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01 setembro 2015

ABELHAS AFRICANIZADAS ‘NÃO INVADIRAM’ A FLORESTA AMAZÔNICA

Evandro Ferreira
Blog Ambiente Acreano

Muitos de vocês já assistiram filmes sensacionalistas de Hollywood no qual abelhas ‘assassinas’ matam os humanos com quem contracenam. As tais abelhas são invariavelmente de origem africana e tem uma característica em particular que despertou o interesse da indústria do cinema: o comportamento extremamente agressivo.

Introduzidas acidentalmente no Brasil em 1957, as abelhas africanas (Apis mellifera scutellata) cruzaram livremente com espécies europeias (Apis mellifera ligustica, Apis mellifera mellifera e Apis mellifera carniça) produzindo populações poli híbridas denominadas africanizadas, com predominância de características das abelhas africanas: alta capacidade de adaptação a ambientes inóspitos, maior resistência a doenças e patógenos, ciclo de vida mais curto e alta capacidade de formar novos enxames, alta produtividade, maior capacidade de defesa e agressividade.

A agressividade dessas abelhas, em contraste com a mansidão das espécies europeias, se traduz em ataques a pessoas e animais que se aproximam de suas colmeias e podem, dependendo da intensidade do ataque, resultar em mortes. Isso aconteceu com muita frequência nos primeiros anos após a introdução das abelhas africanas em razão do desconhecimento, por parte da população e dos apicultores, dos riscos representados pelas abelhas africanizadas.

A fama de assassinas vem desse período e o pavor que se estabeleceu na época derivou de notícias sensacionalistas difundidas nas redes de TV, jornais e revistas do Brasil e do exterior. O interesse dos estúdios de Hollywood por essas abelhas, no entanto, só se deu na década de 70 quando ficou claro que as ‘abelhas assassinas’ estavam migrando em direção à América do Norte e sua chegada ao território americano era apenas questão de tempo, tendo se concretizado no ano de 1990. Este fato passou a impressão de que as abelhas africanizadas estão tomando de conta das Américas. A velocidade de sua migração em direção ao continente norte americano foi de 400-500 km/ano corrobora essa impressão, pois equivale à distância entre Rio Branco e Tarauacá, por exemplo. 

Apesar dos problemas relacionados com a agressividade excessiva, a introdução das abelhas africanas foi benéfica para a apicultura brasileira que antes da introdução produzia entre 3 e 5 mil toneladas de mel/ano e algumas décadas depois passou a produzir mais de 40 mil toneladas/ano.

Entretanto, apesar da reconhecida rusticidade e capacidade adaptativa, uma situação tem intrigado os pesquisadores: as abelhas africanizadas dificilmente são encontradas no interior das extensas áreas florestais primárias da região Amazônica.

Para entender o ‘fracasso’ da colonização dessas abelhas nas florestas primárias da região, os pesquisadores Marcio Luiz de Oliveira e Jorge Alcântara Cunha, do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA), testaram a capacidade dessas abelhas de penetrar florestas contínuas ou fragmentos florestais e, quando isso ocorria, medir a distância que adentravam no interior da floresta. Para isso foram espalhadas iscas no interior da floresta na Amazônia central e em áreas desmatadas das proximidades. O resultado mostrou que nenhuma abelha africanizada visitou as iscas no interior da floresta, somente nas áreas desmatadas.

Os motivos de as abelhas africanizadas não terem visitado o interior da floresta ainda não estão claros, mas algumas hipóteses são sugeridas: (a) Parece existir uma baixa densidade populacional de abelhas africanizadas na Amazônia; (b) Em regiões de trópico úmido colônias dessas abelhas são muito debilitadas por fungos, doenças, ataques de formigas e vespas ou destruídas por vertebrados predadores de ninhos; (c) O excesso de chuvas faz com que o aporte de néctar seja menor que o consumo, pois as operárias não forrageiam durante a chuva e após a mesma só encontram flores lavadas, resultando na diminuição do alimento disponível para as crias, que ficam mal nutridas e sujeitas a doenças; (d) É mais fácil obter recursos em ambientes abertos, onde o forrageio pode ser feito nos estratos mais baixos (±15 m), ante os 30 m das copas das árvores no interior da floresta.

Os autores concluíram o seguinte: (a) Apesar da floresta exuberante e rica em floradas, a apicultura em grande escala na Amazônia parece ser inviável nas áreas mais densamente vegetadas, que, conforme mostrou o estudo, não são visitadas pelas abelhas africanizadas; (b) Se o desenvolvimento da apicultura requer grandes áreas abertas, uma alternativa seria a utilização das áreas degradadas existentes; (c) A ausência de abelhas africanas visitando as iscas na floresta indica a inexistência de competição por recursos com as abelhas nativas (melíponas) no interior da floresta.


Para saber mais: Marcio Luiz de Oliveira e Jorge Alcântra Cunha. 2005. Abelhas africanizadas Apis mellifera scutellata Lepeletier, 1836 (Hymenoptera: Apidae: Apinae) exploram recursos na floresta amazônica? Acta Amazonica, 35(3): 389-394.

Imagem: abelha africana (Apis mellifera scutellata).
Fonte: http://zootecniae10.blogspot.com.br/2012/04/principais-racas-de-abelhas.html