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28 setembro 2008

A neocolônia Brasil importa a indústria de celulose que a Europa não quer mais

Henrique Cortez
Coordenador do Portal Ecodebate

Matéria de Marianna Aragão, do O Estado de S.Paulo, de 20/09/2008 [Indústria de celulose fecha as portas na Europa e abre no Brasil], informa que, enquanto a Europa reduz a produção para cortar custos, o Brasil saltará do 6.º para o 3.º lugar do ranking mundial. Mais uma vez, o modelo de desenvolvimento neocolonial nos fará importar as indústrias que os “desenvolvidos” não querem mais.

De acordo com a matéria “o País virou o alvo preferido de multinacionais do setor, que nos últimos anos estão levando suas fábricas de países do Hemisfério Norte para os do Sul. A sueco-finlandesa Stora Enso, a portuguesa Portucel e os chineses da Asia Pulp & Paper (APP) são algumas das gigantes que avaliam empreendimentos no Brasil, segundo fontes ligadas às empresas.

Além de escassa, a madeira utilizada pelos grandes produtores na Europa, Estados Unidos e Canadá ficou mais cara. Em janeiro de 2009, a Rússia, uma das principais fornecedora da indústria européia, vai começar a sobretaxar as exportações desse insumo.

A sueco-finlandesa Stora Enso, uma das maiores do setor, com faturamento de US$ 11,8 bilhões, fechou quatro fábricas na Europa nos últimos dois anos. Agora, concentra seus esforços nos mercados emergentes, principalmente em países da América Latina e China.“

É claro que haverá quem festeje a expansão da indústria de celulose e da monocultura do eucalipto. Sempre há quem ganhe alguma coisa em situações como esta, mas, a regra geral é que sociedade perde e muito.

Os países que se intitulam desenvolvidos já fazem esta transferência de danos desde os anos 60 e o Brasil tem sido um aplicado importador de poluição e danos sociais [Leia íntegra de documento oficial dos EUA, na década de 70, sobre poluição no Brasil: Brasil: Se o Desenvolvimento Traz poluição, Que Assim Seja].

Antes de discutir o novo “surto” desenvolvimentista a qualquer custo, que adotou as monoculturas com entusiasmo, acho interessante lembrar alguns casos da nossa opção neocolonial de importação de poluição e danos socioambientais.

O maior exemplo é o que aconteceu com a cidade de Cubatão que, durante a ditadura militar, transformou-se em um “poço” de atividades poluentes, chegando a ser uma das cidades mais poluídas do mundo. Hoje, depois de um longo e caro processo de despoluição, a cidade já obteve uma redução superior a 90% dos índices de poluição.

Outro bom exemplo é a contaminação do bairro Recanto dos Pássaros, em Paulínia, SP, por organoclorados (Aldrin, Endrin and Dieldrin) produzidos pela Shell, nas décadas de 70 e 80.

A produção continuou mesmo após a proibição dos drins nos EUA. Em diversos países, a fabricação destes compostos foi proibida na década dos anos 70, sendo retirados do mercado dos EUA, o Dieldrin em 1974 e o Aldrin em 1987. No Brasil o Aldrin e o Endrin foram proibidos em 1985.

Até hoje a Shell se recusa a reconhecer que quaisquer pessoas tenham sido contaminadas, originando uma grande batalha judicial ainda não resolvida.

Com a lógica da transferência de custos socioambientais, também vieram para cá a indústria eletrointensiva, com destaque para o alumínio e, agora, a monocultura do celulose.

A situação é tão absurda que já estão em discussão, na Assembléia Legislativa do RS, projetos de lei para reduzir faixa de fronteira, servindo para legalizar compra ilícita da Stora Enso.

É interessante que os “defensores” da soberania nacional, que tanto atacam as terras indígenas nas áreas de fronteira, não se incomodem que transnacionais comprem irregularmente terras nas fronteiras e, por isto, estejam tão intere$$adas na redução da faixa de fronteira. Para estes “patriotas” os indígenas são uma ameaça à soberania nacional e as transnacionais não são. A realidade é sempre hábil em desmascarar a hipocrisia.

Não sei se os nossos formuladores de políticas públicas são estúpidos ou se as multinacionais são espertas, ou ambas as coisas, mas quando transferem industrias poluentes e/ou com grandes danos sociais e ambientais, para o Brasil e outros, estão jogando nas nossas costas pesados custos sociais.

É mais uma vez o que acontecerá com a celulose. Eles não perderão áreas agricultáveis para alimentos com o eucalipto porque isto ficará por nossa conta. Os maiores riscos e potenciais danos ambientais ocorrem na produção da pasta de celulose, que será produzida aqui. Idem aos custos de energia elétrica que estaremos oferecendo de forma farta e barata, com tarifas pesadamente subsidiadas.

Para eles é o ideal da globalização, no melhor dos mundos: eles privatizam o lucro e nós socializamos o prejuízo.

Os nossos governos sempre que podem afirmam a nossa “condição” de potência emergente, mas continuamos no papel de neocolônia, com um modelo de desenvolvimento equivocado, injusto e submisso aos grandes interesses econômicos internacionais, apoiados pelos grandes interesses econômicos nacionais (é a lógica essencial da globalização).

Mais uma vez insisto que é necessário questionar a quem serve este modelo e a quem beneficia

Nossa compreensão de desenvolvimento é completamente diferente do que aí está. Queremos um desenvolvimento que seja sustentável, economicamente inclusivo, socialmente justo e ambientalmente responsável. Se não for assim não é sustentável. Aliás, também não é desenvolvimento.

Um país que não reconhece os erros do passado está condenado a repeti-los infinitamente. É o que continuamos a fazer com a desculpa desenvolvimentista da importação de poluição e devastação.

Henrique Cortez, henriquecortez@ecodebate.com.br
coordenador do Ecodebate

2 Comments:

Anonymous Anônimo said...

desculpa a ignorância, nem sou formado no setor agrário.

mas um "rapper" (do ritmo e poesia, rap) disse em um dos seus textos q "monocultura é a maior sequela, herança colonial, não segue esta cartilha...".

achei um bom artigo, o texto legal, com temática q interessa, enfim, sabemos o que queremos, agora temos segurança para divulgarmos nossas idéias? a sociedade já está pronta para as inovações práticas que a aliança ensino/educação e indústria, podem trazer?

eu acho q sim, daí agora é unir tudo o que for possível e é chegada a hora de inovar, q para muitos é o mesmo que radicalizar.

então... mesmo q debater sojeiros, madereiros, algodoeiros, eucalipteiros.. não seja a mesma paz q debater com um ganjeiro.


minha sugestão desenvolver o estudos com a fibra do canhamo, para fins de manufaturamento de papel, tecidos, óleoa /p xampoo, sabonete, dá pra fazer tanta coisa e nasce em qualquer solo do mundo..

é uma tática pra minar monopolios.
rs;

enfim, resta um desabafo
fui!

13/10/2008, 14:44  
Blogger Ludmila Monteiro said...

Me senti particularmente necessitada de ler seu texto.
Sou estudante de jornalismo da Universidade Federal do Piauí e sei que há projetos pra vinda de uma indústria de celulose, a Susano, se instalar com 10 anos de isenção de impostos aqui no Piauí por volta de 2012- numa cidade recém-inaugurada próxima a capital, Teresina, extremamente perto de um rio que já sofre riscos de se extinguir por conta do assoreamento, sendo que a região próxima a Teresina é o estado mais crítico do rio. Até agora, nenhum dos meios de comunicação daqui perguntaram sequer sobre estudos de impacto ambiental na região: todos os "jornalistas" comemoraram, junto com o governo do Estado, os US$ 1,8 bilhão de investimento que a indústria promete. Deslumbrados com os dólares prometidos, só atestam sua teoria de que o pensamento neocolonialista de desenvolvimento nunca saiu dos que detém mais poder em países como o Brasil.

13/10/2008, 17:57  

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