NÍVEL SOCIOECONÔMICO INFLUENCIA NOTA DE ESCOLA NO ENEM
Por Valéria Dias
Agência USP de Notícias
A renda familiar, a escolaridade dos pais e outros fatores
socioeconômicos explicam 80% da média das escolas com mais de 10 alunos
prestando o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Os outros 20% podem ser
creditados ao mérito da própria escola. Esses resultados foram obtidos pelo
pesquisador Rodrigo Travitzki ao analisar dados do Enem dos anos 2009 e 2010
para sua pesquisa de doutorado. O objetivo do estudo era saber até que ponto o
ranking de escolas do Enem tem validade como indicador de qualidade escolar.
“O ranking atual serve mais para as elites do que para o governo e a
sociedade, pois as escolas melhor colocadas são aquelas cujos alunos tiveram as
melhores notas. Mas se a escola recebe no ensino médio um aluno bom cuja nota
da prova também foi boa, significa que ela manteve a qualidade do aluno ao
longo do período. Entretanto, quando a escola recebe um aluno péssimo, mas que
na prova do Enem consegue um resultado mediano, significa que ela conseguiu
melhorar o aluno ao longo dos anos, fato que atualmente não é considerado no
ranking”, diz o pesquisador, que leciona Biologia para o ensino médio.
A pesquisa está sendo realizada para o doutorado-sanduíche de Travitzki
pela Faculdade de Educação (FE) da USP, sob a orientação da professora Carlota
Boto, e pela Universidade de Barcelona, na Espanha, sob a orientação do
professor Jorge Calero. A escolha por este centro de ensino espanhol ocorreu
pois lá se concentram vários especialistas na técnica de análise estatística de
dados educacionais. O estágio no exterior teve o apoio da Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).
Travitzki analisou especificamente o questionário que os alunos
respondem com informações sobre a situação sociocultural e econômica da
família, como renda familiar e escolaridade dos pais, e que permite identificar
o perfil dos participantes. Com base nesta análise, Travitzki está propondo um
outro ranking de escolas para o Enem. “A ideia é ranquear as escolas com base
na nota do ENEM de formas mais justas, equitativas, e informativas. O que eu
proponho é um modo novo de olhar para o ranking”, destaca o professor. A
divulgação do novo ranking deverá ocorrer em março de 2013, quando está
prevista a defesa da tese. Antes disso, também está prevista a publicação de
artigo científico sobre o tema.
Dentro da ótica do novo ranking, uma escola de periferia, que ocupa um
lugar desfavorável no ranqueamento atual, pode ser muito melhor conceituada na
análise realizada por Travitzki caso tenha alunos com uma boa pontuação no
Enem.
De abril a agosto de 2012, o pesquisador esteve na universidade
espanhola onde trabalhou com os microdados do Enem coletados por meio do site
do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP).
Os dados obtidos após o processo de filtragem são de cerca de 1 milhão de
alunos para cada ano. Travitzki escreveu um programa de computador baseado em
software livre, sendo que a análise foi realizada sob o ponto de vista da
economia voltada para a educação. “Posteriormente pretendo disponibilizar esses
códigos”, informa o doutorando.
Enem
O Exame Nacional do Ensino Médio foi criado em 1998, durante o governo
do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso com o objetivo de fornecer uma
avaliação do ensino médio brasileiro. Na gestão do ex-presidente Lula (e que se
estende aos dias atuais, na gestão da presidenta Dilma Rousseff), a nota do
Enem passou a ser utilizada para a conquista de vagas em universidades privadas
– via Programa Universidade para Todos (Prouni) por meio da concessão de bolsas
de estudo em cursos de graduação -, e também na conquista de vagas em
universidades federais brasileiras.
O ranking das escolas é divulgado desde 2006 e é baseado nas notas dos
alunos. A prova é composta por 45 questões de 4 áreas do conhecimento,
totalizando 180 questões. O Enem 2012 ocorre nos dias 3 e 4 de novembro. “O
exame é o segundo maior do mundo, avaliando cerca de 6 milhões de alunos ao
ano, perdendo apenas para o chinês, que avalia, anualmente, 10 milhões de
alunos”, informa o pesquisador.
Prejuízos à educação
Para Travitzki, o ranking de escolas atual fornecido pelo Enem pode
empobrecer a educação brasileira por dois motivos. “As escolas começam a se
preocupar mais com os bons resultados em testes e podem começar a esquecer de
outros elementos importantes para o aprendizado, como a inteligência emocional
e a capacidade de trabalhar em grupo, por exemplo. O segundo ponto é que o
ranking tende a aumentar as desigualdades, pois favorece as escolas que tiveram
as melhores notas e prejudica as que tiveram notas ruins.”
Imagem: Marcos Santos / USP
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