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14 junho 2006

RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE SOB A ÓTICA DOS MÉDICOS

ELES SÃO OS ATORES, A PLATÉIA E CRÍTICOS AO MESMO TEMPO

Todo mundo no Brasil sabe como, de uma maneira geral, grupos tendem a ser corporativistas. Um dos mais conhecidos são os médicos. Aqueles que tentam, de todas as formas, "abafar" erros de colegas, impondo, incialmente, uma avaliação da própria classe via Conselho Regional de Medicina (CRM). Se você for vítima de erro médico no Brasil, espere pelo pior: primeiro os tais CRMs irão levar o tempo que eles acharem conveniente para "julgar" os pares. Depois vem a justiça, que, como todos sabem, leva (literalmente) "uma vida" para julgar causas deste tipo. Muitas vezes as vítimas morreram antes de saber o resultado da causa.

Na qualidade de pesquisador, sempre pensei que revistas científicas fossem sérias pois dados científicos são frios números que têm que ser analisados como tal. Assim, quando algum pesquisador "esperto" tenta passar a perna na comunidade científica, logo se descobre a fraude. É claro que a manipulação de dados científicos pode ser praticada de todas as formas. Mas os conselhos editoriais das revistas científicas quase sempre impedem a publicação de artigos "fracos" ou claramente tendenciosos.

Esse não parece ser o caso da Revista da Associação Médica Brasileira, que em seu vol. 51 No.3 (Maio/Junho 2005) publicou o artigo "A relação médico-paciente em Rio Branco/AC sob a ótica dos pacientes", de autoria de Maria das Graças Alves Pereira e Eliane S. Azevêdo.

O estudo, realizado nas dependências da Fundação Hospitalar do Acre (Fundacre), chegou à conclusão que 70% dos pacientes envolvidos no estudo (50) estavam satisfeitos com a atenção dos médicos. Infelizmente, as tabelas apresentadas no referido estudo indicam um conflito ou pelo menos, uma aparente tendência dos autores de amenizar a opinião dos pacientes. Senão, veja, leitor, as tabelas extraídas do estudo e apresentadas abaixo:






















Lendo o artigo é possível observar que os pacientes entrevistados (n=50): (i) avaliaram negativamentea a comunicação dos médicos durante as visitas (60%, Tabela 2), (ii) consideraram os médicos impontuais e faltosos (52%, Tabela 3) e (iii) consideraram a comunicação dos médicos com os pacientes falha ou inexistentes (66,7%, Tabela 3).

Apesar de tudo isso, a conclusão do estudo indica que estes mesmos pacientes avaliam "massivamente" (70%) de forma positiva a relação médico-paciente praticada na Fundacre. Usando um pouco de ironia, me pergunto: seriam eles sádicos com eles mesmos? Tem alguma coisa "estranha" na metodologia do estudo de Maria das Graças Alves Pereira e Eliane S. Azevêdo.

Se eu avalio médicos da forma como os pacientes avaliaram, jamais iria dizer, ao final de minha estada no hospital, que estou satisfeito com o atendimento recebido. O que você acha? Também iria avaliar de forma positiva um atendimento no qual o médico, literalmente, não fala com você e te visita de forma impontual ou nem visita?

Lendo o artigo e a metodologia adotada pelas autoras, não fica claro de onde elas conseguiram chegar a esse alto índice de aprovação da relação médico-paciente. Entretanto, supeito da seguinte situação:

- Você está doente, fragilizado, e tem que se internar em um hospital, onde fica extremamente dependente dos médicos, enfermeiros, pessoal da limpeza, cozinheiros, etc. Em outras palavras, um "quase" refém de uma situação na qual tem que seguir à risca o que lhe dizem, sob pena de ter complicações ainda maiores.

Então, durante esta fase difícil de sua vida, ou imediatamente após, alguem do hospital lhe convida a dar sua opinião sobre o atendimento médico recebido. Só que para isso você tem que assinar um documento (Termo de Consentimento Livre e Esclarecido-TCLE), e ouvir a leitura do mesmo por parte do entrevistador.

- Será que você, ainda incerto se vai ter que retornar ou não ao tal hospital, vai dizer que foi pessimamente atendido? Claro que não!

É a mesma coisa que fazer pesquisa sobre uso de plantas medicinais em áreas rurais e mandar um entrevistador do sexo masculino perguntar às esposas e filhas dos agricultores e seringueiros quais doenças venéreas elas têm e quais espécies de plantas medicinais usam para tratar estas doenças. Mais contrangedor é perguntar como elas usam e aplicam os remédios caseiros.

Você acha que uma pesquisa dessa vai ter sucesso e respostas sinceras por parte dos entrevistados?

O comitê editorial da Revista da Associação Médica Brasileira aceitou algo similar ao permitir a publicação do artigo de Maria das Graças Alves Pereira e Eliane S. Azevêdo. Será que o corporativismo venceu mais uma vez?