Google
Na Web No BLOG AMBIENTE ACREANO

19 maio 2020

NEM A PANDEMIA DE CORONAVÍRUS FREIA A DESTRUIÇÃO DA FLORESTA AMAZÔNICA

Evandro Ferreira
Editor do Blog ambiente Acreano

O advento da pandemia de coronavírus no Brasil trouxe uma crise socioeconômica de proporções nunca vistas.

O país praticamente parou em função das medidas sanitárias adotadas para minorar o alcance do vírus e aliviar uma pressão que, de outra forma, se revelaria insuportável para o nosso precário sistema de saúde.

Apesar desse panorama extremamente sombrio, algo peculiar tem me chamado a atenção: a destruição da floresta amazônica não foi, aparentemente, afetada pela pandemia de coronavírus.

Os alertas de desmatamento (DETER) do Instituto Nacional de Estudos Espaciais (INPE) indicam alta de 64% no corte raso da floresta em abril de 2020 (405,61 km²) frente a abril de 2019 (249,39 km²).

Além do aumento no desmatamento, os dados do INPE sugerem que a pandemia de coronavírus não afetou o ímpeto dos destruidores de nossas florestas.

De janeiro a abril de 2020 verificou-se aumento de 55% das áreas desmatadas comparado igual período de 2019. Com um agravante: em 2019 a aceleração no desmatamento aconteceu em maio. Em 2020 foi em abril, um mês antes.

Para calcular o desmatamento anual, o INPE considera o período de agosto do ano anterior e julho do ano atual. Comparando os dados de agosto de 2018-abril de 2019 (2.914 km²) e agosto de 2019-abril de 2020 (5.666 km²), verificou-se aumento de 94% no desmatamento.

Vejam que para fechar a estimativa anual, ainda faltam os dados dos meses de maio, junho e julho. São meses secos na parte ocidental da Amazônia, extremamente favoráveis para quem pretende desmatar a floresta.

Com base nisso, é fácil prever que 2020 será um ano de desmatamento “escandaloso” na Amazônia.

Para adiantar esse contexto, fizemos o seguinte questionamento:

- Qual será a área estimada de desmatamento pelo sistema DETER/INPE para o período de agosto de 2019 a julho de 2020?

Obviamente que para responder a essa pergunta, precisaremos estimar quantos km² de florestas ainda serão derrubados nos próximos meses de maio, junho e julho desse ano.

Vamos fazer isso de forma conservadora a seguir. Mas precisamos aceitar duas pré-condições:

(a) A pandemia de coronavírus não está afetando o trabalho dos destruidores da floresta amazônica, como mostra o incremento de 94% nos alertas de desmatamento observados até abril de 2020; e

(b) Devemos admitir que a área de floresta a ser derrubada no período maio-julho de 2020 deverá ser equivalente à que foi derrubada no mesmo período em 2019 (Maio: 1.102,57 km², Junho: 2.072,03 km², e Julho: 2.254,8 km²), ou seja: 5.443,9 km².

Dessa forma, quando somamos o dado real dos alertas de desmatamento observados entre agosto de 2019 e abril de 2020 (5.666 km²), com os alertadas de desmatamentos realizados no trimestre maio-julho de 2019 (5.443,9 km².), teremos um valor de aproximadamente 11 mil km².

Considerando que entre 2018-2019 os alertas de desmatamento somaram 6.840 km², se a estimativa de 11 mil km² para o período 2019-2020 se confirmar, teremos um incremento anual de cerca de 60%.

Apesar de elevado, esse incremento ainda é inferior aos 88% de aumento nos alertas de desmatamento emitidos pelo mesmo sistema DETER/INPE entre 2017-2018 e 2018-2019.

Infelizmente, essa possível diminuição no percentual de alertas de desmatamento não significará que o Brasil ficará livre das críticas mundiais no que toca à crescente destruição da Amazônia.

Ocorre que os dados do sistema DETER não são os que o INPE usa para fazer a "estimativa real” de desmatamento anual da Amazônia. Para isso, usam-se dados do sistema PRODES, mais criterioso e que toma mais tempo para ser calculado. Tanto que tradicionalmente só é publicado por volta de novembro de cada ano.

Nos últimos anos, as comparações entre os resultados anualizados dos alertas de desmatamento do DETER e de desmatamento do PRODES, tem mostrado que este último tem sido quase sempre 40% superior ao primeiro.

Assim, uma matemática simples, acrescentando 40% aos 11 mil km² de desmatamento que acreditamos será estimada pelo DETER para o período 2019-2020, poderemos prever que o "desmatamento real" na Amazônia entre 2019 e 2020 será de aproximadamente 15 mil km².

Se isso for confirmado, o incremento entre 2018-2019 e 2019-2020 girará em torno de 54%. Bem superior, portanto, aos 29,5% de aumento verificado entre os períodos 2017-2018 e 2018-2019.

Assim, quando da divulgação do desmatamento na Amazônia em meados de novembro de 2020, é certo que o mundo vai “desabar sobre o Brasil”.

Será um escândalo internacional de proporções grandiosas, pois a devastação na Amazônia brasileira terá regredido aos níveis verificados 14 anos atrás: em 2006 o desmatamento na região tinha atingido 14,1 mil km².

Por conta da pandemia e de sinais equivocados emitidos de forma reiterada por nossas autoridades ambientais, que parecem querer desestimular as ações de fiscalização e controle, receio que mesmo faltando mais de 70 dias para o “fechamento” do ano no que toca ao desmatamento, não teremos tempo para impedir que esse desastre se concretize.

Para saber mais:

·        Alertas de desmatamento na Amazônia crescem 63,75% em abril, mostram dados do Inpe. G1, 8/5/20.

·        DETER registra na Amazônia em maio 1.102,57 km² de alertas. Notícias INPE, 10/6/19.

·        Alertas do DETER na Amazônia em junho somam 2.072,03 km². Notícias INPE, 4/7/19.

·        Área da Amazônia com alerta de desmatamento sobe 278% em julho, comparada ao mesmo mês de 2018. G1, 7/8/19.

·        Desmatamento na Amazônia cresce quase 30% entre agosto de 2018 e julho de 2019, diz Inpe. G1, 18/11/19.