HABEAS CORPUS DE ASSUERO VERONEZ E ADÁLIO CORDEIRO FOI IRREGULAR, AFIRMA PROCURADOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO ACREANO
Procurador Sammy Barbosa assegura que houve uma
“engenharia jurídica” para beneficiar Assuero Veronez e Adálio Cordeiro,
acusados pela Operação Delivery de usar uma rede de exploração sexual de
adolescentes em Rio Branco.
Itaan Arruda
Jornal A Gazeta 11/11/2012
Em 20 páginas, o parecer do procurador de Justiça
do Ministério Público do Estado do Acre Sammy Barbosa demonstra como a
distribuição de habeas corpus no Tribunal de Justiça do Acre beneficiou Assuero
Doca Veronez e Adálio Cordeiro, por intermédio da atuação do desembargador
Francisco Djalma da Silva.
Para compreender a quebra do rito processual, é preciso voltar ao último 2 de novembro. Nas primeiras horas da manhã do Dia de Finados, duas diligências de homens da Polícia Civil e Polícia Federal tinham a missão de cumprir três mandados de prisão ordenados pelo juiz da Segunda Vara da Infância e da Juventude, Romário Divino.
Naquela manhã, foram presos o presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Acre, Assuero Doca Veronez, e o pecuarista Adálio Cordeiro. Imediatamente, entram em cena os advogados dos pecuaristas, Emilson Péricles Brasil e Gabriel de Almeida Gomes. Ao meio dia, eles impetram o habeas corpus sob número 0002090-60.2012.8.01.0000. O documento pede pela soltura dos dois pecuaristas acusados de alimentar a rede de exploração sexual de adolescentes.
Os advogados se fundamentam nos argumentos de praxe: os acusados têm residência fixa, trabalham na cidade, são “homens probos e honestos” e possuem boa conduta. Naturalmente, os advogados de defesa rechaçaram a conduta do juiz Romário Divino e levantam a tese de que houve escolha “seletiva” dos acusados por serem pessoas muito conhecidas na cidade. Outra estratégia dos advogados é condicionar os argumentos para soltura dos dois acusados a um habeas corpus que garantiu liberdade a Thiago Celso Andrade Reges, um dos aliciadores da rede de exploração sexual de adolescentes.
Como era feriado, o Tribunal de Justiça do Acre estava funcionando em regime de plantão. E a plantonista do dia era a desembargadora Denise Castelo Bonfim. Ela nega o pedido de liminar. Alega que não há necessidade da sua decisão estar atrelada à decisão que garantiu a liberdade ao aliciador Thiago Reges.
A desembargadora Denise Bonfim não viu similaridade entre as duas situações. Além disso, a magistrada argumenta que os advogados não reuniram documentação comprobatória que apontasse outra decisão senão a de negar o pedido de liminar.
Bonfim solicita informações detalhadas da Vara da Infância e da Juventude e enviou os autos ao Ministério Público.
A construção da “engenharia jurídica”
A partir daí, inicia-se uma rápida e eficiente orquestração para soltar os dois pecuaristas. Os advogados voltam ao Tribunal de Justiça às 6h03min da noite. Eles pedem que haja “reconsideração” da negativa da desembargadora Denise Bonfim. Nesse horário, já havia acabado o plantão da desembargadora. Quem certifica o recebimento do pedido é o diretor judiciário do Tribunal de Justiça do Acre, Emerson Vieira Cavalcante.
Reconhecido entre os seus pares pela seriedade na condução dos processos e metódico no respeito aos ritos, Cavalcante certifica que recebe o documento, mas, orientado pela assessoria da desembargadora, não dá seguimento ao pedido em respeito à Resolução 131 do Tribunal Pleno Administrativo. Essa resolução regulamenta o plantão judiciário de acordo com o que prevê o Conselho Nacional de Justiça. “O Plantão Judiciário não se destina à reiteração de pedido já apreciado no órgão de origem ou em plantão anterior, nem a sua reconsideração ou reexame”, diz um trecho da resolução, destacada no parecer do procurador de Justiça do Ministério Público do Acre, Sammy Barbosa.
Para compreender a quebra do rito processual, é preciso voltar ao último 2 de novembro. Nas primeiras horas da manhã do Dia de Finados, duas diligências de homens da Polícia Civil e Polícia Federal tinham a missão de cumprir três mandados de prisão ordenados pelo juiz da Segunda Vara da Infância e da Juventude, Romário Divino.
Naquela manhã, foram presos o presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Acre, Assuero Doca Veronez, e o pecuarista Adálio Cordeiro. Imediatamente, entram em cena os advogados dos pecuaristas, Emilson Péricles Brasil e Gabriel de Almeida Gomes. Ao meio dia, eles impetram o habeas corpus sob número 0002090-60.2012.8.01.0000. O documento pede pela soltura dos dois pecuaristas acusados de alimentar a rede de exploração sexual de adolescentes.
Os advogados se fundamentam nos argumentos de praxe: os acusados têm residência fixa, trabalham na cidade, são “homens probos e honestos” e possuem boa conduta. Naturalmente, os advogados de defesa rechaçaram a conduta do juiz Romário Divino e levantam a tese de que houve escolha “seletiva” dos acusados por serem pessoas muito conhecidas na cidade. Outra estratégia dos advogados é condicionar os argumentos para soltura dos dois acusados a um habeas corpus que garantiu liberdade a Thiago Celso Andrade Reges, um dos aliciadores da rede de exploração sexual de adolescentes.
Como era feriado, o Tribunal de Justiça do Acre estava funcionando em regime de plantão. E a plantonista do dia era a desembargadora Denise Castelo Bonfim. Ela nega o pedido de liminar. Alega que não há necessidade da sua decisão estar atrelada à decisão que garantiu a liberdade ao aliciador Thiago Reges.
A desembargadora Denise Bonfim não viu similaridade entre as duas situações. Além disso, a magistrada argumenta que os advogados não reuniram documentação comprobatória que apontasse outra decisão senão a de negar o pedido de liminar.
Bonfim solicita informações detalhadas da Vara da Infância e da Juventude e enviou os autos ao Ministério Público.
A construção da “engenharia jurídica”
A partir daí, inicia-se uma rápida e eficiente orquestração para soltar os dois pecuaristas. Os advogados voltam ao Tribunal de Justiça às 6h03min da noite. Eles pedem que haja “reconsideração” da negativa da desembargadora Denise Bonfim. Nesse horário, já havia acabado o plantão da desembargadora. Quem certifica o recebimento do pedido é o diretor judiciário do Tribunal de Justiça do Acre, Emerson Vieira Cavalcante.
Reconhecido entre os seus pares pela seriedade na condução dos processos e metódico no respeito aos ritos, Cavalcante certifica que recebe o documento, mas, orientado pela assessoria da desembargadora, não dá seguimento ao pedido em respeito à Resolução 131 do Tribunal Pleno Administrativo. Essa resolução regulamenta o plantão judiciário de acordo com o que prevê o Conselho Nacional de Justiça. “O Plantão Judiciário não se destina à reiteração de pedido já apreciado no órgão de origem ou em plantão anterior, nem a sua reconsideração ou reexame”, diz um trecho da resolução, destacada no parecer do procurador de Justiça do Ministério Público do Acre, Sammy Barbosa.
O procurador salienta no documento que “apesar de
não se poder afirmar que seja a forma mais técnica ou judicialmente plausível o
diretor judiciário do TJ/AC indeferir de plano uma petição sem enviá-la ao
desembargador relator do HC, até esse momento, o feito seguia o seu trâmite
regular”. Sammy Barbosa argumenta que ao final do plantão judiciário, “no
primeiro dia útil, o feito [HC] deveria ter sido ‘distribuído’ para um dos
membros da Egrégia Câmara Criminal”, conforme outra resolução do CNJ, a de
número 71.
Pertencem à CâmaraCriminal os desembargadores Pedro Ranzi (presidente), Denise Bonfim e Francisco Djalma da Silva.
Segundo habeas corpus teve destinatário: desembargador Francisco Djalma
O primeiro dia útil após Finados era a segunda-feira, dia 5 de novembro. Neste momento, ocorre algo inusitado nos fundamentos dos ritos processuais. No frontispício do habeas corpus, havia inscrição em dois pequenos retângulos vermelhos no canto da página.
A expressão “distribuição por prevenção” destinava o documento especificamente ao desembargador Francisco Djalma da Silva. Esse segundo ha-beas corpus, com conteúdo idêntico ao primeiro (que já havia sido indeferido pela desembargadora Denise Bonfim), agora tinha o número 0002094-97.2012.8.01.0000.
Esse “endereçamento” feito pelos advogados de defesa ao desembargador Francisco Djalma é irregular. O que o procurador de Justiça do Ministério Público do Estado do Acre argumenta é que, se tivesse havido a distribuição rotineira no primeiro dia útil, o ha-beas corpus deveria ter ido para a desembargadora Denise Bonfim que era a “preventa”: foi ela quem apreciou o benefício antes.
Pertencem à CâmaraCriminal os desembargadores Pedro Ranzi (presidente), Denise Bonfim e Francisco Djalma da Silva.
Segundo habeas corpus teve destinatário: desembargador Francisco Djalma
O primeiro dia útil após Finados era a segunda-feira, dia 5 de novembro. Neste momento, ocorre algo inusitado nos fundamentos dos ritos processuais. No frontispício do habeas corpus, havia inscrição em dois pequenos retângulos vermelhos no canto da página.
A expressão “distribuição por prevenção” destinava o documento especificamente ao desembargador Francisco Djalma da Silva. Esse segundo ha-beas corpus, com conteúdo idêntico ao primeiro (que já havia sido indeferido pela desembargadora Denise Bonfim), agora tinha o número 0002094-97.2012.8.01.0000.
Esse “endereçamento” feito pelos advogados de defesa ao desembargador Francisco Djalma é irregular. O que o procurador de Justiça do Ministério Público do Estado do Acre argumenta é que, se tivesse havido a distribuição rotineira no primeiro dia útil, o ha-beas corpus deveria ter ido para a desembargadora Denise Bonfim que era a “preventa”: foi ela quem apreciou o benefício antes.
No despacho em que argumenta a soltura dos
pecuaristas, Francisco Djalma faz alusão a uma suposta “informação” de que “um
outro habeas corpus” havia sido pedido durante o plantão. “Considerando que
este juízo tornou-se prevento em razão da distribuição e julgamento do habeas
corpus número 0002001-37.2012, 00019999-67.2012 e 0002029-05.2012, determina-se
que seja este habeas corpus apensado ao que fora distribuído em sede de juízo
plantonista, fazendo-me conclusão para deliberar sobre o pedido liminar”.
Por ser membro da Câmara Criminal e se
auto-entitulando competente para julgar um habeas corpus que já lhe fora
endereçado pelos advogados de defesa, a soltura dos pecuaristas era questão de
tempo.
Sammy Barbosa lamenta no parecer: “Não apenas a liminar é deferida a Assuero Veronez, único paciente do habeas corpus 0002094-97.2012.8.01.0000, mas ainda estendeu a Adálio Cordeiro que somente figurava como paciente no primeiro HC” (negado pela desembargadora Denise). O procurador de Justiça do MP afirma que “desconhece qualquer norma jurídica que permita ao magistrado sair procurando ações que tenha vontade de julgar”, usando “informações aleatórias que diz possuir sem as especificar”.
E o procurador de Justiça complementa. “Fica parecendo que o magistrado estaria a escolher as ações de sua preferência ou de seu interesse”. O procurador afirma que a atuação de Djalma é uma “engenharia jurídica sem precedentes no Tribunal de Justiça do Acre”. Essa “engenharia” do desembargador Francisco Djalma está detalhada no parecer de Sammy Barbosa que foi endereçado ao Conselho Na-cional de Justiça, ao Ministério da Justiça, à Secretaria Nacional de Direitos Humanos, à Corregedoria-Geral do Conselho Nacional do Ministério Público e também aos presidentes das Comissões Parlamentares de Inquérito da Câmara dos Deputados e do Senado que investigam tráfico de seres humanos e à presidência da Frente Parlamentar de Defesa da Criança e do Adolescente da Câmara de Deputados.
Simulacro de distribuição - O que o parecer da Procuradoria do Ministério Público argumenta é que o órgão de distribuição não agiu de forma republicana. “A sequência de acontecimentos desses feitos lança sérias dúvidas quanto à credibilidade da própria distribuição no Tribunal de Justiça do Estado do Acre a demonstrar, pelo menos aparentemente, um simulacro de distribuição”.
O CNJ já julgou casos semelhantes em Processo Administrativo Disciplinar. A punição ao desembargador delituoso foi a aposentadoria compulsória. A Procuradoria do Ministério Público pede que seja cancelada a decisão do desembargador Djalma e que seja encaminhada novamente ao desembargador presidente da Câmara Criminal e novamente seja feita a distribuição. Sammy Barbosa também pede que o desembargador Djalma seja responsabilizado criminalmente.
Perguntas que devem ser respondidas:
1) Por que o desembargador Francisco Djalma avocou para si a condição de julgar os habeas corpus sendo que ele não era o prevento?
2) Se a direção judiciária é reconhecidamente exigente na condução dos trabalhos, quem permitiu a quebra normal do andamento da sequência dos processos?
3) Por que o segundo habeas corpus foi endereçado especificamente ao desembargador Francisco Djalma?
4) Que segurança ele (desembargador Djalma) representava aos advogados de defesa dos pecuaristas? Por que os habeas corpus de Assuero e Adálio ficaram atrelados?
Djalma não quis fazer declarações
Diante do exposto no parecer, a equipe de A Gazeta tentou ouvir o desembargador Francisco Djalma da Silva. Na tarde de sexta-feira, foi até a sede do Tribunal de Justiça do Acre. A assessoria de Comunicação do Tribunal de Justiça, de forma rotineiramente republicana atendeu à solicitação da reportagem: conversou com a assessoria do desembargador sobre a intenção de entrevistá-lo. Ao ser informado sobre a presença da equipe de reportagem e da intenção de conversar sobre o assunto da concessão de habeas corpus, o desembargador Djalma alegou que “para não fazer juízo de valor sobre um processo ainda não concluído e em respeito à Lei Orgânica da Magistratura Nacional não iria falar sobre o assunto”.
O espaço para a exposição do contraditório foi oferecido e, como exige a postura democrática, está aberto quando o desembargador assim o desejar.
Sammy Barbosa lamenta no parecer: “Não apenas a liminar é deferida a Assuero Veronez, único paciente do habeas corpus 0002094-97.2012.8.01.0000, mas ainda estendeu a Adálio Cordeiro que somente figurava como paciente no primeiro HC” (negado pela desembargadora Denise). O procurador de Justiça do MP afirma que “desconhece qualquer norma jurídica que permita ao magistrado sair procurando ações que tenha vontade de julgar”, usando “informações aleatórias que diz possuir sem as especificar”.
E o procurador de Justiça complementa. “Fica parecendo que o magistrado estaria a escolher as ações de sua preferência ou de seu interesse”. O procurador afirma que a atuação de Djalma é uma “engenharia jurídica sem precedentes no Tribunal de Justiça do Acre”. Essa “engenharia” do desembargador Francisco Djalma está detalhada no parecer de Sammy Barbosa que foi endereçado ao Conselho Na-cional de Justiça, ao Ministério da Justiça, à Secretaria Nacional de Direitos Humanos, à Corregedoria-Geral do Conselho Nacional do Ministério Público e também aos presidentes das Comissões Parlamentares de Inquérito da Câmara dos Deputados e do Senado que investigam tráfico de seres humanos e à presidência da Frente Parlamentar de Defesa da Criança e do Adolescente da Câmara de Deputados.
Simulacro de distribuição - O que o parecer da Procuradoria do Ministério Público argumenta é que o órgão de distribuição não agiu de forma republicana. “A sequência de acontecimentos desses feitos lança sérias dúvidas quanto à credibilidade da própria distribuição no Tribunal de Justiça do Estado do Acre a demonstrar, pelo menos aparentemente, um simulacro de distribuição”.
O CNJ já julgou casos semelhantes em Processo Administrativo Disciplinar. A punição ao desembargador delituoso foi a aposentadoria compulsória. A Procuradoria do Ministério Público pede que seja cancelada a decisão do desembargador Djalma e que seja encaminhada novamente ao desembargador presidente da Câmara Criminal e novamente seja feita a distribuição. Sammy Barbosa também pede que o desembargador Djalma seja responsabilizado criminalmente.
Perguntas que devem ser respondidas:
1) Por que o desembargador Francisco Djalma avocou para si a condição de julgar os habeas corpus sendo que ele não era o prevento?
2) Se a direção judiciária é reconhecidamente exigente na condução dos trabalhos, quem permitiu a quebra normal do andamento da sequência dos processos?
3) Por que o segundo habeas corpus foi endereçado especificamente ao desembargador Francisco Djalma?
4) Que segurança ele (desembargador Djalma) representava aos advogados de defesa dos pecuaristas? Por que os habeas corpus de Assuero e Adálio ficaram atrelados?
Djalma não quis fazer declarações
Diante do exposto no parecer, a equipe de A Gazeta tentou ouvir o desembargador Francisco Djalma da Silva. Na tarde de sexta-feira, foi até a sede do Tribunal de Justiça do Acre. A assessoria de Comunicação do Tribunal de Justiça, de forma rotineiramente republicana atendeu à solicitação da reportagem: conversou com a assessoria do desembargador sobre a intenção de entrevistá-lo. Ao ser informado sobre a presença da equipe de reportagem e da intenção de conversar sobre o assunto da concessão de habeas corpus, o desembargador Djalma alegou que “para não fazer juízo de valor sobre um processo ainda não concluído e em respeito à Lei Orgânica da Magistratura Nacional não iria falar sobre o assunto”.
O espaço para a exposição do contraditório foi oferecido e, como exige a postura democrática, está aberto quando o desembargador assim o desejar.
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