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13 julho 2006

ALIOMAR: UM MADEIREIRO RONDONIENSE NO ACRE

Em junho passado, antes da operação "Desempate" desencandeada pelo IBAMA e a Polícia Federal que resultou na prisão de dezenas de pessoas envolvidas com a exploração de madeira no Acre e em Rondônia, tive a oportunidade de realizar uma capacitação para mateiros no Projeto Agroextrativista "Chico Mendes", também conhecido como Seringal Cachoeira, nas cercanias da cidade de Xapuri. A comunidade, que está iniciando o trabalho de exploração sustentável de madeira, tinha interesse em noções básicas sobre a identificação de espécies madeireiras, incluindo a correta aplicação de nomes de famílias botânicas e nomes científicos.

Dos cerca de 20 participantes um me chamou especial atenção. Ele estava lá em razão de sua extensa trajetória no ramo de exploração madeireira, era talvez o que tinha mais "bagagem". Era também o único participante vindo da área urbana e, mais importante, tinha acabado de chegar de Rondônia. Seu nome é Aliomar e veio para o Acre em busca de oportunidades no ramo madeireiro. Em Rondônia ele já fez de tudo um pouco: foi empregado de serraria, dirigiu caminhão toreiro, foi dono de serraria.

Durante a capacitação eu tive a curiosidade de perguntar ao mesmo como eram as coisas em Rondônia. Segundo ele, lá é a terra sem lei. Plano de manejo serve só para encobrir as ilegalidades cometidas pelos madeireiros. A relação IBAMA x Madeireiro é comparável ao jogo de vida e morte praticado pelos gatos e ratos.

- Madeira que compense hoje em Rondônia só se for retirada das áreas de Reservas, ou seja, os Parques Federais e Estaduais, e as Reservas Extrativistas e outros projetos de exploração do gênero. Na maioria das vezes a lei não permite tirar madeira destes lugares...

Segundo ele, a tendência do setor madeireiro em Rondônia é desaparecer no médio prazo.

- A coisa só está andando porque o pessoal dá um jeito de pegar madeira das reservas, ou os donos das terras nestas reservas as vendem de forma ilegal, diz Aliomar. A perseguição do IBAMA é muito forte. Além deles, ainda tem a polícia civil, a militar, a rodoviária federal, haja dinheiro para fazer a coisa andar...

Ele ficou impressionado enquanto caminhava dentro do Seringal Cachoeira. Viu vários pés de Ipê, Angelim, Cumaru-ferro, Samaúma, todas árvores em ponto de corte, e, melhor, localizadas na margem dos ramais. Como ele mesmo disse, "estavam dando sopa"! Segundo ele, em Rondônia isso não acontece mais. Quando tinha, os toreiros e madeireiros, ao avistarem árvores na beira ou nas proximidades das estradas, voltavam a noite para "buscar" o produto.

- Lá a coisa não é fácil. Quanto tem árvore de madeira assim na beira da estrada dá muito conflito e o dono da área se vê obrigado a abater ele mesmo a árvore antes que venha outro e "leve".

Perguntei sobre a ação do IBAMA. Ele diz que realmente eles são um "saco", pois fazem muitas exigências. Entretanto, alertou que quando alguem consegue uma ATPF, dá para passar várias cargas de madeira. É só ter a sorte do IBAMA não pegar o caminhão nas primeiras viagens:

- Dá para levar várias cargas de espécies madeireiras com características similares pois os fiscais do IBAMA não conseguem distinguir as toras de espécies mais raras.

Perguntei sobre o manejo sustentado da madeira e os planos de exploração praticados por lá. Segundo ele, na maioria dos projetos já foi feito o primeiro corte, o segundo e em alguns casos, o terceiro. Ele testemunhou um caso em que o madeireiro levou até Embaúba (espécie de Cecropiaceae), que, segundo ele, não tem valor comercial que ele conheça.

A opinião dele sobre os tais planos de manejo:

- Não vão fazer diferença, mas é um mal necessário porque tá na lei. Ninguem vai comprar terra e tirar apenas as árvores uma única vez. Vão tirar tudo, limpar mesmo! Senão como vão pagar as despesas? De uma forma ou de outra, a madeira que for deixada para trás por planos de exploração madeireira vai ser retirada, legal ou ilegalmente. Foi assim em Rondônia e vai ser assim no Acre!

Aliomar é, provavelmente, mais um dos muitos madeireiros rondonienses que resolveram tentar a sorte no Acre. Aqui eles não vão encontrar as mesmas facilidades que tinham por lá. Abrir uma serraria por aqui é muito complicado, aliás, está proibido. Neste aspecto dá para ficar tranquilo pois não vai acontecer uma corrida à madeira acreana. Pelo menos enquanto o comando político do Estado continuar nas mãos do atual grupo que governa o estado.

Não ocorrendo esta corrida, que tipo de contribuição pessoas como Aliomar poderiam dar ao setor madeireiro do Acre? Aumentar a diversidade de espécies madeireiras exploradas. No momento, se estima que cerca de 20 espécies são exploradas de forma mais ou menos intensiva. Aliomar afirmou que em Rondônia este número já passa de 50. Segundo ele, na medida que o estoque das espécies mais procuradas ia acabando, os madeireiros tinham que tentar outras espécies deixadas para trás pelos pioneiros do garimpo de madeira praticado por lá a partir da ocupação daquele Estado em meados da década de 80.

Alias, foi interessante ver Aliomar entrar na floresta e ouvir os mateiros acreanos dar nomes para espécies madeireiras que ele conhecia por outros nomes: segundo ele era como estar em um outro país. Aliomar conhece muito os "tipos" de madeira, suas principais utilidades, dificuldades para cortar a madeira na motosserra e na serraria. Apesar de tudo isso, como mateiro, seu conhecimento de nomes populares das espécies madeireiras existentes nas florestas acreanas é praticamente inútil. É que os compradores locais não iriam reconhecer os nomes dados por Aliomar.

Para quem cresceu em Santa Catarina, prosperou e foi a falência em Rondônia, a aposta no Acre, a última fronteira madeireira da amazônia, parece ser um pouco arriscada. Parece que ele não tem outra opção.

Seja bem vindo Aliomar! E boa sorte!