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Na Web No BLOG AMBIENTE ACREANO

19 março 2007

O MITO DA DISPERSÃO DOS KAXINAWÁ DO ACRE

Do artigo "O Inca pano: mito, história e modelos etnológicos" de Oscar Calavia Sáez (publicada na revista MANA 6(2):7-35, 2000):

...Um texto ditado a Capistrano de Abreu por Borô (Abreu 1941:5722-5804; cf. a glosa em Abreu 1938:341-345) guarda algumas especulações kaxinawá sobre o passado, expressas durante o auge mesmo do boom da borracha .

O texto narra a dispersão dos Huni Kuin a partir de um primeiro lar, à beira do “rio Zangado” (hönö cinatapa). Lá viveriam dois ancestrais: Harukum (o primeiro) e Apó, concebido depois. Cada um deles gera seu povo “encantando” (damiwani kiaki) uma fruta do mato, kuta (jaci) e xebó (uricuri), respectivamente.

Harukum tem mulher, muito bonita; Apó não tem e se apaixona pela de Harukum. Na briga conseqüente, Harukum recrimina a Apó por não ter se casado, tendo muitas mulheres de sua gente, e desejar logo a sua; ameaça, enfim, apoderar-se das mulheres do grupo de Apó. Na luta, Harukum morre, os grupos de ambos os chefes pelejam e se dispersam, subindo uma multiplicidade de rios: o Juruá, o Tarauacá, o Envira, o Muru, o Moronal, o Tawaya, o Ibuaçú, o Humaitá, o Colombo, o Purus e o Acre (Abreu 1938). O relato acaba com um lamento: "não tivesse sido essa morte, e ainda viveríamos em aldeias direitas (mae kaya) à beira do rio Zangado".

O interesse desse texto é múltiplo. De um lado, o esquema social que o relato nos apresenta combina elementos que apareceram em distintos pontos da nossa análise (a endogamia, a recusa da aliança, a fragmentação dos grupos), mas não corresponde a nenhuma das morfologias sociais discutidas nestas páginas. De outro lado, apresenta os Kaxinawá já saudosos de uma ordem primordial, que teria se quebrado em tempos anteriores à chegada dos seringueiros, em um processo interno. Borô contempla a sociedade kaxinawá como o fruto de uma queda, supostamente anterior e alheia aos Brancos.

Crédito da imagem: Desenho da capa do livro de Geografia Geografia Huni Kuî, publicado pela CPI na língua Kaxinawá

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