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12 novembro 2016

BUSCAR SOLUÇÕES PARA O CLIMA É UMA NECESSIDADE QUE TRAZ BENEFÍCIOS (Primeira parte)*

Foster Brown** e Evandro Ferreira***
  
Enfrentamos tantos problemas e de toda ordem que é fácil esquecer um deles quando não acontecem secas severas, ondas de calor ou inundações: a influência humana no clima. Cientistas renomados das Academias de Ciências de países como o Brasil, China, Índia, México, África do Sul e de outros países já se manifestaram sobre a importância de cuidarmos desse problema. Associações de cientistas especializados em estudos atmosféricos já detalharam a influencia humana em mudanças de clima. O problema é tão alarmante que até o Papa Francisco entrou no debate com a sua encíclica Ladato Si na qual reconhece que atividades humanas causam mudanças no clima.

Mas como qualquer assunto, há divergências. Uma das poucas associações de cientistas que não subscrevem a importância da contribuição humana para as mudanças no clima é a Associação Americana de Geólogos de Petróleo que demanda a realização de mais pesquisas para poder concordar com as evidências até aqui colocadas. Companhias petrolíferas, como Exxon Mobil, estão sendo investigadas nos EUA por terem ajudado a disseminar dúvidas sobre a influência humana nas mudanças climáticas ao mesmo tempo em que seus próprios cientistas afirmavam que as mudanças tinham sim influência humana.

Donald Trump, o candidato Republicano à presidência dos EUA, acha que os chineses criaram o conceito de mudanças climáticas derivadas das atividades humanas para prejudicar a indústria norte-americana. Para ele e vários republicanos, essa coisa de atribuir ao próprio homem as mudanças que estão acontecendo com o clima é um complô dos comunistas. Aqui no Brasil, os que afirmam que essa história de atribuir ao homem as mudanças que estão acontecendo no clima também ‘acham’ que tudo não passa de um complô.

Diferentemente de Trump, entretanto, os céticos brasileiros acreditam que não são os chineses que estão por trás de toda a história. Para eles, os responsáveis são os americanos e europeus que querem continuar a desfrutar de seu estilo de vida e manter em atividade suas indústrias altamente poluidoras.

Seria até bom que tudo não passasse de um complô comunista ou capitalista, não importa. Mas a verdade é que as evidências indicam o contrário e que estamos trilhando num caminho onde a perturbação do clima vai aumentar drasticamente nas próximas décadas. Atualmente, os sinais dessas perturbações se encontram na frequência crescente de ondas de calor, a intensidade crescente das chuvas e a redução do gelo marítimo no oceano Ártico e das calotas polares na Groenlândia e Antártida.

E uma das principais causas destas perturbações é o aumento da concentração de gás carbônico (CO2) na atmosfera. Em 1986, quando o primeiro autor deste artigo visitou Rio Branco pela primeira vez, a concentração média global do CO2 atmosférico era de cerca de 350 partes por milhão (ppm). Atualmente ela subiu e alcança 400 ppm, indicando um acúmulo de cerca de 100 bilhões de toneladas de CO2 na atmosfera nesse intervalo de 30 anos.

O CO2 provoca a retenção de calor no planeta, principalmente nos oceanos. Apesar de grandes e profundos, os oceanos não são infinitos e é esse calor que eles absorvem que tem influenciado a circulação de ar no planeta. Os sinais de perturbações, especialmente nas regiões polares do hemisfério norte, já estão causando impactos econômicos crescentes.

Atividades humanas estão liberando via a queima de petróleo e das florestas cerca de 10 bilhões de toneladas de carbono por ano para a atmosfera. Uma parte se dissolve nos oceanos, acidificando-os, outra parte é absorvida pela vegetação e o solo e uma parte – equivalente a menos da metade – se acumula na atmosfera, elevando a concentração de CO2 em uma taxa aproximada de 2 ppm por ano.

Mesmo que parássemos as emissões agora, o clima continuaria a mudar em razão da quantidade de CO2 já acumulada na atmosfera. Por isso, nas condições atuais, a continuação da queima de combustíveis fósseis e de florestas equivale a jogar gasolina no fogo. A escolha é nossa. Ou buscamos com urgência mudar para um estilo de vida e economia que cause pouco impacto no clima ou teremos que aprender a viver em um planeta com um clima cada vez mais alterado e ameaçador para nós.

Neste ponto da discussão ficamos um pouco depressivos por que as soluções para o problema parecem distantes. Precisamos de energia e a população mundial continua a crescer. Os grandes vilões das emissões de carbono no mundo são os Estados Unidos e a China, responsáveis por cerca de 30% das emissões globais de CO2 – via queima de combustíveis fosseis – em 2013. Como eles concorrem pela hegemonia econômica mundial é de se supor que a China não vai fazer mais do que os EUA, deixando este último país como modelo mundial de controle de emissões e que poderá ter, como possível presidente, Donald Trump.

Mais recentemente, porém, encontramos informações que nos deram mais ânimo. Pesquisadores das Universidades Americanas de Stanford e Berkeley publicaram um artigo em 2015 que indica que os EUA poderiam deixar de ser 100% livres de combustíveis fósseis até 2050. Antes disso, em 2030 eles estimam que seria 80% livres se houver uma vontade social efetiva. As fontes energéticas substitutas seriam a eólica (cerca de 50%) e a solar (45%). Segundo o estudo, a economia que isso representaria para o americano médio em 2050 seria de cerca de 830 reais/ano em custos de energia. As despesas com os impactos na saúde e de clima seriam reduzidas em 4.800 e 26.600 reais/ano – per capita, respectivamente.

Em outras palavras, existe pelo menos uma proposta de como sair desta armadilha que o uso de combustíveis fósseis representa e garantir alguma possibilidade de estancar a mudança do clima. Entretanto, tudo tem que ser analisado criticamente e devemos admitir que atrasos possam complicar a execução das ações. Então por que não construir uma proposta para esta parte da Amazônia e implementá-la logo? Nossos filhos e netos agradecerão.

Artigo citado: Jacobson, M. Z. et al. 2015. 100%clean and renewable wind, water, and sunlight (WWS) all-sector energy roadmapsfor the 50 United States. Energy Environ. Sci. 8: 2093–2117.

*Artigo originalmente publicado no jornal A Gazeta, Rio Branco, Acre, em 01/11/2016;
**Foster Brown, pesquisador do Centro de Pesquisa de Woods Hole, Docente dos Cursos de Mestrado em Ecologia e Manejo de Recursos Naturais e em Ciências Florestais da Universidade Federal do Acre (UFAC); cientista do Programa de Grande Escala Biosfera Atmosfera na Amazônia, do INCT SERVAMB e do Grupo de Gestão de Riscos de Desastres do Parque Zoobotânico da UFAC; Membro do Consórcio Madre de Dios e da Comissão Estadual de Gestão de Riscos Ambientais do Acre.
***Evandro Ferreira é engenheiro agrônomo, pesquisador do INPA/Parque Zoobotânico da UFAC e Docente do Curso de Mestrado em Ciências Florestais da UFAC.