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24 janeiro 2008

AMIANTO: DE MINERAL MÁGICO A VILÃO INDUSTRIAL DO SÉCULO 20

Catarina Chagas e Fernanda Marques
Agência Fiocruz de Notícias

Uma empresa de mineração explorava amianto em um pequeno município ao sudoeste da Bahia. Na década de 60, quando outra e mais produtiva mina foi descoberta em Goiás, a empresa mudou de estado. Sem saber do risco, ao longo das décadas seguintes, a população do município baiano retirou as pedras da antiga mina e usou-as para construir casas e pavimentar ruas. Como resultado, uma cidade totalmente exposta ao amianto – fibra de origem mineral usada pelo homem desde a Antigüidade, quando era misturada ao barro para a fabricação de utensílios domésticos, e hoje reconhecida como grande vilão da saúde.

Essa é a história de Bom Jesus da Serra, revelada em 2007 pelo médico Hermano Castro, do Centro de Estudos da Saúde do Trabalhador e Ecologia Humana (Cesteh) da Fiocruz. Relatório sobre o caso foi encaminhado pelo pesquisador ao Ministério Público da Bahia. “Uma das primeiras providências já tomadas foi isolar a região da antiga mina, para evitar que a população continue retirando o material”, diz Castro, que aguarda, agora, um contato da Secretaria da Saúde da Bahia.

Segundo pesquisa do Cesteh, os mais afetados pelo amianto são os operários das minas e das indústrias têxtil e de fibrocimento – material usado para produzir telhas e caixas d’água. Desde 1996, os pesquisadores da Fiocruz acompanham cerca de 300 trabalhadores dessas indústrias, dos quais pelo menos 40 já foram diagnosticados com asbestose, fibrose pulmonar progressiva causada pelo amianto. Quanto à mortalidade, o estudo apresenta dez óbitos de trabalhadores, cujas causas foram asbestose, câncer de pulmão e mesotelioma de pleura. O mesotelioma é um tipo de câncer que atinge a pleura, membrana que reveste o pulmão; o pericárdio, que recobre o coração; e o peritônio, que forra a cavidade abdominal. Após o aparecimento da doença, a sobrevida fica em torno de apenas dois a três anos.

A mortalidade por esta doença no Brasil foi alvo de uma pesquisa inédita conduzida pelo Cesteh com financiamento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). O trabalho – já submetido à publicação em revista científica – mostrou que, de 1980 a 2003, mais de 2.400 pessoas morreram em decorrência do mesotelioma, câncer quase exclusivamente causado pela exposição ao amianto.

Ao longo dos 23 anos estudados, a mortalidade por mesotelioma foi crescente: houve 50 óbitos em 1980, contra 179 em 2003 – e os números podem estar subestimados, principalmente devido à dificuldade de diagnóstico. O maior número de mortes foi registrado nas regiões Sul e Sudeste. São Paulo e Rio de Janeiro foram os estados com mais óbitos no período estudado: 691 e 422, respectivamente. “Isso já era previsto, devido à concentração populacional nessas regiões. Um dado inesperado foi que 46,2% das mortes ocorreram em mulheres, proporção elevada em comparação a outros países”, conta o médico Francisco Pedra, um dos responsáveis pela pesquisa. “Uma possível explicação seriam atividades como a indústria têxtil, em que a força de trabalho feminina é muito numerosa no Brasil”.