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02 janeiro 2006

2005: MALÁRIA E FEBRE AFTOSA

Publicado no Diário do Juruá, 02/02/2005

- O ano de 2005 terminou deixando um rastro de grandes tragédias. Felizmente a maior delas que afetou o Brasil, a tempestade da corrupção e da desonestidade, pelo menos até agora não ceifou a vida de ninguém (diretamente), deixando porém prejuízos morais e materiais incalculáveis ao país.- O destroço só não foi maior porque o povo brasileiro expressou um sentimento de bom senso e deixou claro ao Congresso Nacional que tratasse a chaga com remédios que não provocasse efeitos colaterais desastrosos ao corpo da economia brasileira, o grande fator positivo do governo Lula, tirando alguns pequenos acertos aqui e ali em outras áreas.

- Outro acontecimento que quase se transformou em tragédia econômica para nosso país, foi a contaminação de pequena parte do rebanho bovino do Centro-Oeste pela febre aftosa. Diante da possibilidade de grandes prejuízos econômicos para o Brasil, já que poderia deixar de exportar para o mundo toneladas de carne bovina, o governo tratou de resolver a questão sem perder tempo e parece que está obtendo êxito. O tratamento foi, tem sido e será radical.- Centenas de bois foram mortos, indenizações materiais, vacinas foram distribuídas em todo o país, campanhas foram veiculadas no rádio, jornais e televisão, alguns pecuaristas descuidados ficaram no prejuízo, todavia a carne bovina brasileira continua em alta no mercado internacional. Alguém poderia afirmar: “tem que ser assim mesmo”.

- Eu concordo, o Brasil não pode ser vencido por mazelas políticas, econômicas ou físicas, sob pena de continuar eternamente sendo o detentor da famosa terminologia “o Brasil é um país em desenvolvimento”. Os bois do centro-sul do país estão pastando em paz, e os que morrerem, morrerão com muita saúde para darem saúde à economia e ao povo brasileiro.- Agora quero falar de uma outra tragédia que vem silenciosamente se alastrando em alguns lugares da Amazônia brasileira, sendo uma dessas regiões o vale do Juruá, nos municípios de Cruzeiro do Sul, Rodrigues Alves e sobretudo Mâncio Lima, aqui no Acre. Desde 2003 a malária vem aumentado o número de casos na área, tendo chegado no final de 2005 em índices preocupantes.

- É certo que as prefeituras locais e governo do Estado vem intensificando ações para o combate da epidemia que maltrata penosamente os seres humanos, já tendo levado alguns à morte na região. De acordo com aqueles que entendem do assunto, uma pessoa que contrai malária muitas vezes, acaba tendo a saúde de alguns órgãos internos bastante debilitada, com conseqüências para o resto da vida.

- Um boi com aftosa tem dificuldades para se alimentar e andar e assim perde peso e morre. Um homem com malária também tem dificuldades para continuar sua lida normal, e precisa se alimentar bem, com dieta e medicamentos adequados, mas se não tem acesso a isso, também acaba morrendo como um animal magro e feio. Um homem que sustenta a família trabalhando na agricultura, realizando pequenas pescarias e caçadas, quando contrai malária, a família toda acaba deixando de se alimentar, vai parando devagarinho, perdendo peso, sofrendo, até que a cura chega e o homem volta a trazer comida para casa. Viver assim é uma luta sem trégua.

- A maioria dos doentes de malária do vale do Juruá não possuem emprego para assegurar a continuidade do sustento diante da doença, então eles precisam de ajuda e esse socorro é o alimento, o remédio, as ações que atinjam o mosquito transmissor desde seus primeiros dias e outras atitudes que de alguma forma promovam um controle eficaz da malária na região.

- Passamos muitos anos com a malária controlada, numa época em que haviam poucas estradas abertas, sem tecnologia, sem carros 4x4, sem helicópteros, motocicletas e outros recursos maravilhosos que hoje temos à mão, porque hoje não conseguiríamos? Um ser humano saudável, bem alimentado e instruído também pode dar lucro ao país, não só apenas os bois. Sei que é injusto comparar homens com bois, mas a ironia de tudo isso é que diante de um iminente prejuízo de bilhões de dólares, o Brasil agiu para salvar seus bois, mas diante de uma tragédia que se agiganta a cada dia caminhando para destruir a saúde de milhares de juruaenses, diante do prejuízo de vidas com saúde debilitada pelo resto da vida, o governo tem reagido com certa lentidão para controlar a malária na região. A título de sugestão, assim como o governo mobilizou toda uma estrutura para distribuir alimentos aos moradores de parte da Amazônia que estão sofrendo com a última seca na região, - e olha que esses moradores deveriam ter plantado arroz, feijão, jerimum, melancia, mamão, etc, nessas terras férteis dos rios e lagos secos, e já teriam tido uma colheita abundante - porque não estendem a operação para alcançar as vítimas mais pobres da malária na Amazônia?

- Essas pessoas um dia poderão fazer falta à nação, à economia da região poderá ser afetada lenta e negativamente, dificultando ainda mais a vida dos mais pobres do Juruá. Se houvesse petróleo embaixo deste solo, será que a malária estaria descontrolada nesta região? Salvemos nossos bois, mas salvemos também nossos homens, mulheres e crianças da malária que assola esta terra.

- Cada dia o receio de contrair malária aumenta mais, é um assunto constante e presente nas conversas do povo do Juruá. A percepção que se tem é que a praga vai se espalhando a passos de lagarta, você pensa que ela vai devagar e você tira a vista, mas quando olha de novo, ela já está bem mais longe do que você imagina. Questionamentos devem ser feitos. Será que o veneno usado na borrifação está sendo eficaz? Não sei, alguém precisa contribuir com informações mais esclarecidas. Por enquanto nosso papel é apenas contribuir de forma sensata e elevada com o povo do Juruá, e usamos as letras para conseguir alguma vantagem sobre essa humilhante situação.