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09 março 2006

SANTO DAIME

POLÊMICA E DESUNIÃO NO SEIO DE UMA RELIGIÃO EM SEU ESTÁGIO INICIAL

O "Seminário Ayahuasca", que está sendo realizado em Rio Branco (8 e 9 de março) pelo Conselho Nacional Antidrogas (Conad), não poderia resultar em outra coisa que não uma polêmica. E das grandes. Quem, entre os representantes das diversas correntes da doutrina, vai fazer parte do Grupo Multidisciplinar de Trabalho (GMT) que se encarregará de discutir diferentes aspectos relacionados ao uso da ayhauasca no Brasil?

Não devemos ficar surpresos com esta polêmica pois envolve religião, coisa que, por natureza, se constitui em um tema polêmico. Sempre tem alguem querendo se impor, subjulgar terceiros, ou mesmo destratar grupos que seguem determinados credos religiosos. Os muçulmanos, por exemplo, parece que declararam guerra ao resto do mundo. O resultado pode ser visto, lido e ouvido diariamente na imprensa.

Mas por que tanta polêmica associada ao Santo Daime? Dá para entender como uma doutrina que tem cerca de 10.000 seguidores no mundo todo chegou a tal ponto de discórdia?

Uma das possíveis causas é o fato dos seguidores da doutrina não conseguirem ver o movimento sob uma ótica universal. Muitos não se consideram parte de um mesmo grupo. É como se um grupo de cristãos seguissem os preceitos da doutrina cristã, mas por razões diversas, não se submetessem a uma única ordem. Isso não é incomum. Quantas igrejas batistas existem?

Como resolver esse problema? De várias formas. No início da consolidação de seu poder, a igreja católica de Roma teve que lutar guerras e massacrar "infiéis" até ser reconhecida como a referência para os cristãos do mundo.

Assim, os seguidores da doutrina do Santo Daime, que seguramente não vão precisar travar guerras e subjulgar infiéis, têm de se conscientizar que estão fazendo a história. Eles estão vivendo a infância de um movimento que tende a se tornar uma religião formal em um futuro não tão distante. Qual corrente vai prevalecer? A história dirá.

Aos historiadores, o tema é extremamente interessantes pois entre os numerosos grupos que se apresentaram para o seminário, ficou claro que alguns pretendem se isolar e, por essa razão, vão se tornar relíquias teológicas para os pesquisadores do futuro. Historiadores, façam a pesquisa hoje porque muitas das linhas da doutrinha que serão extintas no futuro estão vivas hoje, ou seja, o objeto da pesquisa está à mão. Existem impressos, pessoas, templos e outros objetos que podem ser documentados e preservados. Os judeus, em sua busca pela história de sua religião, fazem coisas incríveis do ponto de vista de pesquisa e resgate da história e tradição das diversas "linhas" que existiam em sua religião e que, por várias razões, desapareceram há muitos anos. Lembram do resgate dos judeus etíopes?

Pois bem. Do ponto de vista histórico, o seminário vai ser lembrado como o ponto a partir do qual a religião vai ser desmistificada e aceita formalmente no sistema social. A cisão entre o (aparentemente) ilegal e o legal. Esse é o marco.

Os conflitos ocorridos no seminário são, aparentemente, decorrentes da dificuldade de se escolher apenas seis representantes de um movimento dividido, que gostaria de mandar, talvez, 10-20 representantes. Isso fere brios e, como sabemos, a vaidade conta porque isso é parte da natureza humana. É difícil para alguns "engolir" este ou aquele como seu representante em um conselho, quando você sabe que este "representante" não representa o seu ideal.

Desta forma, fazer parte ou não do conselho, talvez não vá significar muita coisa porque todos querem que o uso da ayahuasca seja legalizado e liberado de tal forma o mêdo que hoje afugenta muitos dos potenciais seguidores fique, para sempre, na história.

Claro que para nós, acreanos, a perspectiva é muito diferente pois aqui o santo daime já atingiu este patamar. Medo, culpa, vergonha ou qualquer outro tipo de sentimento opressivo quanto ao uso da ayahuasca já ficou para trás há muitos anos.

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OPINIÃO DOS LEITORES:

scosmico said...
Evandro, Legal sua opinião sobre o encontro já que esse assunto está passando despercebido pela imprensa brasileira.É bem interessante você ver religiões brasileiras participando de um processo de regulamentação, que é importante.Acredito que se as religiões participantes centrarem no objetivo de garantir a liberdade religiosa delas, podem fazer um bom e belo trabalho.O resultado pode ser uma garantia para as próprias religiões de que seu sacramento não seja descaracterizado e permaneça sagrado e de âmbito religioso.