CONSUMIDORES E OS PROBLEMAS JUDICIAIS COM PLANOS DE SAÚDE PRIVADOS
Pesquisa revela que os principais temas das ações julgadas foram cobertura, permanência no plano coletivo e rescisão unilateral de contrato
Texto destaca papel do Judiciário nos problemas gerados pelos planos de saúde
Fernanda Marques
Agência Fiocruz de Notícias
No imaginário social, o setor privado de saúde é considerado de maior qualidade – uma ideia que é reforçada pelas estratégias de marketing ao enfatizarem a comodidade do acesso aos serviços particulares e seus modernos recursos terapêuticos e de diagnóstico. Na prática, porém, esses serviços também deixam a desejar, conforme demonstra a grande quantidade de ações na Justiça pleiteando a reparação de danos causados pela falta de atendimento ou pela má qualidade na assistência privada à saúde. Ainda são poucos os estudos sobre ações judiciais e planos de saúde, mas um artigo recém-publicado no periódico Cadernos de Saúde Pública amplia a discussão sobre os problemas enfrentados pelos consumidores de planos de saúde e o papel do Judiciário a respeito da questão.
“As reclamações dos consumidores devido às exclusões de coberturas, aumentos abusivos, longos períodos de carência, rescisões unilaterais de contrato e limitações de internações tornaram-se frequentes no setor suplementar, com reflexos sobre o Judiciário”, destaca o artigo, assinado pelos pesquisadores Ligia Bahia e André Feijó Barroso, do Laboratório de Economia Política da Saúde da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e Danielle Conte Alves, da Escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz. Segundo os autores, a regulação do setor privado de saúde teve início com a promulgação da Lei nº 9.656, de 1998, e aprofundou-se com a Lei nº 9.661, de 2000, que criou a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).
“Um dos desafios que a ANS enfrenta é a resistência das operadoras de planos de saúde perante a legislação, além do fato de ainda existirem planos não regidos pela lei que regulamenta o setor. Essa reação tem ocasionado várias divergências entre operadoras e a ANS, gerando, consequentemente, conflitos judiciais. Dessa forma, um dos meios disponíveis para que o consumidor de planos de saúde obtenha um direito perante a Justiça é o pedido de tutela antecipada”, explicam os pesquisadores. Ao conceder a tutela antecipada, o juiz propicia ao usuário do plano de saúde usufruir, de imediato, os resultados pretendidos. Em linhas gerais, para a concessão dessa tutela, o usuário precisa demonstrar que seu pedido encontra abrigo na legislação em vigor e que a demora no julgamento do caso pode provocar dano irreparável ou de difícil reparação, como agravar seu estado de saúde ou mesmo colocar sua vida em risco.
No artigo, os pesquisadores da UFRJ e da Fiocruz apresentam uma análise dos recursos de decisões judiciais, sobre pedidos de tutela antecipada, relacionados aos planos e seguros privados de saúde, julgados nos tribunais de Justiça dos estados do Rio de Janeiro e de São Paulo ao longo de dois períodos: de janeiro de 2003 a setembro de 2004 e de setembro de 2004 a agosto de 2005. A escolha do Rio de Janeiro e de São Paulo para o estudo se justifica pelo fato de que os estados apresentam os maiores percentuais de população coberta por planos de saúde.
Ao todo, a análise incluiu 1.020 ações julgadas em relação a pedidos de tutela antecipada. Do total, apenas duas ações eram coletivas. De acordo com os autores, este tão baixo número pode estar associado ao desconhecimento dos usuários acerca da possibilidade de se propor uma ação coletiva, bem como ao escasso número de organizações que atuam judicialmente no Brasil. Outra explicação seria a tendência de uma ação individual obter resultado mais rapidamente do que uma coletiva.
“No entanto, uma única ação coletiva pode beneficiar muitos consumidores de uma só vez, além de trazer impactos políticos significativos”, ressaltam os pesquisadores no artigo. “Nesse sentido, o desenvolvimento, a estruturação e o fortalecimento das associações de consumidores e da sociedade civil são fundamentais, a fim de permitir o ajuizamento de ações de cunho coletivo para contestar a legalidade de práticas e/ou cláusulas contratuais abusivas, bem como ocupar espaços legítimos para a discussão do tema, além da Justiça”.
Outros resultados da pesquisa revelam que, no primeiro período de tempo analisado, os principais temas das ações julgadas foram cobertura, permanência no plano coletivo e rescisão unilateral de contrato, enquanto, no segundo período, os temas mais recorrentes foram cobertura e reajuste. Quanto ao posicionamento da Justiça em relação aos pedidos de tutela antecipada, nos dois períodos de tempo estudados, considerando-se tanto a primeira quanto a segunda instâncias, as decisões foram favoráveis aos consumidores dos planos ou seguros de saúde em mais de 70% dos casos.
A pesquisa também observou que o Código de Processo Civil foi a fundamentação mais frequentemente usada pelos desembargadores para justificarem a concessão ou não da tutela antecipada. “Alguns argumentos utilizados pelos julgadores para conceder ou manter os pedidos de tutela antecipada são baseados no direito à vida e à saúde e também no reconhecimento da abusividade das cláusulas contratuais que limitam ou excluem tratamento essencial à saúde do usuário”, lembram também os autores. Assim, na conclusão do artigo, eles destacam o grau de responsabilidade do Judiciário no âmbito das problemáticas envolvendo planos privados de saúde. “Verifica-se que o Judiciário continua sendo um importante espaço de reivindicação dos consumidores de planos de saúde”.
Texto destaca papel do Judiciário nos problemas gerados pelos planos de saúde
Fernanda Marques
Agência Fiocruz de Notícias
No imaginário social, o setor privado de saúde é considerado de maior qualidade – uma ideia que é reforçada pelas estratégias de marketing ao enfatizarem a comodidade do acesso aos serviços particulares e seus modernos recursos terapêuticos e de diagnóstico. Na prática, porém, esses serviços também deixam a desejar, conforme demonstra a grande quantidade de ações na Justiça pleiteando a reparação de danos causados pela falta de atendimento ou pela má qualidade na assistência privada à saúde. Ainda são poucos os estudos sobre ações judiciais e planos de saúde, mas um artigo recém-publicado no periódico Cadernos de Saúde Pública amplia a discussão sobre os problemas enfrentados pelos consumidores de planos de saúde e o papel do Judiciário a respeito da questão.
“As reclamações dos consumidores devido às exclusões de coberturas, aumentos abusivos, longos períodos de carência, rescisões unilaterais de contrato e limitações de internações tornaram-se frequentes no setor suplementar, com reflexos sobre o Judiciário”, destaca o artigo, assinado pelos pesquisadores Ligia Bahia e André Feijó Barroso, do Laboratório de Economia Política da Saúde da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e Danielle Conte Alves, da Escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz. Segundo os autores, a regulação do setor privado de saúde teve início com a promulgação da Lei nº 9.656, de 1998, e aprofundou-se com a Lei nº 9.661, de 2000, que criou a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).
“Um dos desafios que a ANS enfrenta é a resistência das operadoras de planos de saúde perante a legislação, além do fato de ainda existirem planos não regidos pela lei que regulamenta o setor. Essa reação tem ocasionado várias divergências entre operadoras e a ANS, gerando, consequentemente, conflitos judiciais. Dessa forma, um dos meios disponíveis para que o consumidor de planos de saúde obtenha um direito perante a Justiça é o pedido de tutela antecipada”, explicam os pesquisadores. Ao conceder a tutela antecipada, o juiz propicia ao usuário do plano de saúde usufruir, de imediato, os resultados pretendidos. Em linhas gerais, para a concessão dessa tutela, o usuário precisa demonstrar que seu pedido encontra abrigo na legislação em vigor e que a demora no julgamento do caso pode provocar dano irreparável ou de difícil reparação, como agravar seu estado de saúde ou mesmo colocar sua vida em risco.
No artigo, os pesquisadores da UFRJ e da Fiocruz apresentam uma análise dos recursos de decisões judiciais, sobre pedidos de tutela antecipada, relacionados aos planos e seguros privados de saúde, julgados nos tribunais de Justiça dos estados do Rio de Janeiro e de São Paulo ao longo de dois períodos: de janeiro de 2003 a setembro de 2004 e de setembro de 2004 a agosto de 2005. A escolha do Rio de Janeiro e de São Paulo para o estudo se justifica pelo fato de que os estados apresentam os maiores percentuais de população coberta por planos de saúde.
Ao todo, a análise incluiu 1.020 ações julgadas em relação a pedidos de tutela antecipada. Do total, apenas duas ações eram coletivas. De acordo com os autores, este tão baixo número pode estar associado ao desconhecimento dos usuários acerca da possibilidade de se propor uma ação coletiva, bem como ao escasso número de organizações que atuam judicialmente no Brasil. Outra explicação seria a tendência de uma ação individual obter resultado mais rapidamente do que uma coletiva.
“No entanto, uma única ação coletiva pode beneficiar muitos consumidores de uma só vez, além de trazer impactos políticos significativos”, ressaltam os pesquisadores no artigo. “Nesse sentido, o desenvolvimento, a estruturação e o fortalecimento das associações de consumidores e da sociedade civil são fundamentais, a fim de permitir o ajuizamento de ações de cunho coletivo para contestar a legalidade de práticas e/ou cláusulas contratuais abusivas, bem como ocupar espaços legítimos para a discussão do tema, além da Justiça”.
Outros resultados da pesquisa revelam que, no primeiro período de tempo analisado, os principais temas das ações julgadas foram cobertura, permanência no plano coletivo e rescisão unilateral de contrato, enquanto, no segundo período, os temas mais recorrentes foram cobertura e reajuste. Quanto ao posicionamento da Justiça em relação aos pedidos de tutela antecipada, nos dois períodos de tempo estudados, considerando-se tanto a primeira quanto a segunda instâncias, as decisões foram favoráveis aos consumidores dos planos ou seguros de saúde em mais de 70% dos casos.
A pesquisa também observou que o Código de Processo Civil foi a fundamentação mais frequentemente usada pelos desembargadores para justificarem a concessão ou não da tutela antecipada. “Alguns argumentos utilizados pelos julgadores para conceder ou manter os pedidos de tutela antecipada são baseados no direito à vida e à saúde e também no reconhecimento da abusividade das cláusulas contratuais que limitam ou excluem tratamento essencial à saúde do usuário”, lembram também os autores. Assim, na conclusão do artigo, eles destacam o grau de responsabilidade do Judiciário no âmbito das problemáticas envolvendo planos privados de saúde. “Verifica-se que o Judiciário continua sendo um importante espaço de reivindicação dos consumidores de planos de saúde”.
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