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26 março 2007

SCIELO: A BIBLIOTECA CIENTÍFICA BRASILEIRA ON LINE

Abaixo, reproduzimos entrevista com o Coordenador Científico da Biblioteca Virtual SciELO, publicada no site da Agência FAPESP. Aqueles que já fizeram buscas no Google provavelmente já acessaram a biblioteca. Ela disponibiliza artigos científicos completos publicados em dezenas de revistas. É a democratização do acesso à ciência.

Experimente uma busca no site da SciELO. Clique aqui para acessar o site e escreva no campo de pesquisa a palavra Acre. Vale a pena perder alguns minutos verificando a diversidade de artigos científicos que já foram publicados sobre o Acre.

SciELO substituirá o 'Comut' no Futuro

Na prática ela quase que colocou em extinção o Comut. Quem trabalha com pesquisa lembra deste auxílio à pesquisa. Nos tempos pré-internet, em lugares como o Acre (que nunca dispuseram de superbibliotecas), o acesso a artigos científicos era um exercício de paciência. Tinha que se fazer a solicitação à biblioteca local (UFAC ou EMBRAPA), que enviava o pedido para outra biblioteca do Brasil que tivesse em seu acervo a revista científica onde o artigo solicitado tinha sido publicado. Esta biblioteca fazia cópia do mesmo e encaminhava via correios ou malote.

Leia a entrevista abaixo:

Na briga pela ciência aberta

Fernando Cunha, Agência FAPESP, 26/03/2007

A biblioteca eletrônica SciELO (sigla em inglês para Scientific Eletronic Library Online) comemora dez anos em abril com a inauguração de um novo portal e um índice próximo de 7 milhões de acessos por mês.

Um número impressionante, de acordo com Rogério Meneghini (ao lado), coordenador científico da primeira base de artigos científicos produzidos no país e publicados em revistas científicas brasileiras.

Criada para aumentar a visibilidade nacional e internacional da ciência brasileira, a biblioteca inclui hoje periódicos de outros nove países latino-americanos, além de Portugal e Espanha.

Fruto de uma parceria da FAPESP com a Bireme (Centro Latino-Americano e do Caribe de Informação em Ciências da Saúde), instituição vinculada à Organização Pan-Americana de Saúde (Opas) e à Organização Mundial da Saúde, o projeto SciELO também conta com o apoio e a parceria do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) desde 2002.

Para a Agência FAPESP, Meneghini contou como foi criar a SciELO e defendeu a “ciência aberta”.


Agência FAPESP - Por que criar uma base de informação científica brasileira?
Rogério Meneghini - Quando consegui que a FAPESP oferecesse à comunidade científica acesso ao banco de dados do ISI [Institute for Scientific Information], a mais importante base de artigos científicos internacional, comecei a pesquisar os artigos que resultaram de projetos apoiados pela Fundação para entender como era o fluxo dessa informação científica no país. Eu estava interessado em criar uma base de dados bibliográficos e cienciométricos, pois acreditava que isso significaria dar um passo além do que era possível com a base ISI. Não havia muito conhecimento sobre o impacto da produção brasileira.

Agência FAPESP - Como a idéia se concretizou?
Meneghini - Falei sobre meu plano de criar a base com Abel Packer, diretor da Bireme, e Lewis Greene, pesquisador da Faculdade de Medicina da USP em Ribeirão Preto e editor chefe de uma das melhores revistas científicas do Brasil, o Brazilian Journal of Medical and Biological Research. Abel acreditava que a base que eu propunha também deveria trazer conteúdos integrais dos periódicos, ao mesmo tempo em que eles eram publicados on-line. Ele me convenceu que as duas coisas, a base de dados e os conteúdos integrais, se somavam. Depois de muitas discussões, preparamos um modelo e um projeto, que foi aprovado pela FAPESP. Começamos com uma escala piloto de oito revistas brasileiras bem visíveis, de várias áreas, e contávamos com uma participação ativa de seus editores.

Das 4 mil revistas científicas brasileiras, menos de 200 estão indexadas no SciELO

Agência FAPESP - Como a SciELO evoluiu nestes dez anos?
Meneghini - A biblioteca cresceu muito e o processo de publicação tornou-se cada vez mais trabalhoso e caro. Devem existir perto de quatro mil revistas científicas no país e a indexação na SciELO virou uma meta para todas elas. O assédio de editores é muito grande. Nosso padrão de avaliação de periódicos é muito restringente, mas também muito transparente. Até porque um dos nossos objetivos é melhorar o nível desses periódicos, o que já está acontecendo.

Agência FAPESP - A infra-estrutura também deverá crescer?
Meneghini - Em breve teremos 200 periódicos e já atingimos a marca de quase 7 milhões de acessos também devido ao sucesso de sites de busca na internet como o Google. Em breve faremos o lançamento de uma nova plataforma, com novo projeto gráfico, melhor navegabilidade, dados estatísticos que podem ser obtidos gratuitamente e com facilidade e a possibilidade de submissão on-line de artigos a todas as revistas indexadas na base.

Agência FAPESP - Por que a SciELO passou a publicar revistas de outros países?
Meneghini - Os contatos da Bireme, instituição que difunde informação sobre saúde para a América Latina e Caribe, estimularam muito a entrada de outros países. No começo, pensamos em publicar apenas os periódicos feitos no Brasil. Mas num certo momento Abel Packer e eu percebemos que poderíamos ampliar. Começamos a fazer palestras em outros países para apresentar o projeto. O primeiro a entrar foi o Chile, que hoje tem 61 revistas na base. Aí vieram outros. Decidimos então não tomar conta dos sites de cada país para não tirar o estímulo que eles tinham. Todos usam a mesma metodologia e a mesma plataforma, mas têm um site próprio. Fizemos também o www.scielo.org, que reúne todas as revistas de todos os países participantes.

Agência FAPESP - Quem financia a manutenção em cada país?
Meneghini - No Brasil, embora tenha alcance nacional e seja reconhecido como um bom projeto, 80% dos custos da SciELO ainda são pagos pela FAPESP. O CNPq entra com 15% e o restante vem principalmente da Opas. Mas precisamos colocar o projeto no contexto do financiamento nacional, pois um dos problemas que temos a curto prazo é a obtenção de recursos para manter e ampliar a base. Todos os países que fazem parte da SciELO buscam seus próprios recursos e têm problemas para consegui-los.

Meta é que todas as revistas do país publiquem em inglês

Agência FAPESP - A publicação em português é um entrave para a divulgação da ciência brasileira no mundo?
Meneghini - A língua é um problema. Escrevi, com Abel Packer, um artigo sobre esse assunto para a edição de fevereiro da revista EMBO Report [da European Molecular Biology Organization], do grupo Nature. Neste artigo, discutimos bastante a questão do inglês na ciência e da ciência na língua de cada país. Precisamos lidar com uma verdade: o inglês é a língua científica no mundo atual. Por esse motivo temos estimulado a publicação de artigos científicos em inglês.

Agência FAPESP - O acesso à produção de ciência na América Latina depende disso?
Meneghini - Eu sonho muito alto, acredito que é possível existir uma cultura bilíngüe em termos de ciência no Brasil. Eu também discuto essa possibilidade no artigo que citei. Mas a maior parte dos pesquisadores em atividade no Brasil ainda procura publicar em inglês. Colocar para eles a incumbência de fazer o mesmo artigo em português, o que seria bom para todos os brasileiros, é fazer uma exigência draconiana. Eu continuo pensando em estimular isso, mas, por enquanto, é só um projeto.

Agência FAPESP - Quais são os planos para o futuro da SciELO?
Meneghini - Continuar na briga pela ciência aberta, de disponibilização gratuita de artigos científicos. Há uma origem ética nisso, bem recente, do início deste século. A SciELO nasceu como ciência aberta, ninguém paga nada para acessar os artigos que ela publica. E não poderia ser de outra forma porque são instituições públicas que dão suporte ao projeto. No nível internacional, as revistas são muito mais comerciais, seus publishers cobram, e cobram bem. Há uma grande discussão sobre o sentido de se fazer isso. Pela origem da SciELO e por ela ser atualmente a segunda maior base do mundo de acesso aberto continuamos a discutir possibilidades para a ciência aberta. Essa é uma questão que considero muito importante.