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21 setembro 2007

POVOS DA FLORESTA

Desde Chico Mendes, alguns avanços e muito a conquistar

Por Maurício Thuswohl, da Carta Maior

Centenas de indígenas, seringueiros, extrativistas e demais representantes de comunidades tradicionais estão reunidos esta semana em Brasília para relançar a Aliança dos Povos da Floresta, entidade idealizada há duas décadas por Chico Mendes.

BRASÍLIA – Dezenove anos após o assassinato de Chico Mendes, o maior projeto político idealizado pelo ícone ambientalista volta a ganhar força. Reunidos desde terça-feira (18) em Brasília, centenas de indígenas, seringueiros, extrativistas e demais representantes de comunidades tradicionais participam do 2° Encontro Nacional dos Povos da Floresta. O encontro celebra a retomada da Aliança dos Povos da Floresta, entidade criada por Chico e composta por três importantes organizações do movimento socioambiental da Amazônia: o Conselho Nacional dos Seringueiros (CNS), a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) e a rede Grupo de Trabalho Amazônico (GTA).

O primeiro encontro foi realizado em 1989, também em Brasília, alguns meses após a morte de Chico Mendes, que participou ativamente da organização do evento, mas não viveu o suficiente para ver os debates acontecerem. Desde então, a Aliança dos Povos da Floresta permaneceu adormecida, apesar das três organizações fundadoras continuarem existindo, crescendo e se inter-relacionando.

Nessas quase duas décadas, houve avanços, como frisou Jecinaldo Sateré-Mawé, presidente da Coiab: “Há 20 anos, os indígenas e demais povos tradicionais eram vistos no Brasil apenas como parte do folclore nacional. Desde então, graças às diversas lutas travadas pelas nossas organizações sociais, nós deixamos de ser folclore e passamos a ser atores sociais organizados”. Esse fortalecimento, diz Jecinaldo, permitiu que os povos da floresta influenciassem na adoção de políticas púbicas como a demarcação de Terras Indígenas e a criação das Reservas Extrativistas (Resex), entre outras, além de garantir a inclusão, na Constituição Federal, de parágrafos que garantem os direitos dos indígenas e afirmam a diversidade cultural do Brasil.

Contemporâneo de Chico Mendes nas lutas em Xapuri, no Acre, o vice-presidente do CNS, Júlio Barbosa, saudou “cada um dos companheiros que ajudou a criar a Aliança nos anos oitenta” e citou alguns nomes que já fazem parte da história do movimento, como Aílton Krenak, Dona Raimunda, Pedro Ramos e Raimundão, velho companheiro de Chico nos embates realizados para impedir as máquinas de colocar abaixo as árvores da floresta. Dona Raimunda e Krenak estavam na platéia e foram ovacionados pelos presentes.

Após afirmar que este segundo encontro é também “um momento de celebrar as conquistas que obtivemos nesses 20 anos”, Barbosa citou como exemplo do avanço nas lutas das populações tradicionais as figuras do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva: “A prova de nosso avanço é que uma de nossas companheiras nos embates, que tinha aquele como único instrumento de luta, é hoje ministra do Meio Ambiente. Outro companheiro, que na época nos ajudava apenas com seu apoio político, hoje é presidente da República”, disse.

“Ainda somos vulneráveis”

Não foram somente as lembranças das conquistas obtidas nos últimos anos, no entanto, que pautaram as intervenções de saudação ao 2° Encontro dos Povos da Floresta. As dificuldades ainda existentes e o longo caminho que ainda resta a ser trilhado na busca pela cidadania plena para as populações tradicionais também foram citados pelos oradores: “É preciso envolver os povos da floresta de uma maneira mais efetiva nas discussões sobre temas como o desmatamento das florestas, a preservação da biodiversidade e o combate ao aquecimento global”, disse Adílson Vieira, secretário-geral do GTA, que também defende a criação de mecanismos de incentivo econômico aos povos da floresta para que estes evitem o desmatamento e suas conseqüências.

“Para que os povos da floresta conquistem a cidadania plena, ainda falta o governo concluir os processos fundiários em nossas terras”, afirmou Jecinaldo Sateré-Mawé. Durante a cerimônia de abertura do encontro, diante de Lula e Marina, Jecinaldo fez outras cobranças ao governo federal: “É preciso paralisar as grandes obras de infra-estrutura que ameaçam nossas comunidades e fragilizam o desenvolvimento sustentável da Amazônia”, disse o presidente da Coiab.

Jecinaldo aposta que a retomada das ações conjuntas sob a égide da Aliança dos Povos da Floresta vai dar nova dinâmica ao movimento: “Os povos da floresta no Brasil estão unidos, mas nós ainda estamos entre os mais vulneráveis atores sociais de nosso país. Somente com a participação dos povos da floresta, o Brasil conseguirá se tornar um país culturalmente diverso, socialmente justo e ambientalmente equilibrado”, disse.

Poesia e Milton Nascimento

Além de Lula e Marina, estiveram presentes na cerimônia de abertura do 2º Encontro dos Povos da Floresta os ministros Gilberto Gil (Cultura), Guilherme Cassel (Desenvolvimento Agrário) e Luiz Dulci (Secretaria-Geral da Presidência), além do governador do Amazonas, Eduardo Braga. Também participarão do evento, que termina no domingo (23), os governadores do Pará, Ana Júlia Carepa, do Acre, Binho Marques, e do Amapá, Valdez Góes.

A cerimônia foi realizada no Teatro Nacional, e contou com um público de mais de mil pessoas, que assistiu entusiasmado a uma apresentação de música da floresta com a cantora indígena Cláudia Ticuna e a declamação, feita pelo próprio, de um poema de Pedro Tierra em homenagem a Chico Mendes. A noite terminou com um show do cantor Milton Nascimento, acompanhado por sua banda e pela Orquestra Sinfônica de Brasília.

Crédito de imagem: Arquivo Agência Carta Maior

(Envolverde/Agência Carta Maior)