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06 novembro 2016

A PRESENÇA DO BAMBU AFETA O POTENCIAL DE USO DE ESPÉCIES ‘NÃO MADEIREIRAS’ EXISTENTES NAS FLORESTAS ACREANAS?

Evandro Ferreira
Blog Ambiente Acreano

No Acre estima-se que 59% da cobertura vegetal apresentam o bambu (Guadua spp.) como o elemento principal ou secundário do subosque das florestas nativas. No sudoeste da Amazônia, no Brasil (Acre e Amazonas), Peru e Bolívia, florestas com bambu (dominante ou não) ocupam 161.500 km². 

A longevidade do bambu nas florestas é estimada entre 27 e 28 anos e a extensão média de cada bambuzal é de 330 km², mas alguns podem chegar a 2.750 km². A floração e a frutificação do bambu acontecem uma única vez no seu ciclo de vida e depois disso os bambuzais morrem.

As principais espécies de bambu encontradas em nossas florestas são Guadua sarcocarpa e G. weberbaueri. Ambas são rizomatosas, lenhosas e de hábito arborescente que podem atingir 20 m de altura. Seus colmos, de início eretos, apoiam-se em árvores escoras para chegar ao dossel florestal. Entretanto, o desenvolvimento simultâneo de muitos colmos pode causar o tombamento das árvores escora e resultar na abertura de clareiras sobre as quais os colmos maiores, agora sem suporte, caem e formam uma massa que bloqueia a passagem da luz e suprime o crescimento de outras árvores. A clareira aberta é então rapidamente ocupada por colmos novos de bambu. 

Esse ciclo quase perpétuo de distúrbios no dossel florestal é uma das estratégias que os bambus do sudoeste da Amazônia utilizam para ocupar de forma perene extensas áreas florestais na região. Além disso, essa perenidade é favorecida pela abertura de pequenas clareiras, decorrentes da queda natural de árvores e da exploração madeireira, ou de áreas maiores, abertas por tempestades de ventos intensas (até 140 km/h) que podem provocar a morte de até 500 milhões de árvores.

Nas florestas dominadas pelo bambu ocorre uma alteração na estrutura florestal, especialmente nos estratos intermediários e no dossel. Além disso, essas florestas apresentam menor densidade de árvores, com redução na área basal da floresta entre 30 e 50%. Isso também provoca redução de 29 a 39% da biomassa aérea da floresta, e de 30 e 50% do potencial de armazenamento de carbono. 

A presença do bambu pode afetar o influxo de outras espécies arbóreas e enfraquecer a habilidade competitiva daquelas com baixa capacidade de adaptação. A alteração na composição florística pode reduzir em quase 40% o número de espécies e reduzir a diversidade florística a ponto de as florestas com bambu serem considerada uma das formações florestais menos diversas nos trópicos.

Apesar de as florestas com bambu existentes no Acre apresentarem menores volumes exploráveis de madeira e a sustentabilidade ambiental dessa exploração ser questionável, o desenvolvimento de planos de exploração manejada nas mesmas não é raro. 

Uma avaliação da sustentabilidade da exploração madeireira manejada em floresta com bambu no Acre verificou a ocorrência inicial de um rápido incremento da biomassa aérea logo após a extração e um crescimento lento das espécies comerciais exploradas. Os autores do estudo concluíram que a sustentabilidade da exploração só seria possível combinando ciclos de corte mais curtos e em menor intensidade, e rotação das espécies exploradas em cada ciclo. 

A exploração manejada de madeira em florestas com bambu no sudoeste da Amazônia enfrenta dois grandes desafios: (i) a falta de regenerações mais desenvolvidas das espécies a serem exploradas no futuro em razão da competição do bambu, e (ii) a baixa densidade de árvores com diâmetro apropriado para a exploração atual. Embora esses fatores limitem a exploração futura dessas florestas, o rápido retorno financeiro resultante da venda da madeira parece ser determinante para a exploração das florestas com bambu na região, especialmente entre proprietários de pequenas áreas.

Diante desses desafios, e considerando que a exploração visando unicamente a retirada da madeira de florestas com bambu não parece ser sustentável se realizada convencionalmente, é importante incentivar a realização de um manejo florestal integrado de recursos madeireiros e não madeireiros.

Pesquisadores observaram, em estudo realizado no Projeto de Assentamento Agroextrativista Porto Dias, na região nordeste do estado do Acre, que florestas com bambu apresentam grande diversidade de produtos florestais não madeireiros, muito dos quais são utilizados pelos assentados que ali vivem, com destaque para a Seringueira (Hevea brasiliensis), Castanha do Brasil (Bertholletia excelsa), Cacau (Theobroma cacao) e açai (Euterpe precatoria). 

O estudo citado, entretanto, não avaliou de que forma a presença do bambu impacta a ocorrência espontânea na floresta dessas e de outras espécies não madeireiras. Essa informação é importante por que a exploração econômica dessas espécies muitas vezes depende de sua ocorrência agrupada e em alta densidade na floresta, da existência de técnicas e equipamentos adequados para a exploração e processamento preliminar na floresta, e de formas viáveis de escoamento da produção.

Portanto, conhecer o impacto da presença do bambu sobre a ocorrência de espécies arbóreas com potencial de uso não madeireiro é importante não apenas para determinar a viabilidade da exploração econômica dessas espécies em conjunto com a retirada da madeira, mas também para saber se a ocorrência de algumas delas é sendo favorecida ou não pela presença do bambu. 

Essa descoberta pode conferir um potencial de exploração não madeireiro que na atualidade parece não estar associado às florestas com bambu de nossa região. E isso é muito importante para evitar a destruição dessas florestas depois que as mesmas ficam desprovidas de seus recursos madeireiros. Especialmente as áreas particulares que não fazem parte de APPs (Área de Proteção Permanente) ou de Reservas Legais. Sem representar atrativo econômico para seus proprietários e desprovidas de proteção legal, elas são candidatas de primeira hora para rápida conversão em áreas para o desenvolvimento de atividades econômicas mais rentáveis.

Você leitor quer ajudar a conservar as nossas florestas? Então consuma mais produtos oriundos das mesmas! A lista é extensa e a maioria precisa ser valorada pelo mercado consumidor: sementes, artesanatos, remédios caseiros, plantas ornamentais, frutos, cipós, fibras... Fazendo isso você ajuda a conferir não apenas valor econômico às florestas, mesmo aquelas nas quais a madeira já foi retirada.