Google
Na Web No BLOG AMBIENTE ACREANO

13 abril 2009

DOENÇAS NEGLIGENCIADAS

Doenças “negligenciadas” constituem um dos grandes desafios da ciência moderna

Leandra Rajczuk
Agência USP de Notícias

Representação da enzima
ADSL de Leishmania
O Instituto Nacional de Biotecnologia Estrutural e Química Medicinal em Doenças Infecciosas (INBEQMeDI) buscará desenvolver novos fármacos para o tratamento de doenças endêmicas do País, principalmente, leishmaniose, esquistossomose, doença de Chagas, malária e leptospirose. É o que atesta o coordenador Glaucius Oliva, diretor do Instituto de Física de São Carlos (IFSC) da USP. “Nosso Instituto tem como foco os estudos estruturais e biológicos em alvos moleculares específicos de microorganismos associados com essas doenças tropicais”, explica.

Oliva ressalta que a proposta do INBEQMeDI consiste na continuidade dos resultados alcançados pela “iniciativa bem sucedida” do Centro de Biotecnologia Molecular Estrutural (CBME), um dos Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepids), programa criado, em 2000, pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), que financiou grupos de pesquisa considerados estratégicos para o Estado. O Instituto, coordenado por Oliva, teve recursos aprovados da ordem de R$4,8 milhões, inseridos no maior investimento feito em redes de pesquisa no País, R$553 milhões, aplicados em 101 Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia (INCT) nos próximos três a cinco anos.

“Por intermédio do CBME, nos últimos 8 anos temos conduzido projetos inovadores em biotecnologia estrutural e química medicinal, incluindo o desenvolvimento de patentes, transferência de tecnologia e disseminação da ciência por meio de diversos programas dedicados aos alunos e professores do ensino médio, bem como à população em geral”, afirma. “Outro fator fundamental para este novo projeto é o fato termos sido recentemente selecionados pela Organização Mundial da Saúde, por meio de seu Programa de Pesquisas em Doenças Tropicais (TDR), como centro de referência mundial de química medicinal em doença de Chagas.”

De acordo com o coordenador, as chamadas doenças “negligenciadas” constituem um dos grandes desafios da ciência moderna. “A dura realidade de milhões de mortes anuais, além do terrível impacto na já precária qualidade de vida das pessoas afetadas por estas enfermidades, nos coloca a urgência de dedicarmos nossas mais poderosas ferramentas científicas para uma melhor compreensão das causas e características das doenças tropicais e, assim, avançar na descoberta e desenvolvimento de novos fármacos”, reitera. “Há, hoje, no cenário internacional, forte interesse, tanto dos cientistas como de organizações governamentais ou não, em apoiar e realizar pesquisas de fronteira na biologia dos parasitas e na busca de moléculas inovadoras que possam ser usadas para a prevenção, tratamento e cura destas doenças. Nosso projeto, portanto, está alinhado com outras iniciativas de ponta, tanto no Brasil como no exterior.”

Mutações na estrutura molecular da enzima APRT humana que causam severas doenças genéticas no sistema renal

Novo prédio de laboratórios
Sediado no IFSC, o Instituto será organizado em uma rede que contará com um time de dez docentes pesquisadores, entre físicos, biólogos e químicos, somados a algumas dezenas de pós-doutorandos, doutorandos, mestrandos, alunos de iniciação científica e técnicos especializados. “Esse grupo vem trabalhando de forma integrada e fortemente interdisciplinar no estudo da estrutura e função de proteínas-alvo em parasitas”, informa Oliva. Ao grupo somam-se parasitologistas, bioquímicos e farmacêuticos de outras cinco unidades da USP, como os Institutos de Biociências, Ciências Biomédicas e de Química e as Faculdades de Medicina e Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto.

Haverá, ainda, parceria com o Departamento de Química da Universidade Federal de São Carlos (UFsCar), além de dois jovens pesquisadores de grupos emergentes, um da Universidade Estadual de Ponta Grossa, no Paraná, e outro da Universidade Federal de Viçosa, em Minas Gerais. “A organização é matricial, com projetos transversais que se originam nos laboratórios dos parasitologistas e biólogos moleculares, passam pelos estudos estruturais dos cristalógrafos e físicos, até os químicos medicinais, sintéticos e de produtos naturais, que buscam as moléculas que devem interagir especificamente com os alvos e assim exercer seu papel terapêutico”, explica Oliva.

“O IFSC, como instituição-sede, manterá laboratórios e infra-estrutura para a expressão recombinante de proteínas, estudos estruturais, bioensaios e química medicinal”, diz. “A busca por alvos nos parasitas ocorrerá nos laboratórios associados, assim como a síntese e busca por produtos naturais. Além disso, a Reitoria da USP estará nos apoiando com recursos para a construção de um novo prédio de laboratórios no Campus II da USP em São Carlos.”

Para abordar problemas complexos, como o das doenças infecciosas, o grupo conta com vasto histórico de projetos de pesquisas tecnológicas desenvolvidos em parceria com indústrias farmacêuticas nacionais. “Temos uma grande expectativa de que moléculas inovadoras que sejam desenvolvidas em nossas pesquisas possam, efetivamente, vir a serem utilizadas na indústria”, avisa Oliva.

Para se ter uma idéia do trabalho que os integrantes do Instituto terão pela frente, no caso da malária o foco será nas vias de sinalização que controlam o ciclo celular do Plasmodium falciparum. Outro estudo, por exemplo, se dedicará às proteínas Lip32 e Lp19, da bactéria que causa a leptospirose, envolvidas na patogênese da doença por sua habilidade em desencadear resposta inflamatória no hospedeiro humano. “Em todos os casos, elucidada a estrutura do alvo, partiremos para o desenvolvimento de moléculas que ataquem estas proteínas, por síntese química ou busca de produtos naturais, secundada por ensaios in vitro e in vivo, visando a validação destas moléculas como candidatos a novos fármacos.”

O coordenador explica que o Centro de Biotecnologia Molecular Estrutural tem um programa de classe mundial na divulgação de ciências nas áreas de biologia molecular e estrutural, bem como em microbiologia, parasitologia e química medicinal. “Recebemos estudantes do ensino fundamental e médio, bem como professores do ensino básico, para atividades variadas, incluindo cursos de reciclagem”, informa. “Também mantemos um portal na Internet (http://cbme.usp.br) de interface com escolas de ensino fundamental e médio e desenvolvemos vários materiais didáticos e lúdicos. Temos, inclusive, uma empresa spin-off, que foi criada para viabilizar a reprodução e distribuição destes materiais. Estas atividades serão fortemente aprofundadas no âmbito do novo INCT.”

Imagens cedidas pelo pesquisador