violência, consagrando a grilagem e tornando o saque mais proveitoso do que a preservação e a produção. Ninguém vai investir em preservação ou em produzir se não confia na continuidade de seu controle sobre a terra. Toda a população da Amazônia se sente chantageada, já que sua base física não está segura, estando sujeita ao vaivém das pressões econômicas. Temos que acabar com isso.
ABr: E como fazer isso?
Mangabeira: Estou trabalhando com os ministros que compõem a Comissão Interministerial de gestão do Plano Amazônia Sustentável (PAS) e com os nove governadores amazônidas [da região] para desdobrar o plano em iniciativas concretas. Já há um consenso de que a prioridade na região é resolver o problema fundiário, sem o que não conseguiremos avançar em nenhum dos outros eixos.
ABr: Que outros eixos, ou problemas, seriam esses?
Mangabeira: Os eixos escolhidos para esse desdobramento são a regularização fundiária e o zoneamento ecológico e econômico regional. O segundo é o combate ao desmatamento à partir da construção de um regime de leis praticáveis que permitam que, preservada, a floresta tenha mais valor que derrubada. O terceiro eixo é assegurar alternativas ambientalmente seguras e economicamente viáveis às populações de pequenos produtores que atuam na zona de transição entre a floresta e o Cerrado. O quarto eixo é a reconstrução da agricultura brasileira na Amazônia Legal e no Cerrado, democratizando-a e agregando-lhe valor. O quinto eixo é o regime de incentivos à criação de pólos industriais. Há ainda as medidas para o transporte multimodal, para que superemos o isolamento amazônico. Por fim, tratamos também de investimentos em ciência, capacitação e ensino. Queremos identificar algumas microrregiões onde possamos adensar [implementar] essas iniciativas.
ABr: A “reinvenção da agricultura” e a instalação de pólos industrias na Amazônia com certeza provocarão grande polêmica.
Mangabeira: Estamos convictos de que podemos dobrar a área atualmente cultivada e triplicar nosso produto agrícola sem tocar em uma única árvore. Quanto aos pólos industriais, na Amazônia florestada seriam instaladas indústrias capazes de transformar produtos madeireiros e não-madeireiros, produzindo tecnologias apropriadas ao manejo sustentável. Já na região amazônica de Cerrado seriam instaladas indústrias que agreguem valor à transformação de produtos agrícolas e minerais.
ABr: Voltando à regularização fundiária, o senhor chegou a propor ao presidente Lula a criação de uma nova autarquia federal que cuidasse exclusivamente do tema na Amazônia. Posteriormente, o senhor disse ter sido convencido de que havia outra opção melhor. Em que ponto está essa discussão?
Mangabeira: Havia duas teses iniciais. Uma era reforçarmos o Incra [Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária] com mais recursos financeiros e humanos para que ele mesmo, em colaboração com os institutos de terra estaduais, fizesse a regularização. A segunda sugestão, apresentada por mim, era estabelecer uma autarquia diretamente ligada à Presidência da República que, também em colaboração com os governos estaduais, cuidasse do tema. Na penúltima quinta-feira [11], governadores e ministros chegamos a um consenso sobre como resolver esse problema.
ABr: A criação de uma agência “enxuta”, ao invés da autarquia que o senhor havia sugerido?
Mangabeira: Sim. Um defeito da minha sugestão é que demoraria tempo para criar, dotar dos recursos humanos necessários e colocar em funcionamento uma autarquia como a que eu propunha. Durante a discussão com os governadores surgiu a sugestão de que organizemos uma entidade leve e enxuta que trabalhe em parceria com os estados fazendo a regularização fundária. Essa agência funcionaria nos moldes do Inmetro [Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial]. Os governadores me convenceram de que esta sugestão é melhor que a minha.
ABr: Mas o Inmetro é uma autarquia vinculada Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior.
Mangabeira: Há ainda certas sutilezas jurídicas que precisam ser discutidas. Pelo direito público brasileiro uma agência tem que ser ou uma autarquia ou uma fundação pública. Provavelmente seria uma autarquia, mas de natureza diferente da que eu havia sugerido anteriormente. Ela não faria o trabalho na base, que seria realizado pelos estados. A função desse órgão seria coordenar, apoiar, monitorar e, em algumas circunstâncias, transferir terras públicas para os estados. Como nenhuma dessas tarefas envolvem a execução direta da regularização, ela não exigiria grande estrutura humana ou financeira, mas sim uma enorme capacidade de gestão.
ABr: O senhor então está convencido de que o Incra, da forma como está organizado hoje, não daria conta de resolver o problema da legalização das propriedades na Amazônia?
Mangabeira: O Incra tem responsabilidades nacionais e, ao longo de sua trajetória, seu foco principal se tornou a reforma agrária e a política de assentamentos e não a regularização fundiária. Como temos pressa para encontrar uma solução para o problema, me pareceu que precisamos de uma entidade que cuide somente da regularização fundiária. Também já há consenso de que só vamos solucionar o problema dando um papel central aos estados e aos seus institutos de terra. O governo federal não vai conseguir resolver esse problema sozinho.
ABr: Então basta criar um novo órgão para solucionar um problema que se arrasta há tanto tempo?
Mangabeira: Não. A solução contempla pelo menos quatro componentes, sendo que o mais importante deles é a simplificação das leis, das regras e dos procedimentos de regularização fundiária na Amazônia. Isso é um consenso. Independente de quem seja o agente institucional responsável por regularizar a posse das terras, nenhuma medida vai resolver o problema se não mudarmos as leis. Há um emaranhado de regras que impedem a regularização fundiária. Esse é, de longe, o aspecto mais importante da discussão e pensamos em sugerir mudanças em três níveis, feitas de uma só vez.
ABr: Que mudanças seriam essas?
Mangabeira: Precisamos saber quem são os titulares das terras, esclarecendo inclusive quando proprietário é o governo federal, o estadual ou o municipal. Sequer isso está claro em grande parte do território amazônico. Depois temos que acelerar a legalização das posses inseguras, resolvendo o problema fundiário de forma sistêmica. Não se consegue regularizar uma propriedade sem resolver os problemas fundiários de todas as propriedades circundantes. Também temos que ordenar as medidas administrativas e os recursos judiciais sem ferir o direito constitucional de alguém recorrer à Justiça quando se sentir prejudicado. Hoje, quando um território está em vias de ser regularizado, alguém recorre a um juiz e consegue uma liminar que paralisa todo o processo. Algumas normas de georeferenciamento também têm que ser revistas, já que o tornam ineficazes.
ABr: Quais os prováveis efeitos da aplicação dessas medidas?
Mangabeira: Organizaríamos a regularização de propriedades abaixo de 1500 hectares, criando condições para que o Estado brasileiro retome as áreas ilegalmente ocupadas acima de 2500 hectares. Numa primeira fase, propriedades entre 1500 e 2500 hectares ficariam em um limbo, não sendo retomadas, mas também não seriam regularizadas. A consequência prática é que iremos construir um modelo econômico e social que privilegia o pequeno e o médio produtor, resistindo às tendências de concentração das propriedades, predominante durante toda a nossa história. Seria absurdo caracterizar isso como favorecimento à grilagem. Pelo contrário. Estamos falando de um ato de justiça histórica que finalmente criará condições para tornar a preservação ambiental e a produção sustentável mais proveitosa do que o saque.
ABr: Durante sua primeira viagem à região amazônica, em janeiro deste ano, antes mesmo de assumir a coordenadoria do Plano Amazônia Sustentável (PAS), o senhor discutiu com os governadores locais algumas propostas de desenvolvimento econômico para a região. Na ocasião, o senhor já destacava a importância de que as intenções fossem transformadas em ações concretas para engajar a sociedade. De lá para cá, o senhor assumiu outras atribuições e passou a apresentar propostas para a estratégia de defesa nacional, para a educação e até mesmo para políticas sociais do governo. Quantas dessas sugestões já foram colocadas em prática e quais seus efeitos?
Mangabeira: Inicialmente, ao assumir a Secretaria de Assuntos Estratégicos, eu apenas formularia um projeto conceitual a respeito do futuro. Só que eu concluí que se fizesse apenas isso, tudo ficaria apenas no papel. Então, reorientei meu trabalho para a definição de uma série de iniciativas que encarnassem um novo modelo de desenvolvimento e que devem ser construídas em colaboração com os demais ministros, governadores e com a sociedade. Em um segundo momento, recebi do governo responsabilidades mais concretas em relação à Amazônia [a coordenadoria do PAS] e à Defesa [a coordenadoria do comitê interministerial responsável por elaborar o Plano Estratégico de Defesa Nacional]. Minha pasta não tem nenhum recurso orçamentário, nenhum poder normativo. Eu não posso baixar portarias. Tudo que eu posso fazer é propor e colaborar. É isso que eu estou fazendo. Algumas dessas iniciativas estão mais próximas de serem implementadas do que outras, mas todas compõem um ideário de reconstrução do nosso modelo de desenvolvimento. Minha grande aflição é ver essa dinâmica iniciada.
1 Comments:
Gostei do post.É simples e esclarecedor.
:)
Indira
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