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05 março 2006

IMAGENS DE SATÉLITE DENUNCIAM!

O CÍRCULO VICIOSO DO DESMATAMENTO, DA FALSA REFORMA AGRÁRIA E A INOPERÂNCIA DAS INSTITUIÇÕES PÚBLICAS RELACIONADAS COM ESTES ASSUNTOS

A facilidade com que se pode ter acesso a imagens de satélite tem permitido a observação "desde lá de cima" de crimes ambientais cometidos "cá em baixo". Denunciam ainda a ineficácia das instituições governamentais que lidam com a questão do controle do desmatamento e com a reforma agrária em nosso país.

A sequência das imagens de satélite apresentada abaixo (produzidas pela Fundação de Tecnologia do Acre-FUNTAC), mostra claramente a situação da cobertura vegetal dos lotes de um projeto de assentamento agrícola nas cercanias da cidade de Brasiléia, no leste do Estado do Acre.

Como todos sabemos, cada lote nos projetos de assentamento em nossa região têm em média 100 ha. Para a região amazônica, a lei obriga os seus proprietários a preservar 80% da cobertura florestal destes lotes.

Será que isto está ocorrendo? Para responder, vamos dar uma olhada na sequência de imagens abaixo.

IMAGEM 1: o leitor tem idéia da localização geográfica do projeto de assentamento agrícola em relação à cidade de Brasiléia













IMAGEM 2: a distribuição geral dos lotes está bem visível, assim como os ramais (estradas) de acesso, que estão marcados por linhas em cor vermelho escuro.












IMAGEM 3: a imagem é aproximada. Nela está claro que a maioria dos lotes já foram desmatados em proporção muito superior aos 20% permitidos pela lei. Em alguns casos, como nos lotes da fileira central, 100% da área foi desmatada. Como isso foi possível?












A imagem 3 acima é emblemática e representa a realidade da maioria dos projetos de assentamento agrícolas do Acre.

Originalmente planejados para receber pequenos agricultores e suas famílias em pequenos lotes de 100 ha, a história destes projetos demonstra que muitos que recebem lotes permanecem pouco tempo nos mesmos. Logo que o INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) emite o título de posse definitiva, muitos destes pequenos agricultores vendem os lotes para outras pessoas, quase sempre fazendeiros em busca de terras baratas para expandir suas fazendas de criação de gado. Para burlar a lei, os novos proprietários fazem contratos de "gaveta" e deixam para transferir a propriedade legal muitos anos depois. Assim, "no papel", o dono do lote continua a ser o beneficiário original da reforma agrária, mas a posse é do comprador.

Depois que a posse é transferida, acontece um processo que todos os anos testemunhamos: a aceleração dos desmatamentos impunes das áreas florestais nos projetos de assentamento. Não se respeita nem a reserva legal de 80% da área dos lotes requerida pela lei.

Como isso é possível?

Acreditem: o INCRA e o IBAMA aceitam que estes "novos proprietários" apresentem áreas florestais em outras localidades como prova de que estão preservando a floresta. Estas outras áreas geralmente estão localizadas em lugares inacessíveis (dai os fazendeiros não poderem fazer a fazenda por lá). Para atender a legislação, os fazendeiros têm que registrar em cartório estas reservas florestais e (acreditem se quiser) se comprometem a nunca desmatar tais áreas.

Na prática, estas áreas permanecem intocadas enquanto as áreas permanecem inacessíveis. Quando uma estrada é aberta...a destruição é certa. Sempre se arranja um jeito de se burlar a lei e sair impune da situação.

Assim, se o leitor observar com cuidado na imagem 3 acima, vai ver que a maioria dos lotes da fileira central devem fazer parte de uma fazenda de criação de gado. Estão quase todos desmatados. Não sobrou nem a mata ciliar ao longo dos cursos de água que existiam na propriedade.

E o objetivo original do projeto de assentamento que era distribuir terra para os pequenos agricultores sem terra (reforma agrária)?

Aqui a história contemporânea está, dia a dia, deixando claro o que tem acontecido. Ao venderem seus lotes, muitos pequenos agricultores voltam a bater nas portas do INCRA para solicitar novos lotes. Às vezes migram para outros Estados. Quando são agraciados com novas áreas de terra, a primeira coisa que eles fazem (isso é inevitável) é desmatar "um pouquinho" da mata para cultivar milho, arroz, feijão, mandioca e outros produtos alimentares. Muitos até formam umas poucas hectares de pasto para criar uma dúzia de cabeça de gado. Nada que cause grandes estragos. Agora, se isso se repetir constantemente, o impacto ambiental desta rotina é enorme.

Resumindo o problema: estamos caminhando em círculos. Tanto sob o ponto de vista da reforma agrária quanto do desmatamento. O irônico é que pela lei da reforma agrária, os lotes de projetos de assentamento não podem ser revendidos e, teoricamente, áreas destinadas para pequenos agricultores deveriam permanecer como tal e não transformadas em grandes fazendas de gado.

Infelizmente isso tem acontecido o tempo todo e, pelo menos no Acre, todo mundo vê e sabe onde as fazendas de criação de gado estão prosperando nos projetos de assentamento.

Porque é tão difícil fazer cumprir a lei? É tão difícil ter um cadastro atualizado com os nomes de pequenos agricultores que costumam fazer da comercialização de lotes um meio de vida (para barra-los nos futuros projetos de assentamento)? E levantar a posse dos lotes transformados em grandes fazendas dentro destes projetos de assentamento?

Se nada for feito, vamos precisar de muitos "Brasis" para atender a demanda de uma reforma agrária feita "as cegas" e sem critérios. Na verdade, as fazendas de gado nestes projetos de reforma agrária são meros subprotudos. É que o ser humano tende a fazer o mais fácil. Fazendeiro vai para os projetos de reforma agrária porque lá existe terra barata e acessível, o que garante maior segurança ao seu investimento.

Toda essa destruição acontece em detrimento do nosso meio ambiente.

Responda leitor: a solução para este problema é realmente tão difícil? Será que estou sonhando quando vejo tudo isso como uma coisa relativamente fácil de ser resolvida?

Minha visão do problema se baseia no fato de que o IBAMA e o INCRA não são, em nenhuma hipótese, instituições públicas sucateadas (nem a administração pública brasileira). Pelo contrário. Estão contratando mais servidores e anualmente recebem gordas verbas para aquisição de materiais e equipamentos.

Pode-se questionar que eles não podem fazer tudo. Está certo. Mas para tudo se tem uma solução. Por exemplo: é necessário apoio para estudar e preparar as imagens de satélites? No Acre temos pelo menos 3 grupos capazes de realizar trabalhos com imagens de satélite: a FUNTAC, o Instituto de Meio Ambiente do Acre (IMAC) e o Parque Zoobotânico da UFAC.

Então me digam: onde está o grande obstáculo para a resolução deste problema em particular? Eu não consigo vê-lo. Será que estou cego e não sei?