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22 novembro 2016

O CURSO DE MEDICINA NA UFAC AJUDA A FIXAR MÉDICOS NO ACRE?

Evandro Ferreira
Blog Ambiente Acreano

Segundo Scheffer et al. (2013), entre 1970 e 2012 a quantidade de médicos atuando no Brasil cresceu mais de 500%, ao passo que o crescimento da população em geral foi de pouco mais de 100%. Apesar disso, ainda são muito grandes as desigualdades na distribuição destes profissionais entre as diferentes regiões do país, sendo a carência mais evidente nas cidades do interior. Alguns estudos apontam que duas causas principais contribuem para essa situação: a falta de condições de trabalho e os baixos salários.

Para tentar diminuir esta distorção, a partir do início dos anos 2000 o Governo Federal priorizou a abertura de mais escolas médicas – preferencialmente em cidades do interior ou em capitais onde elas inexistiam – e a ampliou o número das vagas em cursos de medicina existentes. Mais recentemente, apelou-se para a importação de médicos estrangeiros e a facilitação da revalidação de diplomas médicos de profissionais formados em outros países.

Foi nesse contexto que em 2002 foi autorizado o funcionamento do curso de medicina no Campus de Rio Branco da Universidade Federal do Acre (UFAC). A esperança era que com a criação da escola em nossa cidade fosse possível aumentar a oferta de médicos no Acre e diminuir a quantidade de acreanos que, sem opção, deslocavam-se para outras regiões do Brasil, e mesmo o exterior, para buscar formação médica.

Para comprovar se a existência de um curso de medicina no Acre poderia alterar esse panorama, um estudo liderado pela docente de Medicina da UFAC, Jene Greyce Souza de Oliveira, investigou o destino pós-escola de 156 de 165 médicos formados na UFAC até o final de 2011. A pesquisa consistiu na aplicação de um questionário com 48 perguntas que abrangiam variáveis sociodemográficas, de formação, do trabalho médico e da qualificação profissional.

O estudo apresenta dados interessantes sobre a demografia dos médicos que atuavam no Acre até 2013, extraído da publicação “Demografia Médica no Brasil: Cenários e Distribuição” (Scheffer et al. 2013): a população de médicos ativos no Acre era 819 indivíduos (1,08 médicos/1.000 habitantes), dos quais 655 (79,9%) atuavam na capital, Rio Branco, e apenas 164 nos municípios do interior. Em relação ao perfil dos médicos atuantes no Acre, Andrade et al. (2005) haviam observado a predominância de profissionais do sexo masculino (72,1%), com menos de 45 anos de idade (68,5%), em sua maioria de brasileiros (90,6%) oriundos de outros estados (74,3%). Os autores impressionaram-se com os dados de Scheffer et al. (2013) que mostraram que o Acre concentrava uma grande população de médicos formados no exterior (12%), equivalente a 10 vezes o quantitativo para o Brasil e o dobro do verificado na região Norte.

Em relação à naturalidade dos médicos formados pela UFAC, a maioria (29,2%) era do Acre, seguidos por nativos do Estado de Goiás (12,2%) e Rondônia (9,7%). Embora os autores do estudo reconheçam que a instalação do curso de medicina na UFAC tenha contribuído para um crescente acesso de acreanos no curso de medicina, corroborando a assertiva de Santos et al. (2005) de que a oferta local de medicina pode representar uma fonte de estímulo estudantes que vivem na região de influência direta do curso, eles relatam nos resultados e discussão de sua publicação que ainda é grande a procura de universidades estrangeiras, em Cuba, Peru e Bolívia, por parte de uma parcela considerável estudantes acreanos. Essa afirmação, entretanto, não foi objeto do estudo publicado e no mesmo não são apresentados dados para mostrar a dimensão exata desta 'grande procura'.

No que se refere às características sociodemográficas, 80% dos ex-alunos da UFAC participantes da pesquisa eram da faixa etária abaixo dos 30 anos, 61,8% eram em do gênero masculino e 100% de nacionalidade brasileira. Em relação ao trabalho médico desenvolvido, 87,4% afirmaram estar satisfeitos com a carreira escolhida, 61,4% atuavam no setor público, 36,4% tinham atividades simultâneas no setor público e privado, a maioria atuava na área clínica (68,5%) e uma parcela considerável cumpria jornada de trabalho de 60 horas semanais (41,6%). Em relação à renda mensal, aproximadamente 82% declararam renda superior a 4 mil reais, e 46% afirmaram receber proventos superiores a 8 mil reais.

Em relação ao destino dos profissionais médicos formados na UFAC, a pesquisa revelou que dos 87 participantes do estudo que informaram o local de atuação profissional ao final da graduação, 57,3% deles estavam trabalhando no Acre. Os demais estavam atuando em São Paulo (5,6%), Minas Gerais (5,6%) e Paraná (4,5%). A grande maioria (79%) atua em cidades capitais em diversos estado do Brasil. 

O principal fator para a fixação no Acre de profissionais formados na UFAC foram os laços familiares enquanto que melhores propostas de trabalho foram o principal motivo alegado para a migração para outros estados. O fato de existir um programa de residência médica em funcionamento no Acre também é importante fator para a fixação de profissionais no Estado. Os autores do estudo citam dados da secretaria de Comissão de Residência Médica do Acre que indicam que dos 149 médicos residentes formados até o ano de 2011, 57,7% permaneceram no Estado após o término da residência médica.

Em suas considerações finais os autores do estudo afirmam não acreditar que a abertura de mais escolas médicas seja um fator contributivo para diminuir a desigualdade da distribuição de médicos, principalmente nos municípios do interior. Afirmação que reputamos não refletir com exatidão os dados apresentados no estudo. Por outro lado, eles acertadamente sugerem que a fixação de profissionais médicos, especialmente em áreas remotas como a Amazônia, requer a melhoria das condições e da remuneração do trabalho.

Para saber mais:
Andrade, E.O. et al. 2005. O médico e seu trabalho: resultados da região norte e seus estados.Brasília-DF: Conselho Federal de Medicina.
Oliveira, J.G.S.; Paula, G.O.; Araujo, T.S. 2015. A formação, o trabalho e a fixação deegressos médicos na Amazônia Ocidental. Revista Internacional de Humanidades Médicas, 4(2): 101-114.
Scheffer, M.; Cassenote, A.; Biancarelli, A. (Orgs.). 2013. Demografia Médica no Brasil: Cenários eDistribuição. Brasília-DF: Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo/Conselho Federal de Medicina.