É VIÁVEL EXPLORAR MADEIRA EM FRAGMENTOS DE FLORESTAS SECUNDÁRIAS NA APA LAGO DO AMAPÁ?
Evandro José Linhares Ferreira* e Maria
Francisca Ribeiro de Aguiar Bargas**
Estima-se que até o final do ano de 2013 cerca
de 15% da floresta amazônica brasileira tinha sido desmatada. O desmatamento
causa, entre outros efeitos, a redução na
fertilidade do solo, erosão, alterações nos regimes hidrológicos locais e
globais, e emissão de gases causadores do efeito estufa. Na Amazônia as áreas
desmatadas são frequentemente utilizadas em atividades agropecuárias e quando
perdem a produtividade natural geralmente são abandonadas, crescendo no local
vegetação secundária conhecida popularmente no Acre como ‘capoeira’.
Da área que já foi desmatada na Amazônia se estima que
aproximadamente 19% são ocupadas por vegetação secundária. Ao atingir o estádio florestal a vegetação secundária minimiza os
efeitos do desmatamento, contribui para o acumulo de biomassa e ajuda na manutenção
da biodiversidade. A floresta secundária também pode prover recursos à fauna
silvestre e aos habitantes que vivem no seu entorno. Neste último caso um dos
principais recursos oferecidos são as essências madeireiras de rápido
crescimento.
Aqui no entorno de Rio Branco, por exemplo, verifica-se uma
grande ocorrência da espécie arbórea Schizolobium
amazonicum, conhecida popularmente pelos nativos como paricá, faveira e
guapuruvu (pinho-cuiabano para os imigrantes). Esta espécie predomina em
numerosos fragmentos florestais secundários da região e quem frequenta o
arraial da comunidade daimista ‘Alto Santo’, no bairro Irineu Serra, pode
verificar que a madeira usada na grande fogueira preparada para a festa é, em
sua maioria, extraída de árvores de paricá existentes na floresta vizinha à
comunidade.
Apesar do potencial de uso, o manejo de
florestas secundárias na Amazônia ainda é uma forma relativamente nova de uso
alternativo da terra, sendo poucos os exemplos bem sucedidos desse tipo de atividade.
A carência de informações para auxiliar na identificação das potencialidades de
uso de plantas em florestas secundárias limita e desestimula o manejo dessas
áreas com fins econômicos. De fato, a maior parte dos esforços de pesquisa na
região é direcionada para determinar o potencial de uso de florestas primárias
ricas em essências madeireiras mais nobres (e de maior valor econômico) como o
cedro, cerejeira, ipê, amarelão e cumaru-ferro.
Tendo em vista esta situação, uma equipe do escritório
acreano do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA) e do Herbário do Parque
Zoobotânico da UFAC resolveu avaliar o potencial de exploração do estoque de espécies
madeireiras com valor comercial encontradas em alguns fragmentos florestais
secundários da Área de Proteção Ambiental (APA) ‘Lago do Amapá’, localizada nas
cercanias de Rio Branco. Esta APA, que tem cerca de 33% de sua cobertura
vegetal composta por um mosaico de fragmentos florestais secundários, é uma
unidade de conservação de uso sustentável e tem como principais objetivos a
conservação da natureza e o uso direto dos recursos naturais de forma
sustentável pelos seus moradores.
O estudo foi realizado em três fragmentos florestais
secundários em diferentes estádios sucessionais: o Fragmento 1 tinha idade de
regeneração estimada em 60 anos e área aproximada de 21 hectares, o Fragmento 2,
com idade de estimada entre 35 e 40 anos, tinha uma área de aproximadamente 53
hectares, e o Fragmento 3, com idade de regeneração estimada entre 25 e 30 anos,
tinha cerca de 31 hectares de área. Em cada fragmento foi feito um inventário
de um hectare de floresta no qual todos os indivíduos arbóreos com diâmetro a altura
do peito (DAP) igual ou maior que 10 cm foram identificados botanicamente e
mensurados (DAP e altura comercial).
Para determinar o potencial madeireiro dos fragmentos
calculou-se o volume dos indivíduos amostrados utilizando-se uma fórmula que
considerou o DAP, a altura comercial e um fator de correção de forma. Para
determinar quais espécies encontradas no inventário eram comercializadas em Rio
Branco foi feito um estudo no mercado local que consistiu em visitas in loco a estabelecimentos comercializadores
de madeira e produtos derivados.
O estudo de mercado realizado em Rio Branco resultou em uma
lista com 75 espécies madeireiras sendo comercializadas na cidade. Destas, 39
ocorriam nos fragmentos florestais inventariados na APA Lago do Amapá, assim
distribuídas: 31 espécies e 142 indivíduos no Fragmento 1 (+60 anos em
regeneração), 20 espécies e 103 indivíduos no Fragmento 2 (35 a 40 anos) e 12
espécies e 52 indivíduos no Fragmento 3 (25 a 30 anos). No Fragmento 1 as
espécies com maior número de representantes foram limãozinho (Zanthoxylum rhoifolium), breu-miúdo (Protium spp.) e ucuuba (Virola elongata), com 21, 18 e 13
indivíduos, respectivamente. No Fragmento 2 as espécies mais abundantes foram o
cumaru-cetim (Apuleia leiocarpa) e o
limãozinho, com 36 e 10 indivíduos, respectivamente. No Fragmento 3 a espécie
mais abundante foi o mulateiro (Calycophyllum
spruceanum), com 23 indivíduos.
O estoque volumétrico de madeira no Fragmento
1 foi de 58,7 m³/hectare, com a marupá (Jacaranda copaia) com o maior
volume (10,4 m³). No Fragmento 2 o volume foi de 27,2 m³/hectare, sendo o marupá
a espécie com maior volume. No Fragmento 3 o volume foi de 21,2 m³/hectare, sendo
o mulungu a de maior volume. As
árvores que apresentaram diâmetro mínimo de corte (DMC), ou seja, o diâmetro
mínimo que uma árvore deve ter para que seja permitido o seu corte em projeto
de manejo florestal sustentável, representaram um volume de 21 m³ no Fragmento 1
e 2,1 m³ no Fragmento 3. No Fragmento 2 não foi encontrado nenhum individuo com
DMC.
O volume das árvores pré-comerciais, ou
seja, com DAP entre 30 e 50 cm foi de 19,2 m³ no Fragmento 1, 10 m³ no
Fragmento 2, e 10,6 m³ no Fragmento 3. Considerando um incremento médio anual
de 0,86 m³ (estimativa prevista Resolução 406/2009 do Conselho Nacional do Meio
Ambiente-CONAMA), o tempo de espera para que essas árvores pré-comerciais
atinjam o volume de 30 m³/hectare (volume máximo a ser explorado em ciclo de
corte de 35 anos) nos Fragmentos 1, 2 e 3 será de, respectivamente, de 12 ½ anos,
23 anos e 2 meses, e 22 anos e 5 meses.
A conclusão do estudo foi que na
atualidade a exploração madeireira nos fragmentos florestais avaliados na APA Lago
do Amapá não é viável porque são poucas as árvores que apresentam diâmetro
mínimo de corte de 50 cm. Embora o tempo de espera para que o volume de madeira/hectare
atinja 30 m³ seja de pouco mais de 12 anos, sob o ponto de vista legal a
exploração só poderá ser autorizada quando as árvores atingirem o DMC. E as
estimativas que foram feitas indicam que isso demandará um tempo que varia
entre 50 e 200 anos.
*Engenheiro Agrônomo e pesquisador do
INPA e do Parque Zoobotânico da UFAC
**Engenheira Florestal, Pós-Graduanda
em Licenciamento e Estudos Ambientais na Universidade Santa Cecília, São Paulo.
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