DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL E A VALORIZAÇÃO DOS RECURSOS FLORESTAIS
Raimundo Cláudio Gomes Maciel (**)
Parte 2
Para um efetivo desenvolvimento sustentável na Amazônia, o ponto nevrálgico é o nível de desempenho econômico da produção de origem florestal sustentável, face aos sistemas convencionais de exploração. Conforme Becker (2001, p. 18):
“A questão do desenvolvimento florestal com sustentabilidade não se deve resumir à questão do desmatamento e sim às potencialidade para competir. (...) O lucro da agricultura e da extração da madeira é tão poderoso que o desmatamento continuará mesmo que a política florestal procure incrementar a lucratividade e sustentabilidade do manejo florestal. (…) Soma-se ao poder econômico da madeira, o poder político.”
Além disso, segundo Margulis (2003), a lucratividade da pecuária é o fator chave para explicar o grosso dos desmatamentos da região, ou seja, “o motor do processo dos desmatamentos da Amazônia brasileira é a viabilidade financeira dos grandes e médios pecuaristas da fronteira consolidada” (p. 14). Esse aspecto tem implicações importantes em termos de políticas públicas para a região, pois
“Sendo a pecuária economicamente viável (do ponto de vista privado), então a decisão de se controlar os desmatamentos e a conversão da floresta em pastagens envolverá um “trade-off”: uma perda econômica para os agentes privados locais, que deverá ser confrontada com os eventuais ganhos ecológicos envolvidos com a conservação, evidenciando serem muito mais controversas e difíceis de aplicar. (Margulis, 2000, p. 19)”
Por outro lado, Margulis (2003, p. 17) afirma que o manejo florestal sustentado “mostra-se menos econômico do ponto de vista privado que a pecuária. Além disso, é uma técnica pouco disseminada e bastante ‘sofisticada’ quando comparada com o extrativismo madeireiro não sustentável ou com a pecuária, ambos amplamente praticados e percebidos como envolvendo baixos riscos”.
Pearce, Putz e Vanclay (1999) enfatizam que as desigualdades de rentabilidade encontradas nas comparações entre os sistemas convencionais e sustentáveis de exploração da floresta, não justificam a preferência pelos primeiros, visto que os cálculos dos custos e benefícios dos empresários são certamente diferentes para a sociedade.
Segundo Pearce, Putz e Vanclay (1999), uma maneira de melhor discutir essa questão é mudar o foco dos debates sobre o uso das florestas, já que na prática apenas os lucros financeiros são focalizados com adicionais descrições físicas dos danos ambientais. Desse modo, do ponto de vista privado, o uso da floresta será sempre orientado por opções que obtenham maiores taxas de retornos financeiros.
Para uma avaliação econômica completa, a focalização dos impactos ambientais é pertinente, identificando-se os paralelos entre as funções ecológicas e as magnitudes econômicas. Esse tipo de avaliação faz ajustamentos nas análises financeiras, incorporando-se os “verdadeiros” custos de oportunidade dos recursos envolvidos, além das externalidades (positivas ou negativas) decorrentes do uso da floresta para a sociedade. Contudo, os autores destacam que nem sempre é considerado que análise econômica e análise financeira são bastante diferentes, uma vez que a primeira pode ratificar uma atividade econômica considerada insuficiente, do ponto de vista da segunda.[1]
Adicionalmente, a valoração econômica do meio ambiente florestal, em particular nas RESEX, é necessária tendo em vista que “a maioria dos bens e serviços ambientais e das funções providas ao homem pelo ambiente não é transacionada pelo mercado” (Marques e Comune, 1999, p. 23). Nesse sentido, “A valoração ambiental é essencial, se se pretende que a degradação da grande maioria dos recursos naturais seja interrompida antes que ultrapasse o limite da irreversibilidade” (Schweitzer, 1990 apud Marques e Comune, 1999, p. 24). Entretanto, conforme Kitamura (1999), ressalta-se a necessidade de se internalizar os benefícios intrínsecos ou extramercados, em favor das comunidades nativas da região amazônica e que, normalmente, ficam apenas com os custos de preservação. Este enfatiza ainda, que mesmo com o movimento global em torno da preservação da Floresta, o lado utilitário, de uso tangível imediato ou futuro, predomina no tocante ao valor econômico total da Floresta Amazônica.
Essa asserção de Kitamura é corroborada pela realidade encontrada dentre a população extrativista da RESEX “Chico Mendes”, que sofrem com o predomínio dos custos da preservação, enquanto aguardam os benefícios sonhados.
Desse modo, tendo em vista a racionalidade econômica dominante entre os agentes econômicos, cuja preponderância dos valores tangíveis de curto prazo na busca pela maximização do lucro é flagrante, evidencia-se, conforme a tabela 1, que os valores reais de uso direto indicam a preocupante atual situação do extrativismo vegetal praticado na RESEX “Chico Mendes” pois, o rendimento auferido anualmente é menor que o salário mínimo mensal vigente no país. Por outro lado, o autoconsumo das famílias minimiza os baixos rendimentos monetários, constituindo-se no principal suporte para sua manutenção.
Desse modo, não é de se estranhar a constatação de um aumento das áreas desflorestadas dentro da própria RESEX, visto que os baixos rendimentos induzem os produtores a buscar alternativas produtivas. Quando se deparam com os resultados econômicos oriundos da pecuária bovina com níveis de lucratividade, do ponto de vista estritamente econômico, extremamente elevada (tabela 1, abaixo), é natural que haja interesse dos extrativistas em converter a floresta em pastagem na luta pela sobrevivência, fato detectado por CIRAD (2001) em recente pesquisa. Evidenciando-se, assim, crescente risco à preservação do meio ambiente.
Há uma necessidade urgente no oferecimento, por parte dos gestores públicos, às populações extrativistas, alternativas de explorações sustentáveis da floresta em detrimento das atividades claramente insustentáveis do ponto de vista ambiental, como a pecuária bovina extensiva praticada na região. Além disso, tem que ser ressaltado que para esta atividade gerar rendimentos extraordinários tem que se derrubar quase que toda a floresta – gerando prejuízos incalculáveis ao ambiente – de uma unidade de produção (colocação) do seringueiro. Pois, de acordo com a tabela 1 (acima), a atividade torna-se insustentável também do ponto de vista econômico em pequenas áreas, além de não ser permitido desflorestar mais de 10% da área da colocação.
Portanto, as Ilhas de Alta Produtividade (IAPs) surgem como outra possibilidade de produção sustentável, principalmente por proporcionar inovação tecnológica por dentro do extrativismo tradicional, notadamente no processo produtivo – cujo atraso tecnológico está, essencialmente, na raiz do processo – e que está intimamente relacionado com a forma de exploração (manejo) da floresta e sua conservação. Os valores previstos para o uso direto das IAPs, conforme a tabela 1, demonstram os impactos da inovação nos rendimentos da unidade de produção, os quais chegam até três salários mínimos mensais, no caso da IAP com base em seringueiras clonais, utilizando-se para tanto de uma área (desflorestada anteriormente) com apenas 5 ha – o extrativismo tradicional precisa de uma área média de 300 ha/colocação.
No entanto, os valores reais de uso direto atribuídos às IAPs não são suficientes para as tornarem atrativas do ponto de vista econômico, uma vez que os rendimentos proporcionados à pecuária bovina extensiva são até cinco vezes maiores que os provenientes das IAPs, baseadas em seringueiras plantadas a partir de sementes.
Nessa mesma perspectiva, o estudo de CIRAD/UNICAMP (2001), realizado também no estado do Acre, a partir da análise econômica de sete produtos[2] florestais não-madeireiros, potenciais para a região, de acordo com o governo estadual, verificou que mesmo com a exploração intensiva destes produtos os rendimentos gerados não suplantarão as rendas originárias da pecuária. Isso significa que há ainda uma maior atratividade por atividades insustentáveis para o meio ambiente, focalizadas para a obtenção de lucros no curto prazo sob a ótica privada.
Para que se possa mudar esse quadro, as decisões sobre políticas públicas que realmente possam promover as alternativas de exploração sustentável da floresta têm que focalizar não apenas os resultados econômicos sob a lógica privada, mas num valor econômico que gerem benefícios para toda a sociedade local, nacional ou global. Segundo a tabela 1, a pecuária que, por um lado gera excelentes rendimentos econômicos, por outro, causa um enorme prejuízo para a sociedade face às perdas – até mesmo irreversíveis – provocadas aos serviços do ecossistema florestal. Este fato fornece elementos suficientes para coibir a implantação de qualquer alternativa produtiva com base na pecuária extensiva ou outra qualquer atividade insustentável.
Não obstante, também não se pode apenas olhar para fluxos monetários estimados para as funções ou serviços ecossistêmicos, uma vez que, sob esse foco, o extrativismo tradicional praticado na RESEX gera imensos benefícios ambientais – externalidades positivas – para toda a sociedade, podendo ser estimados em termos de fluxos monetários. Mas, na prática não são traduzidos em rendimentos efetivos para os produtores extrativistas que continuam sua luta desesperada pela sobrevivência.
Todavia, as IAPs além promoverem a manutenção dessas externalidades – inclusive com a ampliação através do reflorestamento –, preconizam uma melhoria significativa dos rendimentos, principal gargalo para manutenção das famílias. A expressão desses atributos no valor econômico total das IAPs transforma essa alternativa produtiva de exploração da floresta numa atividade viável tanto do ponto de vista econômico quanto ambiental, superando as formas de exploração insustentáveis.
Essa superioridade somente poderá ser efetiva quando do desenvolvimento de instrumentos econômicos que possam capturar os fluxos monetários expressos pelos valores sociais das externalidades positivas geradas pela adoção de explorações sustentáveis da floresta. Nessa direção, é importante também, a consecução de uma escala adequada de competitividade com as explorações não-sustentáveis, como a pecuária extensiva, visto que muitas daquelas são alternativas pontuais e limitadas (Margulis, 2003). Claro que, observando-se os próprios limites ambientais.
Portanto, um mecanismo que pode capturar os fluxos monetários das externalidades positivas ambientais é a certificação ambiental, constituindo-se num sobre-preço oriundo da certificação da eficiência sócio-ambiental, mediante aplicação de um selo verde, considerado um prêmio pago pelos consumidores, dispostos a pagarem por produtos sócio-econômicos e ambientalmente corretos.
Entretanto, como esse mecanismo é recente e carece de evidências concretas, necessita-se de mais estudos para avaliar seus possíveis impactos sócio-econômicos e ambientais, principalmente em virtude do fato de que as comunidades florestais das RESEX já utilizam a certificação ambiental como estratégia para a manutenção das famílias e da própria floresta amazônica.
[1] Sobre esse assunto ver também Bamford et al. (2002).
[2] Os produtos são: Açaí, Buriti, Patauá, Andiroba, Copaíba, Murmurú e Unha de Gato.
..........................................................................
Clique aqui para ler a Parte 1 deste artigo.
..........................................................................
(*)Texto extraído do Capítulo 1 da tese de Doutorado “Certificação Ambiental: Uma Estratégia para a Conservação da Floresta Amazônica”, defendida pelo autor na Unicamp em 2007.
(**) Doutor em Economia pela Universidade Estadual de Campinas e Coordenador do Projeto Análise Econômica dos Sistemas Básicos de Produção Familiar Rural do Estado do Acre (ASPF) do Departamento de Economia da UFAC. E-mail: rcgmaciel@bol.com.br.
Crédito das imagens: Itaúba (E. Ferreira). Demais imagens: site da RESEX Cazumbá-Iracema.
Parte 2
Para um efetivo desenvolvimento sustentável na Amazônia, o ponto nevrálgico é o nível de desempenho econômico da produção de origem florestal sustentável, face aos sistemas convencionais de exploração. Conforme Becker (2001, p. 18):
“A questão do desenvolvimento florestal com sustentabilidade não se deve resumir à questão do desmatamento e sim às potencialidade para competir. (...) O lucro da agricultura e da extração da madeira é tão poderoso que o desmatamento continuará mesmo que a política florestal procure incrementar a lucratividade e sustentabilidade do manejo florestal. (…) Soma-se ao poder econômico da madeira, o poder político.”
Além disso, segundo Margulis (2003), a lucratividade da pecuária é o fator chave para explicar o grosso dos desmatamentos da região, ou seja, “o motor do processo dos desmatamentos da Amazônia brasileira é a viabilidade financeira dos grandes e médios pecuaristas da fronteira consolidada” (p. 14). Esse aspecto tem implicações importantes em termos de políticas públicas para a região, pois
“Sendo a pecuária economicamente viável (do ponto de vista privado), então a decisão de se controlar os desmatamentos e a conversão da floresta em pastagens envolverá um “trade-off”: uma perda econômica para os agentes privados locais, que deverá ser confrontada com os eventuais ganhos ecológicos envolvidos com a conservação, evidenciando serem muito mais controversas e difíceis de aplicar. (Margulis, 2000, p. 19)”
Por outro lado, Margulis (2003, p. 17) afirma que o manejo florestal sustentado “mostra-se menos econômico do ponto de vista privado que a pecuária. Além disso, é uma técnica pouco disseminada e bastante ‘sofisticada’ quando comparada com o extrativismo madeireiro não sustentável ou com a pecuária, ambos amplamente praticados e percebidos como envolvendo baixos riscos”.
Pearce, Putz e Vanclay (1999) enfatizam que as desigualdades de rentabilidade encontradas nas comparações entre os sistemas convencionais e sustentáveis de exploração da floresta, não justificam a preferência pelos primeiros, visto que os cálculos dos custos e benefícios dos empresários são certamente diferentes para a sociedade.
Segundo Pearce, Putz e Vanclay (1999), uma maneira de melhor discutir essa questão é mudar o foco dos debates sobre o uso das florestas, já que na prática apenas os lucros financeiros são focalizados com adicionais descrições físicas dos danos ambientais. Desse modo, do ponto de vista privado, o uso da floresta será sempre orientado por opções que obtenham maiores taxas de retornos financeiros.
Para uma avaliação econômica completa, a focalização dos impactos ambientais é pertinente, identificando-se os paralelos entre as funções ecológicas e as magnitudes econômicas. Esse tipo de avaliação faz ajustamentos nas análises financeiras, incorporando-se os “verdadeiros” custos de oportunidade dos recursos envolvidos, além das externalidades (positivas ou negativas) decorrentes do uso da floresta para a sociedade. Contudo, os autores destacam que nem sempre é considerado que análise econômica e análise financeira são bastante diferentes, uma vez que a primeira pode ratificar uma atividade econômica considerada insuficiente, do ponto de vista da segunda.[1]
Adicionalmente, a valoração econômica do meio ambiente florestal, em particular nas RESEX, é necessária tendo em vista que “a maioria dos bens e serviços ambientais e das funções providas ao homem pelo ambiente não é transacionada pelo mercado” (Marques e Comune, 1999, p. 23). Nesse sentido, “A valoração ambiental é essencial, se se pretende que a degradação da grande maioria dos recursos naturais seja interrompida antes que ultrapasse o limite da irreversibilidade” (Schweitzer, 1990 apud Marques e Comune, 1999, p. 24). Entretanto, conforme Kitamura (1999), ressalta-se a necessidade de se internalizar os benefícios intrínsecos ou extramercados, em favor das comunidades nativas da região amazônica e que, normalmente, ficam apenas com os custos de preservação. Este enfatiza ainda, que mesmo com o movimento global em torno da preservação da Floresta, o lado utilitário, de uso tangível imediato ou futuro, predomina no tocante ao valor econômico total da Floresta Amazônica.
Essa asserção de Kitamura é corroborada pela realidade encontrada dentre a população extrativista da RESEX “Chico Mendes”, que sofrem com o predomínio dos custos da preservação, enquanto aguardam os benefícios sonhados.
Desse modo, tendo em vista a racionalidade econômica dominante entre os agentes econômicos, cuja preponderância dos valores tangíveis de curto prazo na busca pela maximização do lucro é flagrante, evidencia-se, conforme a tabela 1, que os valores reais de uso direto indicam a preocupante atual situação do extrativismo vegetal praticado na RESEX “Chico Mendes” pois, o rendimento auferido anualmente é menor que o salário mínimo mensal vigente no país. Por outro lado, o autoconsumo das famílias minimiza os baixos rendimentos monetários, constituindo-se no principal suporte para sua manutenção.
Desse modo, não é de se estranhar a constatação de um aumento das áreas desflorestadas dentro da própria RESEX, visto que os baixos rendimentos induzem os produtores a buscar alternativas produtivas. Quando se deparam com os resultados econômicos oriundos da pecuária bovina com níveis de lucratividade, do ponto de vista estritamente econômico, extremamente elevada (tabela 1, abaixo), é natural que haja interesse dos extrativistas em converter a floresta em pastagem na luta pela sobrevivência, fato detectado por CIRAD (2001) em recente pesquisa. Evidenciando-se, assim, crescente risco à preservação do meio ambiente.
Há uma necessidade urgente no oferecimento, por parte dos gestores públicos, às populações extrativistas, alternativas de explorações sustentáveis da floresta em detrimento das atividades claramente insustentáveis do ponto de vista ambiental, como a pecuária bovina extensiva praticada na região. Além disso, tem que ser ressaltado que para esta atividade gerar rendimentos extraordinários tem que se derrubar quase que toda a floresta – gerando prejuízos incalculáveis ao ambiente – de uma unidade de produção (colocação) do seringueiro. Pois, de acordo com a tabela 1 (acima), a atividade torna-se insustentável também do ponto de vista econômico em pequenas áreas, além de não ser permitido desflorestar mais de 10% da área da colocação.
Portanto, as Ilhas de Alta Produtividade (IAPs) surgem como outra possibilidade de produção sustentável, principalmente por proporcionar inovação tecnológica por dentro do extrativismo tradicional, notadamente no processo produtivo – cujo atraso tecnológico está, essencialmente, na raiz do processo – e que está intimamente relacionado com a forma de exploração (manejo) da floresta e sua conservação. Os valores previstos para o uso direto das IAPs, conforme a tabela 1, demonstram os impactos da inovação nos rendimentos da unidade de produção, os quais chegam até três salários mínimos mensais, no caso da IAP com base em seringueiras clonais, utilizando-se para tanto de uma área (desflorestada anteriormente) com apenas 5 ha – o extrativismo tradicional precisa de uma área média de 300 ha/colocação.
No entanto, os valores reais de uso direto atribuídos às IAPs não são suficientes para as tornarem atrativas do ponto de vista econômico, uma vez que os rendimentos proporcionados à pecuária bovina extensiva são até cinco vezes maiores que os provenientes das IAPs, baseadas em seringueiras plantadas a partir de sementes.
Nessa mesma perspectiva, o estudo de CIRAD/UNICAMP (2001), realizado também no estado do Acre, a partir da análise econômica de sete produtos[2] florestais não-madeireiros, potenciais para a região, de acordo com o governo estadual, verificou que mesmo com a exploração intensiva destes produtos os rendimentos gerados não suplantarão as rendas originárias da pecuária. Isso significa que há ainda uma maior atratividade por atividades insustentáveis para o meio ambiente, focalizadas para a obtenção de lucros no curto prazo sob a ótica privada.
Para que se possa mudar esse quadro, as decisões sobre políticas públicas que realmente possam promover as alternativas de exploração sustentável da floresta têm que focalizar não apenas os resultados econômicos sob a lógica privada, mas num valor econômico que gerem benefícios para toda a sociedade local, nacional ou global. Segundo a tabela 1, a pecuária que, por um lado gera excelentes rendimentos econômicos, por outro, causa um enorme prejuízo para a sociedade face às perdas – até mesmo irreversíveis – provocadas aos serviços do ecossistema florestal. Este fato fornece elementos suficientes para coibir a implantação de qualquer alternativa produtiva com base na pecuária extensiva ou outra qualquer atividade insustentável.
Não obstante, também não se pode apenas olhar para fluxos monetários estimados para as funções ou serviços ecossistêmicos, uma vez que, sob esse foco, o extrativismo tradicional praticado na RESEX gera imensos benefícios ambientais – externalidades positivas – para toda a sociedade, podendo ser estimados em termos de fluxos monetários. Mas, na prática não são traduzidos em rendimentos efetivos para os produtores extrativistas que continuam sua luta desesperada pela sobrevivência.
Todavia, as IAPs além promoverem a manutenção dessas externalidades – inclusive com a ampliação através do reflorestamento –, preconizam uma melhoria significativa dos rendimentos, principal gargalo para manutenção das famílias. A expressão desses atributos no valor econômico total das IAPs transforma essa alternativa produtiva de exploração da floresta numa atividade viável tanto do ponto de vista econômico quanto ambiental, superando as formas de exploração insustentáveis.
Essa superioridade somente poderá ser efetiva quando do desenvolvimento de instrumentos econômicos que possam capturar os fluxos monetários expressos pelos valores sociais das externalidades positivas geradas pela adoção de explorações sustentáveis da floresta. Nessa direção, é importante também, a consecução de uma escala adequada de competitividade com as explorações não-sustentáveis, como a pecuária extensiva, visto que muitas daquelas são alternativas pontuais e limitadas (Margulis, 2003). Claro que, observando-se os próprios limites ambientais.
Portanto, um mecanismo que pode capturar os fluxos monetários das externalidades positivas ambientais é a certificação ambiental, constituindo-se num sobre-preço oriundo da certificação da eficiência sócio-ambiental, mediante aplicação de um selo verde, considerado um prêmio pago pelos consumidores, dispostos a pagarem por produtos sócio-econômicos e ambientalmente corretos.
Entretanto, como esse mecanismo é recente e carece de evidências concretas, necessita-se de mais estudos para avaliar seus possíveis impactos sócio-econômicos e ambientais, principalmente em virtude do fato de que as comunidades florestais das RESEX já utilizam a certificação ambiental como estratégia para a manutenção das famílias e da própria floresta amazônica.
[1] Sobre esse assunto ver também Bamford et al. (2002).
[2] Os produtos são: Açaí, Buriti, Patauá, Andiroba, Copaíba, Murmurú e Unha de Gato.
..........................................................................
Clique aqui para ler a Parte 1 deste artigo.
..........................................................................
(*)Texto extraído do Capítulo 1 da tese de Doutorado “Certificação Ambiental: Uma Estratégia para a Conservação da Floresta Amazônica”, defendida pelo autor na Unicamp em 2007.
(**) Doutor em Economia pela Universidade Estadual de Campinas e Coordenador do Projeto Análise Econômica dos Sistemas Básicos de Produção Familiar Rural do Estado do Acre (ASPF) do Departamento de Economia da UFAC. E-mail: rcgmaciel@bol.com.br.
Crédito das imagens: Itaúba (E. Ferreira). Demais imagens: site da RESEX Cazumbá-Iracema.
0 Comments:
Postar um comentário
<< Home