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31 maio 2006

HISTÓRIA DO ACRE: EVOLUÇÃO DA QUESTÃO INDÍGENA

DOS PRIMEIROS CONTATOS COM OS BRANCOS ATÉ A CRIAÇÃO E AFIRMAÇÃO DO MOVIMENTO INDÍGENA CONTEMPORÂNEO (1)

A História oculta da Floresta: Imaginário, conquista e povos indígenas no Acre

Parte 1 (6)

Por José Pimenta, Doutor em antropologia pela Universidade de Brasília, Professor do Departamento de Antropologia da UNB.

À semelhança do Brasil, o Acre compõe-se de uma grande diversidade de povos indígenas cujas situações frente à sociedade nacional também são muito variadas. Enquanto a grande maioria dos grupos se encontrarem em contato permanente ou regular com a população regional (mestiça ou branca), alguns ainda são classificados como “isolados” pelo ór gão indigenista.

Segundo Valle de Aquino e Iglesias (2000: 565), o Acre contaria com doze grupos indígenas identificados que representariam um total de cerca de 9 300 índios, ou seja, 1,4 % da população do Estado (2). A maior parte desse contingente é compos ta pelos Kaxinawá que representam cerca da metade da população indígena acreana, os outros grupos tendo geralmente uma população inferior a mil indivíduos cada um. As sociedades indígenas acreanas dividem-se de maneira desigual em duas grandes famílias lingüísticas: Pano e Arawak. Alguns desses povos encontramse também nas regiões peruanas e bolivianas fronteiriças ao Acre. Do ponto de vista da antropologia, o conhecimento sobre as sociedades indígenas do Estado é muito desigual. Se alguns povos, como os Kaxinawá ou os Ashaninka, atrairam o interesse de vários pesquisadores, as informações etnográficas disponiveis sobre a maior parte dos povos indígenas acreanos ainda são muito incipientes (3).

Os povos indígenas ocuparam um lugar marginal na histografia do Acre. Como no resto da Amazônia, o imaginário ocidental sobre a natureza e a alteridade humana projetou seus fantasmas na região acreana e nos seus primeiros habitantes indígenas. A “conquista do deserto ocidental” (Costa [1973] 1998) e a incorporação do Acre à nação revelam alguns mitos fundadores do pensamento ocidental e brasileiro sobre a Amazônia e os povos indígenas.

Focalizando o lugar do índio na historia acreana, este artigo mostra as mudanças ocorridas na situação das populações nativas, desde a chegada dos seringueiros nordestinos na região, na segunda metade do século XIX, até a afirmação étnico-política do movimento indígena contemporâneo.

A “invenção” do Acre como exemplo de brasilidade

A história da colonização do Acre está estreitamente ligada ao extrativismo da seringa. Até metade do século XIX, o atual Estado do Acre ainda era pouco conhecido e as populações indígenas da região viviam num relativo isolamento do mundo moderno. Organizadas em torno da coleta de drogas do sertão (cacau, salsaparrilha, etc.), as raras e tímidas penetrações brancas na região acreana durante o século XVIII não estabeleceram nenhum núcleo de povoamento.

Viajando pelas bocas dos rios Juruá e Purus no início do século XIX, os naturalistas alemães Spix e Martius ([1823-31] 1981) notaram em seus diários a presença de “índios selvagens” e a falta de “civilização” que, segundo os autores, caracterizava a região. Além da exploração da região e de suas riquezas naturais, as primeiras expedições oficiais ao Purus e ao Juruá, lideradas respectivamente por João Rodrigues Cametá e Romão José de Oliveira, em meados do século XIX, tinham como objetivo a atração e a pacificação dos índios.

Essas "entradas" permaneceram limitadas, subindo os rios apenas parcialmente, mas inauguraram uma série de explorações da região durante as décadas de 1850 e 1860. Entre essas expedições destaca-se a viagem, a mando da Royal Geographical Society de Londres, do geógrafo inglês William Chandless que subiu o Purus em 1864/65 e o Juruá em 1867. Todavia, a historiografia regional consagrou os nomes de Manoel Urbano, explorador do Purus em 1858, e João da Cunha Corrêa, que percorreu o Juruá em 1861, como os primeiros "desbravadores" e "descobridores" das terras acreanas.

A partir da década de 1870, a situação mudou paulatinamente com a chegada maciça de seringueiros de origem nordestina, vindos principalmente do Ceará. Com uma densidade elevada de hévea brasiliensis, a história do Acre foi profundamente marcada pela economia extrativista (3) da borracha. Em 1899, a região acreana produzia cerca de 60% da borracha amazonense, ou seja, mais de 12 mil toneladas (Costa [1973] 1998: 40). A ocupação da bacia do Purus, de acesso mais fácil a Manaus e Belém, precedeu de alguns anos à exploração de seringa no A lto Juruá. Segundo Oliveira (1992: 50), João Gabriel de Carvalho e Melo foi o primeiro colono a se estabelecer, em 1857, nas margens do Purus com 40 famílias e o fundador, em 1869, do primeiro seringal estável da região.

O ritmo da colonização do Acre se acelerou a partir de 1877 em conseqüência das grandes secas do Nordeste. A imigração de milhares de seringueiros, em busca de melhores condições de vida, organiza -se a partir das casas aviadoras de Manaus e Belém apoiadas pelo capital internacional e é geralmente apresentada pelos historiadores, como Euclides da Cunha ([1909] 1998: 92) ou Ferreira Reis (1931: 216), como um movimento “fortuito”, “espontâneo” e sem “iniciativa oficial”.

A chegada dos seringueiros constitui, para usar a expressão de Ricoeur (1978: 40), o “evento fundador” da história oficial acreana. O Acre nasce com os seringueiros e a epopéia da borracha. A história da região na última década do século XIX e no início do século XX é complexa e movimentada. A “conquista do deserto ocidental” é apresentada ao leitor como um exemplo de patriotismo, um ímpeto de brasilidade e de orgulho nacional. Juntos com as figuras emblemáticas de Plácido de Castro e o Barão do Rio Branco, os seringueiros nordestinos, foram os pilares da incorporação da região ao Estado-nação brasileiro. Através da análise da historiografia regional, podemos desvendar alguns mitos que participam tanto da ideologia nacional brasileira, como da “invenção da Amazônia” (Gondim 1994).

Preocupado em destacar alguns desses mitos funda dores da história oficial acreana, opto aqui por não descrever os eventos e as disputas entre o Brasil e os países fronteiriços para a demarcação das fronteiras internacionais e a incorporação do Acre ao território nacional. Os conflitos do Brasil com a Bolívia e o Peru, as insurreições dos seringueiros, a formação do Estado independente do Acre dirigido por Galvez, a epopéia militar comandada por Plácido de Castro, as negociações diplomáticas lideradas pelo Barão do Rio Branco que levaram progressivamente a definição das fronteiras atuais, são alguns dos principais marcos da fascinante história do Acre cuja exposição seria fastidiosa e ultrapassaria os limites deste artigo. Como antropólogo e não historiador, o meu interesse é discutir o lugar atribuído aos povos indígenas pela historiografia oficial da região, desvendando alguns mitos fundadores da “invenção” do Acre.

Na historiografia brasileira, a integração do Acre à nação é apresentada como um exemplo (4) de patriotismo e de nacionalismo. Apesar das diferenças de interpretações, os historiadores acreanos concentram, geralmente, suas análises em torno da participação do povo seringueiro e dos grandes heróis da conquista: Plácido de Castro e o Barão do Rio Branco.

Encarregado dos trabalhos de fixação da nova fronteira através da “Comissão mista brasileira-peruana de reconhecimento do Alto Purus”, no início do século XX, Euclides da Cunha ([1909] 1998), por exemplo, em seus escritos sobre a Amazônia, salientou a coragem e o patriotismo dos seringueiros nordestinos. Vivendo em condições sub-humanas, prisioneiros do sistema do aviamento e da hostilidade da floresta, os seringueiros são, na visão do autor, um exemplo de miscigenação e os bastidores do novo caráter nacional. Encarregados de domesticar a natureza e de integrar a Amazônia, “terra sem história”, à Pátria, os anônimos seringueiros concentram as virtudes do povo brasileiro e expressam através de uma luta cotidiana os grandes desafios da nação.

A utilização do patriotismo e do nacionalismo aparece também na construção mítica dos heróis da história do Acre. À imagem da República que elegeu Tiradentes como símbolo nacional brasileiro (Carvalho 1990), a epopéia acreana construiu seus venerandos heróis: Plácido de Castro e o Barão do Rio Branco.

Clique aqui para ler a parte 2

Notas:
(1) Artigo publicado na Revista Linguagens Amazônicas, n°2, pp. 27-44, 2003.
(2) Esses dados, procedentes da Comissão Pró-Índio do Acre (CPI- Acre), são geralmente os mais citados, mas não incorporam os índios vivendo nas cidades e devem ser considerados com os devidos cuidados.
(3) Existem várias etnografias sobre os Kaxinawá e os Ashaninka que foram estudados tanto do lado brasileiro como peruano. Ver, por exemplo, os trabalhos realizados no Acre por Valle de Aquino (1977), Iglesias (1994), Lagrou(1998) com os Kaxinawá e Mendes (1991), Ioris (1996) e Pimenta (2002) com os Ashaninka. Para uma apresentação geral dos povos indígenas do Estado, ver Gonçalves (1991).

HISTÓRIA DO ACRE: EVOLUÇÃO DA QUESTÃO INDÍGENA

DOS PRIMEIROS CONTATOS COM OS BRANCOS ATÉ A CRIAÇÃO E AFIRMAÇÃO DO MOVIMENTO INDÍGENA CONTEMPORÂNEO

A História oculta da Floresta: Imaginário, conquista e povos indígenas no Acre

Por: José Pimenta, Doutor em antropologia pela Universidade de Brasília, Professor do Departamento de Antropologia da UNB.

Parte 2 (6)

Ardentes de fensores das idéias positivistas, os militares tiveram um papel importante na proclamação da República no Brasil e na ocupação do território nacional. (4). Na história acreana, Plácido de Castro expressa esses valores positivistas e patrióticos do “espírito militar” que o “libertador do Acre” soube transmitir ao povo seringueiro e que foram decisivos para a incorporação da região à nação (5). Todavia, a dimensão militar nunca substituiu os esforços da diplomacia. Na versão da história oficial da conquista do Acre, o Brasil sempre valorizou uma resolução pacífica do conflito com a Bolívia e o Peru.

Nesse contexto, o Barão do Rio Branco, chefe da diplomacia brasileira, aparece como um negociador excepcional. Ao mesmo tempo defensor do Brasil e respeitoso dos países vizinhos, Rio Branco alcançou um estatuto mítico, além dos interesses egoístas que caracterizam a condição humana. Na apresentação de sua atuação, desvendam-se algumas imagens do "homem cordial", outro símbolo poderoso de brasilidade (Buarque de Holanda [1936] 1989).(6)

O patriotismo e o nacionalismo se expressaram também em vários eventos da história regional. Limito-me, aqui, apenas ao exemplo da oposição dos seringueiros acreanos à criação do Bolivian Syndicate. Última tentativa do governo boliviano para ocupar a região, a criação do Bolivian Syndicate exigiu da antiga colônia espanhola concessões enormes de soberania. Segundo os termos do contrato assinado em julho de 1901, a Bolívia oferecia à companhia internacional, composta por grandes grupos finance iros, principalmente norte-americanos, uma concessão de trinta anos para a exploração da seringa na região. O consórcio capitalista dispunha da plena autoridade sobre o comércio da borracha e de direitos políticos e judiciais essenciais. Ele usufruía do direito de compra e venda dos seringais, do direito de navegar e controlar os rios através de uma polícia própria, de estabelecer as leis e exercer a justiça, etc. Em contrapartida, a Bolívia recebia 60% da arrecadação realizada pela companhia. A criação do Bolivian Syndicate foi um dos momentos-chaves do conflito acreano, um “critical event” (Das 1996) que levou à incorporação do Acre ao Brasil. Para os seringueiros brasileiros, o Bolivian Syndicate aparecia como uma espécie de companhia colonial que controlava, não só a terra, mas toda a organização do trabalho extrativista da borracha.

Essa situação revoltou a população acreana que conseguiu superar suas divisões internas e se organizar contra o inimigo comum. O sentimento do povo acreano espalhou-se além das bacias do Purus e do Juruá e comoveu o país que deu um apoio decisivo à luta dos seringueiros. A formação do Bolivian Syndicate criou um fervor nacionalista e patriótico que cimentou a nação contra os inimigos do Brasil. Manifestações contra os americanos e bolivianos se organizaram em Manaus, Belém e Rio de Janeiro. Orgulho da Nação, a Amazônia era novamente cobiçada pelo capital estrangeiro. Depois do roubo das sementes da hévea que levará à crise da borracha amazônica a partir de 1910, a ameaça estrangeira sobre o território continuava com claras tentativas de se apropriar das riquezas do Brasil e impedir seu almejado progresso.

O clima decorrente da criação do Bolivian Syndicate motivou a decisão do Presidente Rodrigues Alves de enviar tropas do exército para o Acre. Espelho das hesitações da política oficial, as ordens dos militares brasileiros eram confusas e contraditórias: garantir a paz com os bolivianos e apoiar a luta dos seringueiros, defendendo os interesses da nação contra o imperialismo internacional. Ao mesmo tempo que causou a intervenção militar brasileira no Acre, onde se destacaram as façanhas de Plácido de Castro, a criação do Bolivian Syndicate também é usada na historiografia oficial para expressar o gênio diplomático do Barão do Rio Branco que propôs uma indenização financeira à Bolívia e aos americanos para evitar a extensão do conflito.

É interessante notar que nessa campanha nacional em defesa dos interesses da Pátria, a imprensa teve um papel essencial. Formador da opinião pública e do sentimento nacional, o “print capitalism” (Anderson 1996) contribuiu para assegurar a vitória dos seringueiros acreanos. Antes da criação do Bolivian Syndicate, a imprensa amazonense já havia atuado de maneira notável na defesa dos interesses do povo acreano, denunciando, periodicamente, a administração boliviana de Puerto Alonso e o imobilismo do governo federal brasileiro, acusado de abandonar seus cidadãos. Essa atitude da imprensa amazonense manifestava claramente os interesses econômicos envolvidos no controle da região.

Com a constituição do Bolivian Syndicate, o ardor patriótico dos jornais de Belém e Manaus se multiplicou e os artigos publicados pela imprensa amazonense foram reutilizados por outros diários nacionais, espalhando a indignação por todo o país e fazendo do conflito acreano uma questão de honra nacional. O “amazonismo” ou o lugar dos povos indígenas na historiografia acreana Além de reproduzir e participar da construção dos sentimentos patrióticos e nacionalistas que permitiram a “invenção do Acre” e sua incorporação ao Brasil, a historiografia oficial veiculou e continua veiculando vários mitos sobre a região amazônica e seus primeiros habitantes.

A natureza e os povos indígenas que a habitam continuam servindo de palco de projeção para os mitos ocidentais sobre a Amazônia e sua alteridade humana. Esses mitos são bem conhecidos na literatura antropológica e foram sistematizados no trabalho de Gondim (1994). O objetivo, aqui, não é detalhar a concepção ocidental sobre a Amazônia e as populações indígenas, mas apenas expor algumas de suas características, mostrando como elas aparecem na história regional e nos ajudam a pensar o lugar atribuído aos povos indígenas pela historiografia (7) acreana.

Como o “orientalismo” de Said (1996), poderíamos definir o “amazonismo” como um conjunto de idéias e de discursos, produzidos pelo imaginário ocidental sobre a Amazônia e as populações nativas, destinado a viabilizar seus interesses políticos e econômicos. Como espaço imaginado pelo Ocidente, o “amazonismo” partilha muitas características com o “orientalismo”. Todavia, enquanto Said nos apresenta um Oriente construído de maneira negativa por um Ocidente hegemônico, o “amazonismo” constitui um campo ambíguo, catalisador de imagens e de discursos contraditórios, que podem ser mobilizados para servir interesses muito divergentes. A concepção ocidental da alteridade enraíza-se na Grécia Antiga, momento onde se estabeleceu uma dicotomia inicial entre o “civilizado” e o “bárbaro” que serviu de modelo para a apreensão do “Outro” nos séculos seguintes.

Primeiras testemunhas da Amazônia e de seus habitantes, os relatos de Carvajal ([1542] 1941) e de Acuña ([1641] 1941) combinaram o fantástico e o exótico e edificaram as bases do “amazonismo”: mito das Amazonas, inferno verde, Eldorado, seres canibais, nobre selvagem, etc. A Amazônia e seus primeiros habitantes concentraram e continuam concentrando todos os sentimentos e as fantasias ocidentais. 8 Símbolo de riqueza e miséria, de medo e esperanças, de sonhos e pesadelos, de futuro e passado, de inferno e paraíso, a alteridade é o espelho invertido do Ocidente e é manipulada conforme os interesses em jogo. Essas imagens contraditórias acompanharam e informaram a conquista da América e o encontro com as populações indígenas. Além de legitimarem a ocupação e exploração econômica, os mitos também serviram a sustentar os interesses políticos e ideológicos da Europa (9).

Notas:
(4) Cabe notar que a criação do Serviço de Proteção aos Índios (SPI) em 1910, dirigido pelo Marechal Rondon, apresentado pela a historiografia militar como “o civilizador da última fronteira” (Coutinho 1975), integrava o projeto positivista de ocupação territorial e de construção de uma identidade nacional (Souza Lima 1995; Ramos 1998).
(5) Os historiadores são unânimes em elogiar a atuação de Plácido de Castro no conflito. Para uma perspectiva histórica centrada sobre o chefe militar, ver Goycochêa (1973) e Araújo Lima ([1973] 1998).
(6) Sobre esse tema, alguns comentadores do Tratado de Petrópolis, como Ricardo (1954), insistiram em apresentar oacordo como um favor concedido aos bolivianos pelo generoso chefe da diplomacia brasileira. Além de incorporar osestereótipos associados ao “homem cordial”, essa apresentação do Brasil como defensor dos interesses da Bolívia, edo subcontinente em geral, contra o imperialismo americano e europeu, é também uma clara demonstração dopaternalismo brasileiro em relação aos outros países latino-americanos.
(7) Ver por exemplo Bartra (1994) e Woortmann (1997b)
(8) O caso dos índios Yanomami talvez seja o mais ilustrativo. O discurso exotizante construído sobre esse povo indígena percorre os séculos e é um exemp lo revelador das contradições e ambigüidades do imaginário ocidental sobre a alteridade (Smiljanic 1995).
(9) Melo Franco ([1937] 1976) lembra, por exemplo, o uso das imagens do “Nobre Selvagem” por alguns filósofoscomo Montaigne ou Rousseau para caracterizar uma sociedade mais justa e o novo ideal da Revolução Francesa.


**Artigo continua em

29 maio 2006

INCÊNDIOS FLORESTAIS NO ACRE: SITUAÇÃO EM RIO BRANCO

MAIS DE 70.000 HECTARES DE FLORESTAS QUEIMADAS!

Uma parceria entre a UFAC, FUNTAC, IMAC, INPE e University of Maryland (EUA) está concluindo o mapeamento da região leste do Acre usando imagens de satélite (MODIS, Landsat, CBERS) para medir a extensão das áreas queimadas, ou seja, tanto as áreas abertas como as florestas com copas afetadas.

Segundo o Dr. Foster Brown (SETEM-PZ-UFAC), o mapeamento é preliminar porque em muitas áreas os incêndios que afetaram apenas o sub bosque das florestas não aparecem nas imagens.

No decorrer do mapeamento, a equipe estimou que no município de Rio Branco (mostrado na imagem ao lado), mais de 71.000 hectares de florestas nativas foram afetadas pelos incêndios que ocorreram entre agosto e outubro de 2005. É importante ressaltar que a validação das estimativas feitas a partir das imagens de satélite são extremamente difíceis e custosas. Muitas áreas são isoladas, longe de acessos convencionais (rios, estradas, caminhos na floresta), e demandariam dias de viagem para serem atingidas.

Antevendo este problema, a equipe do SETEM-PZ-UFAC fez mais de 800 imagens aéreas de diferentes pontos afetados pelo fogo. A maioria delas já está disponibilizada na página do Grupo de Pesquisa e Trabalho sobre Queimadas (GTP Queimadas). Cada uma delas foi editada, sendo adicionadas informações relativas a: data e hora do sobrevôo, número e autor da foto, ponto e categoria de dano (queimada, derrubada, pasto, floresta queimada, etc), coordenadas geográficas, orientação do sobrevôo e autor da edição. As fotos podem ser acessadas livremente pelos interessados. Clique aqui para ir para a página do GTP Queimadas. Você vai precisar se registrar para acessar as imagens.

A foto acima mostra a gênese da maioria dos incêndios florestais: primeiro o agricultor-fazendeiro queimou (como sempre tem feito anualmente) uma pequena área de floresta derrubada, ou um pasto antigo (visando a sua renovação). Como o ano foi muito seco, o fogo ficou fora de controle e adentrou na floresta adjacente e outras áreas nas quais os produtores rurais não esperavam que ele chegassem (pastos novos, plantios de fruteiras, mandioca, etc).

Em outros casos (imagem acima), a floresta queimou em lugares isolados, sendo o fogo iniciado por fagulhas carregadas pelo vento ou pelas altas temperaturas - combinada com o solo e serrapilheira extremamente secos na época.

INCÊNDIOS FLORESTAIS NO ACRE: SITUAÇÃO EM SENA MADUREIRA

A pesquisadora Joventina Nakamura, pesquisadora do Laboratório de Sensoriamento Remoto da Fundação de Tecnologia do Acre-FUNTAC, realizou estudo preliminar para estimar a extensão de florestas nativas que foram afetadas pelo fogo no ano passado. Usando o programa ArcGis nas cenas 002_066 e 002_067 do Landsat5/TM do dia 13/10/05, ela estima que mais de 23.000 hectares de florestas foram afetadas. Vejam a imagem acima: as áreas em verde são de florestas nativas intactas. As áreas avermelhadas são áreas abertas (pastagens, campos agrícolas) onde a floresta foi destruída anteriormente. As áreas de cor verde escuro circundadas com linhas amarelas são aquelas de florestas afetadas.

O termo afetada pelo fogo significa que o fogo penetrou na floresta nativa intacta, destruiu o sub bosque e afetou a copa das árvores de médio e grande porte. Neste caso, as altas temperaturas causaram a queda das folhas. Embora não se tenha uma estimativa sobre o percentual de árvores mortas, se estima que a maioria das árvores tiveram impacto fisiológico grave em razão da perda de suas copas em período extremamente seco. Muitas morreram como resultado direto das altas temperaturas. Outras em função da incapacidade de recuperar a folhagem.

27 maio 2006

FÁBRICA DE CAMISINHAS EM XAPURI

A nota abaixo é realmente animadora. Fala da iminente inauguração da fábrica de camisinhas na cidade de Xapuri. Ela vai gerar empregos na área urbana e reerguer o extrativismo via coleta de látex de seringueira. Tudo muito bom. Leiam a nota e depois o post "Fábrica de Camisinhas em Xapuri 2" para saber o lado - potencialmente - ruim do empreendimento.

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Primeira fábrica mundial de camisinha a usar látex nativo começa atividade em junho

Ana Paula Marra, Repórter da Agência Brasil

Brasília - A primeira fábrica de preservativos do mundo a usar o látex de seringal nativo como matéria-prima começa a processar o produto – colhido por 550 famílias - no final do próximo mês.

A expectativa é de que a fábrica, localizada em Xapuri, no Acre, comece a produzir de forma experimental o preservativo até dezembro deste ano, no máximo, segundo informou a Assessoria de Imprensa do Ministério da Saúde.

O beneficiamento consiste em misturar o látex líquido in natura à amônia. Depois de centrifugado, o produto final pode ser armazenado durante um período de 12 meses.

Segundo o Ministério da Saúde, com o início do funcionamento da fábrica - a primeira do Brasil -a meta é fabricar cerca de 100 milhões de preservativos masculinos por ano. A iniciativa vai gerar cerca de 600 empregos diretos e indiretos.

A diretora do Programa Nacional de DST e Aids do Ministério da Saúde, Mariângela Simão, visitou nesta semana o local onde o látex é armazenado e a centrífuga de processamento, em Xapuri.

Segundo ela, o objetivo da fábrica - construída em parceria do governo federal com o governo do Acre - é viabilizar a economia extrativista da borracha e ampliar a distribuição gratuita de camisinhas na rede de serviços públicos de saúde.

Em 1997, o Brasil deu início à distribuição gratuita de preservativos masculinos, com a entrega de 13,4 milhões de unidades, conforme informou o ministério. Para 2006, a meta elevar a distribuição para 1 bilhão de unidades em todo o país.
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COMENTÁRIOS DE ROBERTO FERES:

Oi Evandro,

O texto que enviei ao Grupo é de um estudo do Ministério do Trabalho www.fundacentro.gov.br/CTN/nota_tec_AMONIA.pdfe demonstra a preocupação de especialistas com o produto. No caso do látex nativo, o tratamento com Amônia terá que ser feito pelo seringueiro ainda durante o processo de sanguia das árvores.

Creio que a técnica desenvolvida pelo Samonek pode substituir a Amônia, já que sua ação é basicamente para manter o pH da seiva elevado.

Sugiro que o PZ/UTAL chame o Samonek e o quimico responsável pela fábrica para uma conversa preliminar e se proponha a desenvolver técnicas menos danosas aos trabalhadores que vão manipular o novo látex para a indústria de preservativos.

Roberto Feres
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COMENTÁRIOS DE EVANDRO FERREIRA:

Roberto,

Alguns meses atrás tinha conversado com Samonek sobre o assunto e ele ficou de escrever um pequeno artigo sobre o trabalho de tese dele para publicar no blog. Creio que o trabalho dele é de grande importância e muito inovador.

Lembro que na ocasião ele comentou a preocupação que ele tinha sobre o uso da amônia pelos seringueiros. Se não me engano, ele comentou que a incorreta manipulação do látex e da amônia poderia resultar não apenas em danos à saúde dos seringueiros, mas à qualidade do latex e, por tabela, das camisinhas. Isto preocupa porque se algum problema ocorrer e a fábrica tiver problemas de qualidade no produto a ser entregue ao mercado (camisinhas estourarem, por exemplo), todo o esforço e recursos investidos irão por água abaixo.

Sem querer criticar quem está à frente do projeto (FUNTAC), mas acho que o assunto deve ser discutido publicamente. Obviamente que eles devem ter consciência de todos os desafios e, nesta altura do campeonato, respostas para tudo. Entretanto, se fosse eu que estivesse à frente do projeto, adotaria como estratégia para tirar o peso das costas (e da consciência) no caso de um fracasso, uma ampla discussão sobre o andamento do mesmo. Os pesquisadores e técnicos baseados no Acre - e não são poucos - estão aqui para contribuir. Ainda mais em um projeto tão importante como esse.

Evandro Ferreira

FÁBRICA DE CAMISINHAS EM XAPURI 2

FORAM REALIZADOS ESTUDOS DE IMPACTO AMBIENTAL?

Sobre a questão do uso da amônia, o pesquisador Roberto Feres, professor do Departamento de Engenharia da Universidade Federal do Acre, levantou suas preocupações em mensagem enviada aos membros da Rede Acreana de Educação Ambiental. Leia abaixo os comentários de Roberto Feres:

"Porque Amônia?

Recentemente fui da banca de mestrado do Francisco Samonek que trabalhou com um processo de concentração do látex usando Água de Cinzas para elevação do pH (nota do blog: neste caso a cinza seria usada no lugar da amônia).

A amônia seria mesmo necessária no caso das camisinhas?

Que impacto há para as pessoas (nota do blog: os seringueiros) que estão fora dos processos industriais e que terão que manipular produtos químicos em condições tão rudimentares?

Alguns dados para pensar a respeito:

A Amônia

- Ponto de Ebulição: 33,35ºC
- Peso Molecular: 17 g/mol
- Ponto de Fusão: 77,7ºC
- Densidade 20ºC: 0,682 g/cm3
- Aparência e Odor: Gás comprimido liquefeito, incolor, com odor característico.
- Ponto de fulgor: Gás na temperatura ambiente
- Temperatura auto-ignição: 651ºC LIE: 16% LSE: 25%
- Limite de Tolerância: 20 ppm (NR 15, anexo 11)
- IPVS 300 ppm OSHA: 15 min
- STEL: 35 ppm, 24 mg/m3
- ACGIH/TWA: 25 ppm, 17 mg/m3
- NIOSHI: 5 mg: 50 ppm, 35 mg/m3 LT: 20 ppm, 14 mg/m3
- Solubilidade em água: Alta - 1 vol de água dissolve 1300 volumes do gás
- Absorção de calor: Alta - 1,1007 cal/g°C (H2O: 1cal/g°C )

FONTE: OSHA/EUA; NR-15

A amônia, com símbolo químico NH3, é constituída de um átomo de nitrogênio e três de hidrogênio, apresentando-se como gás à temperatura e pressão ambientes. Liquefaz-se sob pressão atmosférica a -33,35 ºC.

É altamente higroscópica e a reação com a água forma NH4OH, hidróxido de amônia, líquido na temperatura ambiente, que possui as mesmas propriedades químicas da soda cáustica. É estável quando armazenada e utilizada em condições normais de estocagem e manuseio.

Acima de 450ºC, pode se decompor, liberando nitrogênio e hidrogênio. É facilmente detectada a partir de pequeníssimas concentrações (5 ppm) no ar pelo seu cheiro "sui-generis".

Apresenta risco moderado de fogo e explosão, quando exposta ao calor ou chama. A presença de óleo e outros materiais combustíveis aumenta o risco de fogo. Em contato com halogênios, boro, 1.2 dicloroetano, óxido de etileno, platina, triclorato de nitrogênio e fortes oxidantes, pode causar reações potencialmente violentas ou explosivas.

Em contato com metais pesados e seus compostos, pode formar produtos explosivos. O contato com cloro e seus compostos, pode resultar na liberação de gás cloroamina. Produz mistura explosiva quando em contato com hidrocarbonetos, sendo também incompatível com aldeído, acético, acroleína, dridrazina e ferrocianeto de potássio.

Entre suas aplicações, destacam-se seus usos como agente refrigerante e na fabricação da uréia, um importante fertilizante. É ainda utilizada na fabricação de têxteis, na manufatura de /Rayon/, na indústria da borracha, na fotografia, na indústria farmacêutica, na fabricação de cerâmicas, corantes e fitas para escrever ou imprimir, na saponificação de gorduras e óleos, como agente neutralizador na indústria de petróleo e como preservativo do látex, entre outras.

O gás é um irritante poderoso das vias respiratórias, olhos e pele. Dependendo do tempo e do nível de exposição podem ocorrer efeitos que vão de irritações leves a severas lesões corporais.

A inalação pode causar dificuldades respiratórias, broncoespasmo, queimadura da mucosa nasal, faringe e laringe, dor no peito e edema pulmonar.

A ingestão causa náusea, vômitos e inchação nos lábios, boca e laringe. A amônia produz, em contato com a pele, dor, eritema e vesiculação. Em altas concentrações, pode haver necrose dos tecidos e queimaduras profundas.

O contato com os olhos em baixas concentrações (10 ppm) resulta em irritação ocular e lacrimejamento. Em concentrações mais altas, pode haver conjuntivite, erosão na córnea e cegueira temporária ou permanente. Reações tardias podem acontecer, como fibrose pulmonar, catarata e atrofia da retina.

A exposição a concentrações acima de 2500 ppm por aproximadamente 30 minutos pode ser fatal.

Dr. Roberto Feres, UFAC, Departamento de Engenharia Civil

26 maio 2006

DESTRUIÇÃO DE BURITIZAIS

ESPECULAÇÃO IMOBILIÁRIA ESTÁ DESTRUINDO BURITIZAIS CENTENÁRIOS NO AMAPÁ

ANEL VIÁRIO VAI TER GRANDE IMPACTO NEGATIVO: É O PREÇO DO PROGRESSO?

As pessoas que vivem em Rio Branco sabem que a região conhecida como "Amapá" é o local onde existem muitos buritizais nativos. Se você ainda não teve a oportunidade de ver um buritizal nativo ao vivo e a cores, sugiro uma visita ao local. É vá logo. Não deixe para depois. Aproveite o período de verão, quando os ramais de chão batido estão em excelente condições de trafegabilidade.

Por que a pressa?

Vejam as imagens. Elas foram tomadas em uma "colônia" de um servidor do Deracre (assim a pessoa que conversei in loco se identificou). A propriedade está localizada ao longo da estrada antiga do Amapá, na altura do km 3 do ramal do "Rodo". O local é rico em barro (argila), material muito valorizado porque é ideal para a construção de estradas e a produção de material cerâmico (telhas e tijolos). Além disso, fica "dentro" do perímetro urbano de nossa cidade. O custo do "frete" é "zero"

Segundo pudemos constatar, houve uma troca. O Deracre, e as empresas que estão fazendo obras na cidade, podem explorar o "barreiro". Em troca, máquinas do mesmo Deracre estão abrindo um grande açude no local. Na imagem dá para ver que o trator de esteiras está tirando barro e a escavadeira está cavando o tal "açude". No dia, o proprietário estava chateado porque a escavadeira não estava trabalhando por falta de combustível.

Entendi as razões dele: o barreiro estava quase no fim. Não vai passar deste verão, se considerarmos o rítmo de retirada de barro. Assim, se o açude não sair antes do fim do barreiro...ele vai ficar na mão.

Infelizmente, tudo está sendo feito bem ao lado do maior buritizal que encontramos na região ao "Amapá". Segundo o dono do barreiro, o buritizal não fica em sua propriedade. Ele pertence ao médico oculista Paulo Veloso.

O mais trágico foi ouvir o proprietário do açude dizer que "agora eu vou ter água boa em minha propriedade!" É trágico porque, como a imagem mostra claramente, o tal "açude" está drenando a água que originalmente mantém vivo o ecossistema representado pelo buritizal. Depois que o buritizal secar, ele vai morrer. Vai ser uma morte lenta e dolorosa. Deve levar uns 3-5 anos, estimo.

Felizmente, esse também vai ser o destino do tal açude, pois, como sabemos, se não houver um igarapé ou outro curso de água para alimentar o mesmo, ele vai virar um enorme tanque que aramazenará água barrenta durante o período das chuvas e secará completamente durante o nosso verão. Bem feito! Aliás, mal feito!

ILHA DE BURITI

As imagens foram tomadas na área do Projeto de Assentamento Benfica, que fica por trás da Vila Acre. Esse tem sido o destino dos buritizais na região: transformação em áreas de pastagens e construção de chácaras de recreação. O irônico é que, por estarem dentro da área urbana, as fazendas locais estão abandonando a criação de gado em razão dos roubos frequentes. Assim, temos como resultado a eliminação dos buritizais e a manutenção de pastos improdutivos. Quanto às chácaras: são também improdutivas pois só servem para os "urbanos" se embebedarem nos finais de semana. Raras são aquelas que podem ser consideradas produtivas. Aliás, queria dizer que a maioria dos assentados do Benfica - e do projeto Colibri, na estrada para Porto Acre - não moram no local. Vivem na cidade. Que tipo de reforma agrária é essa?

21 maio 2006

BURITI E BIODIESEL NO ACRE

Com o apoio da Eletronorte e do Núcleo de Estudo de Fontes de Energias Alternativas Renováveis da Funtac, estamos desenvolvendo um projeto para estudar a viabilidade econômica, ecológica e técnica do uso dos frutos da palmeira buriti (Mauritia flexuosa) para a extração de óleo vegetal visando a produção de biodiesel.

Para isso, estamos realizando um amplo levantamento dos buritizais nativos que sejam acessíveis a partir de Rio Branco. Já visitamos a região do Quixadá, Panorama, Belo Jardim, Amapá e Porto Acre. Em duas semanas estaremos realizando o levantamento na direção da cidade de Sena Madureira.

A idéia do projeto é garantir que os frutos da palmeira, muito usados para o preparo de doces, sorvetes e vinho, possam também ser usados para a produção de biocombustível. Se o projeto tiver o sucesso que imaginamos, estaremos contribuindo, indiretamente, para a preservação dos buritizais nativos.

É que a valorização dos buritizais irá causar um dilema na cabeça dos destruidores ambientais. Antevejo que estas pessoas, antes de avançar contra os buritizais, se perguntarão:

- Será que vale a pena destruir estas palmeiras que poderão garantir renda para mim e minha família?

O projeto pretende determinar o tamanho das populações nativas de buriti. Além disso, vai ser feita uma determinação da proporção de plantas macho e fêmeas (ela é uma espécie dióica), visto que frutos são produzidos apenas pelas plantas femininas.

Outro aspecto importante é indicar quais populações da palmeira são viáveis de serem exploradas. É que o óleo só pode ser tirado da polpa de frutos maduros. Isso significa dizer que o tempo entre a colheita e o processamento dos frutos vai ser muito curto, inviabilizando a exploração de buritizais de difícil acesso ou localizados muito longe de nossa cidade.

A usina de produção de biodiesel está localizada na sede da Funtac, no Distrito Industrial de Rio Branco.

18 maio 2006

SECA NO ACRE EM 2006

SE A SECA CONTINUAR, A COTA DO RIO ACRE EM MAIO VAI SER A MENOR EM 35 ANOS

MENOS ÁGUA NO RIO=MENOS ÁGUA NA FLORESTA=MAIS INFLAMABILIDADE

Colegas,

Recentemente vi que os dados confirmam o que muitos ja falaram: estamos no caminho de repetir a situacao do ano passado na Regiao MAP, ou pior. O Prof. Alejandro já alertou sobre isto em janeiro, mesmo com as chuvas de fevereiro. No jpeg anexo se encontra os niveis (cota) do Rio Acre em Rio Branco. É assustador de ver que este ano, tanto no dia 1 de maio, quanto no dia 15 de maio, a cota do rio foi mais baixa em 2006 do que em 2005. Tambem, menos chuva caiu este mes em Rio Branco.

Creio que precisamos nos preparar para evitar um desastre maior este ano
por os seguintes motivos:

1. Se continuar a mesma tendencia, a cota do Rio Acre do mes de maio
vai ser a menor em 35 anos. Menos agua no rio significa menos agua no
solo disponivel para plantas. Em outras palavras, as florestas vao se
tornar inflamaveis mais cedo do que o ano passado. O ano passado
incendios florestais começaram em agosto e encontraram um pico na 2a
quinenza de setembro e no inicio de outubro. Os incendios so'
terminaram por causa de chuvas.

2. Agora temos mais de 200.000 ha de florestas danificadas por
incendios no leste do Acre e mais que 100.000 ha em Pando. Estas
florestas sao mais suscetiveis ao fogo do que florestas nao
danificadas. Elas vao poder ser queimadas mais cedo neste verao.

Se continuar a falta de chuva, uma previsao seria grandes incendios
ocorrendo em julho e agosto, a menos que controlarmos o pontos de
ignicao. O potencial seria centenas de milhares de hectares queimadas
novamente este ano com custos economicos medidos em dezenas a centenas
de milhoes de reais. Incentivos nao faltam para controlar fogo este
ano, especialmente na area de saude.

Tambem, precisamos nos preparar para combater incendios. Vou conversar
com o pessoal do Corpo de Bombeiros; eles vao estar capacitando
associacoes nos municipios, mas talvez possamos juntar com uma
capacitacao em Rio Branco. Se tiver interesse neste treinamento, por
favor me informam.

Foster

VAI SOBREVIVER?

O remanescente florestal que aparece na foto ao lado foi gravemente afetado pelas queimadas ocorridas no ano passado. Ele fica localizado na área do projeto de Assentamento Benfica, ao longo de um ramal que se inicia ao lado do canil municipal, a partir da margem da rodovia AC-40 (sentido Rio Branco-Senador Guiomard).

Aos leitores que acompanham o blog e já sabem que existem milhares de hectares de florestas nativas afetadas pelo fogo (como as retradas acima) na região leste do Acre: as imagens deste post retratam um caso extremo.

O remanescente florestal era muito pequeno e foi praticamente destruído pelo fogo que foi ateado na área de pastagem que fica em volta do mesmo. Como é possível observar na imagem a abaixo, algumas árvores sobreviveram (especialmente as de grande porte, como a castanheira em primeiro plano), mas a maioria das árvores de pequeno e médio porte está morta e seca. Qualquer incêndio (proposital ou acidental) vai provocar a queima e destruição final deste remanescente florestal.

Casos como este têm o potencial de se repetir em centenas de localidades ao longo da região leste do Acre, onde existem mais de 250 mil hectares de florestas nativas afetadas pelo fogo. Algumas em estado similar ao que mostramos, outras mais intactas.

Como afirmamos em outros artigos, os grande, pequenos e médios produtores rurais que possuem extensas áreas de florestas afetadas pelo fogo podem ficar "tentados" a transformar estas áreas em campos agrícolas sem ter que passar pelos trâmites legais, ou seja, pedir licença do IMAC-IBAMA para derrubar a floresta. Para isto basta que um incêndio "acidental" ocorra no entorno das florestas afetadas. Aqueles mal intencionados já devem até ter jogado - no período das chuvas - sementes de capim no subbosque destas florestas danificadas pelo fogo. Agora as mudas de capim já enraizaram e seguramente vão suportar a queimada da floresta. Assim, sem defesa burocrática (lei que rege as derrubadas) e natural (estão extremamente sucetíveis ao fogo), milhares de hectares de florestas nativas no Acre vão, provavelmente, ser transformadas em pastagem para gado. A seca exagerada que já estamos vivendo vai certamente ajudar que este filme de horror se concretize.

ISTO É DINHEIRO: QUANTO VALE O ACRE?

Quanto vale o Acre

Por Leonardo Attuch
Originalmente publicado na revista Isto É Dinheiro No. 452, de 17.05.2006


Em nova provocação, Evo Morales diz que o Estado foi comprado da Bolívia por um cavalo e prova que desconhece até a própria história

No fim de 1903, um certo Kent começou a assinar misteriosos artigos no Jornal do Commercio, do Rio de Janeiro, em defesa da compra de um território longínquo e desconhecido por grande parte da elite da capital. O Acre, no extremo Oeste brasileiro, havia sido adquirido da Bolívia pela espantosa cifra de 2 milhões de libras esterlinas, após a assinatura do Tratado de Petrópolis. O responsável pela decisão foi o chanceler José Maria da Silva Paranhos Júnior, que entrou para a história com o título de Barão do Rio Branco e como símbolo da boa diplomacia brasileira. O Barão, porém, era alvo de ataques impiedosos na imprensa fluminense, em especial no Correio da Manhã. Isso porque, além da fortuna paga aos bolivianos, o governo brasileiro se comprometera a construir a ferrovia Madeira-Mamoré, que integraria as economias do Brasil e da Bolívia. Por tudo isso, o Barão era acusado do crime de lesa-pátria. Os jornalistas do Correio, por sua vez, diziam que o tratado era uma “mancha negra” na história do País e argumentavam que a ferrovia cairia no abandono – neste segundo ponto, estavam certos, pois a Madeira-Mamoré ficou conhecida como “ferrovia do diabo” e nela morreram 6 mil operários. Tempos depois, descobriu-se que Kent era ninguém menos que o próprio Barão do Rio Branco, usando a pena em defesa dos atos da chancelaria. “O Acre até pouco tempo era a região mais maravilhosamente rica da América do Sul”, escreveu o Barão, num dos artigos. “Aquele solo fertilíssimo foram cidadãos brasileiros que o trabalharam”.

Um século e três anos depois desse embate jornalístico, Evo Morales, o troglodita boliviano que se apossou das refinarias da Petrobras, decidiu atropelar a própria história e desferir mais um ataque ao Brasil. Num discurso na Cúpula América Latina-União Européia, em Viena, na Áustria, Morales disse que o “Acre foi trocado por um cavalo” (Clique aqui para ler a reportagem completa no site da revista ISTO É DINHEIRO).

SECA NO ACRE

FINALMENTE A CHUVA VIRÁ

Parece que a chuva finalmente vai chegar! O site agritempo prevê um dia limpo e sem precipitação para hoje, dia 18, mas a partir de amanhã (e pelos próximos 4 dias) a precipitação prevista vai aliviar o verão antecipado que vivemos.

Segundo a nova previsão, teremos os seguintes valores de precipitação (valores aproximados):
18.05 (Quinta) - 0mm
19.05 (Sexta) - 2mm
20.05 (Sábado) -3,5-4mm
21.05 (Domingo) -7mm
22.05 (Segunda) -7mm

Total para os próximos dias: 20mm (visão mais otimista). Obviamente que previsões acima de 3 dias não são muito confiáveis, mas vamos torcer pelo melhor, ou "vamos torcer pela chuva".

Vejam os mapas de previsão do site Agritempo abaixo.

O site do CTPEC-INPA prevê falta de chuvas para hoje, mas indica pancadas de chuvas para os próximos 3 dias.

























































ATAQUE SELVAGEM

Do Jornal O RIO BRANCO (18.05.2006):


Santa Rosa
Os índios Doca e Mica se acidentaram na única rua da cidade de Santa Rosa do Purus. Eles estavam em uma bicicleta e foram atacados por uma capivara que os jogou à distância. Os indígenas não souberam explicar o porquê da revolta do animal.

Tontos
Tontos, os índios não souberam explicar o que aconteceu. Contaram que eles bebiam em um boteco e o dinheiro acabou. Estava seguindo para casa, por volta das 21h de terça-feira, quando uma capivara deve ter saído da água e ao cruzar a rua acabou por atingi-los.

17 maio 2006

ACRE: SECA EM MAIO

CHUVAS PREVISTA PARA SÁBADO: SITE AGRITEMPO

PANCADAS DE CHUVAS HOJE E NOS PRÓXIMOS DIAS: SITE CTPEC-INPE


Já se passaram mais de quinze dias e o mês de Maio continua muito seco, sem chuvas significativas. A previsão do site Agritempo indica que chuva só no dia 20, sábado. Mesmo assim , por volta de 5 mm. É muito pouco.








O site do CTPEC-INPE (mais popular), indica que teremos "possibilidades" de pancadas de chuvas na Quarta e Quinta. Na Sexta e Sábado o site prevê a ocorrência de pancadas de chuvas.

Em qualquer caso, a quantidade de chuvas vai ser muito limitada.

16 maio 2006

ACREANOS NA BOLÍVIA ("BRASIVIANOS")

Amazônia: um espaço compartilhado - Estudo de caso sobre os “ brasivianos” (*)

Benedita Maria Gomes Esteves
Professora do Departamento de História da UFAC
Pesquisadora Associada do Parque Zoobotânico-PZ

Introdução

Este painel reflete parte dos estudos que estão sendo realizados através de uma pesquisa sobre migrações na fronteira da Amazônia Sul-Ocidental, especificamente, em áreas de extrativismo no Acre (Brasil), Pando (Bolívia) e Madre de Dios (Peru). O estudo de caso sobre os brasileiros que migraram para o Departamento de Pando vem possibilitando uma nova percepção da Amazônia, cuja delimitação geopolítica torna-se uma definição de recorte
político que, se por um lado, define territórios nacionais, por outro esvazia tais espaços de conteúdos sócioambientais.

O conceito de região Amazônica como vem sendo usado, indistintamente, reduz uma das noções básicas das ciências sócias – a de espaço – ao localismo, como se a Amazônia, fosse uma região peculiarmente brasileira, negando a extensa área de floresta contínua que alcança outros países. Tal apropriação não leva em conta as redes de relações estabelecidas entre as populações residentes nestes limites, como índios, caboclos, ribeirinhos e extratores que definiram seus territórios sob outras bases, inclusas na relação com os recursos naturais existentes. Estas populações criaram suas próprias nações. A nação seringueira é uma delas, recortada pela relação homem natureza.

Este trabalho pretende recolocar em discussão o espaço amazônico, tendo como foco os trabalhadores extrativistas a partir das redefinições dos processos de ocupação desta área. Nesse sentido, as migrações ganham significado a medida em que se constata um fluxo permanente de idas e vindas de trabalhadores brasileiros, no campo, na floresta e na periferia das cidades do Acre e de Pando, a procura de terra ou trabalho.

Identificação da área pesquisada

O trabalho de pesquisa concentra-se, na área de extrativismo, em Pando, na Bolívia, para onde migraram 6.000 famílias brasileiras, ou aproximadamente, 30 mil pessoas a procura de condições de trabalho e de terra.

Foram realizadas 260 entrevistas durante os trabalhos de campo da equipe na fronteira – ramal Brasil/Bolívia; nos rios Caramano e Chipamano (Bolívia); periferia do Município de Capixaba (Brasil); entre seringais brasileiros e bolivianos; no Município de Plácido de Castro (Brasil) espaço limite com Montevideo (Bolívia); Brasiléia (Brasil) e Cobija (capital de Pando/Bolívia) e em bairros periféricos da cidade de Rio Branco (Acre). Foram entrevistadas famílias expulsos dos seringais bolivianos, como São Francisco Gavião nos limites com a cidade de Capixaba, Epitaciolândia e Brasiléia, em bairros que começam a se formar; a partir dessa população. Na área pesquisada, próxima a Capixaba, a equipe de pesquisadores presenciou a expulsão de famílias, em áreas de concessões madeireiras, bem como entrevistou líderes de “comunidades indígenas” , trabalhadores de fazendas e trabalhadores de empresas madeireiras.

Os deslocamentos populacionais na fronteira da Amazônia Sul-Ocidental

Os anos caracterizados pelos maiores deslocamentos da populacão brasileira, para Pando, são marcados pelos intensos conflitos por terra, no Acre, período caracterizado pela penetração da frente pecuarista. Hoje, não é somente a perda da propriedade que justifica tais deslocamentos, a procura de trabalho, principalmente, a partir da formação da
mão-de-obra volante, na agricultura, envolvendo os trabalhos de desmatamentos como conseqüência dos processos de ocupação e re-ocupação em ambos os países.

O trabalho como fator de mobilização

Os brasileiros que vivem nestas áreas, têm como principais atividades: o trabalho de extração do látex e a pequena agricultura com 36 %. Essas atividades vão se modificando a medida em que as formas de apropriação dos recursos naturais vão sendo alteradas, a partir das novas formas de uso da terra determinadas pelos interesses de empresários (sobretudo medeireiros) e latifundiários. Tal forma de apropriação vem alterando a dinâmica das populações desde o processo de ocupação da Amazônia, definido a partir da exploração do látex, no início do século XVIII.

No espaço de dois anos, as atividades agrícolas se intensificaram equiparando-se às extrativistas. Surgiram as atividades ligadas aos desmatamentos, como a de peão de fazenda e, ainda, a figura de aposentado, somando mais de 18 %. Esta última categoria que tende a permanecer na floresta, representa uma trajetória peculiar – culturalmente não aceitam viver na cidade e sustentam os filhos desempregados.

Retorno para o Brasil

Vários fatores são explicativos do retorno para o Brasil. Entretanto estes são indicativos dos processos de reconcentração das terras na fronteira internacional, motivada pelos interesses nacionais e multinacionais que impulsionam o desenvolvimento do capitalismo, a partir de uma forma peculiar, onde se expropria trabalhador e se apropriam dos recursos naturais de forma predatória, como foi o caso da exploração da seringueira no Acre, do minério na Bolívia e, é hoje, a extração da madeira e do palmito, em ambos os países.

Essa população tende a permanecer como mão-de-obra volante, desenvolvendo atividades temporárias, na agricultura ou ainda, reduzida a condição de biscateiros,na periferia das cidades.

Conclusão

A fronteira se caracteriza como espaço compartilhado entre as sociedades acreana e pandina:

- Por um espaço socialmente compartilhado, definido pela necessidade de terra e trabalho, pelos migrantes brasileiros e por comunidades bolivianas;

- Pela dimensão social e política das tensões sociais em torno da disputa pela terra;

– Pela forma com a qual os detentores dos capitais, madeireiros e fazendeiros, se apropriam dos recursos naturais e;

– Pelas formas de expropriação de trabalhadores rurais.

(*) Trabalho apresentado durante a 2a. Conferência Internacional da LBA, Manaus-AM, 2002.

ACREANOS NA BOLÍVIA

GOVERNO BOLIVIANO ESPERA REGULARIZAR SITUAÇÃO DE TODOS

TAXA COBRADA É ASTRONÔMICA: R$ 842!

Deu no O GLOBO. Leia o texto abaixo.

Quem conhece a história do "patrão" nos seringais acreanos, fica com a impressão que os bolivianos estão querendo imitar velhas práticas cobrando taxa tão "salgada". Entretanto, é preciso que aqueles que pagarem as taxas fiquem de olhos bem abertos: se o atual governo boliviano rasga contratos de milhões de dólares assinados com empresas petrolíferas, imaginem "acordinhos" feitos com seringueiros empobrecidos...

Bolívia faz campanha para incentivar brasileiros a regularizarem situação

Jairo Barbosa
Especial para o GLOBO

RIO BRANCO e BRASILÉIA (Acre). Os cerca de sete mil brasileiros que vivem ilegalmente em território boliviano serão alvos de uma campanha de esclarecimento o Departamento de Migração da Bolívia, que pretende incentivar a regularização dos imigrantes para permanência em terras bolivianas. A medida foi tomada após o Departamento de Terras da Bolívia verificar a ocupação de grandes áreas rurais por madeireiros e agricultores brasileiros.

A reforma agrária que começará a ser posta em prática até o fim deste mês pelo governo de Evo Morales tem a ilegalidade como um dos quesitos para a expulsão, que pode atingir os agricultores e madeireiros brasileiros. Mas a regularização terá um custo, que dificilmente poderá ser arcado pelos pequenos produtores rurais.

No próximo dia 18, o Departamento de Migração iniciará uma campanha em rádios, TVs e jornais sobre o processo para requerer o visto de permanência. A assessora legal do Departamento de Migração, Lourdes Loredo, disse que a campanha se justifica pela necessidade de o governo boliviano ter controle sobre as áreas exploradas na região de Pando (província que faz divisa com os estados brasileiros de Acre e Rondônia), onde vivem estes cerca de sete mil brasileiros em situação ilegal:

— O governo não pretende expulsar ninguém daqui, mas precisa saber quem são e quantos são os estrangeiros que vivem nessa região.

Para ter direito ao visto de permanência os brasileiros terão que pagar três mil bolivianos ou R$ 842. A maioria dos agricultores não tem recursos para quitar o débito com o país vizinho. A assessora acredita que o governo boliviano terá que encontrar uma saída diplomática para que o relacionamento entre os países não seja afetado.

As exigências da regularização e cobrança da taxa surpreendeu os seringueiros:
— Como eles querem cobrar uma taxa de nós, que dedicamos a vida para explorar essa área e gerar riquezas para eles? O dinheiro que ganho mal dá pra comer, quanto mais para pagar taxas! — disse Dunga Monte, que mora no seringal San José, na Bolívia.

As cidades de Xapuri, Epitaciolândia e Brasiléia, na fronteira do Brasil com a Bolívia, existem mais de 26 seringais, que abrangem terras brasileiras e bolivianas. É onde está parte dos brasileiros em situação irregular.

13 maio 2006

SECA NO ACRE

DADOS METEOROLÓGICOS INDICAM SECA SEVERA EM 2006

Uma comparação dos dados de precipitação acumulada em 2006 e 2005 indicam que teremos uma seca severa na região leste do Acre. Essa afirmação é reforçada pelos dados contidos na publicação de Alejandro Fonseca Duarte (2006), pesquisador da UFAC. Se as chuvas na região não voltarem aos níveis normais nos próximos meses (ver tabela abaixo), a seca deverá ser mais grave do que a verificada em 2005, o "ano da grande seca amazônica".

Se isto se confirmar, vai ser também a "quebra" de uma tradição - expressada nos dados de precipitação colhidos entre 1970 e 2005-, que indicam que as secas na região só acontecem a cada 3 – 4 anos (Duarte, 2006).

Na tabela abaixo (construída a partir de dados do CTPEC-INPE) são apresentados os dados de precipitação pluviométrica acumulados mensalmente em 2005 e nos primeiros meses de 2006. Foi usado como referência a indicação do Pesquisador Duarte para a classificação de "meses muito secos" e os valores da precipitação média calculados a partir de dados coletados entre 1975 e 2004.

Na tabela, é possível observar que em 2005 tivemos 7 meses (Jan, Mar, Maio, Jun, Jul, Ago e Set) com precipitação inferior às médias históricas. Destes, Jan, Jul, Ago e Set foram considerados "muito secos". Em 2006, até o final de abril, tivemos 3 meses com precipitação inferior às médias históricas, dos quais Jan e Mar foram considerados como "muito secos". Em maio, até o dia 13, a precipitação acumulada é de apenas 1 mm!

Tabela (clique para ampliar): os números apresentados na tabela abaixo representam valores de precipitação acumulada (mm).









OBS:
(1). Valores de precipitação mensal calculados para a região leste do Acre que Duarte (2005) classifica como "muito seco". Meses com valores iguais ou inferiores são considerados como muito secos;
(2). Valores médios de chuvas mensais calculados por Duarte (2006) a partir de dados coletados entre 1975 – 2004;
*Valores de precipitação mensal dos anos 2005 e 2006 considerados "muito secos";
**Precipitação acumulada até o dia 13.

EFEITOS NO NÍVEL DO RIO ACRE

O fato do rio Acre, neste mês de Maio, estar com nível inferior ao normalmente verificado para esta época do ano é resultado de dois meses seguidos de precipitações inferiores ao normal (164 e 156 mm, respectivamente). Isto não aconteceu em 2005, conforme se pode observar na tabela acima (219 e 229 mm, respectivamente).

Entretanto, a tendência do nível do rio é acompanhar a tendência das chuvas. Segundo Duarte (2006), "...as cotas do rio acompanham as chuvas, existindo uma defasagem de aproximadamente um mês, quer dizer que a bacia funciona fazendo com que, por exemplo, as chuvas de dezembro se reflitam nas cotas do rio em janeiro, as de janeiro se reflitam nas cotas de fevereiro, e assim sucessivamente.." (Veja gráfico acima, extraído de Duarte, 2006).

Vale ressaltar que nem sempre o nível do rio Acre acompanha a tendência das chuvas. Um exemplo disso foi a enchente deste ano de 2006. Uma comparação dos dados de precipitação nos meses imediatamente anteriores à enchente - Janeiro e Fevereiro - indicam que a diferença entre os anos de 2005 e 2006 foi de apenas 14 mm, ou seja, uma chuva média. Como sabemos, em 2005 não houve enchente.

Referência bibliográfica: Alejandro Fonseca Duarte. 2006. POLUIÇÃO ATMOSFÉRICA EM RIO BRANCO, ACRE. Departamento de Ciências da Natureza, Universidade Federal do Acre (UFAC).

12 maio 2006

FOGO! FOGO! CHAMEM OS BOMBEIROS!

Rio Branco-Ac, 12.05.2006 - 14:34h

Um incêndio em uma área baldia por trás da estrada Dias Martins, está mobilizando um grande número de pessoas. Segundo um dos bombeiros que está combatendo as chamas, tudo começou com o fogo em um monte de lixo e "paus velhos" que uma das moradoras das casas em perigo de pegar fogo resolveu queimar. Ela até que tentou ser cuidadosa, levando o "basculho" para queimar quase na margem da estrada que passa em frente à Fundação Hospitalar. Não adiantou: o vento levou pedaços vegetais em chamas e iniciou o pequeno desastre por tras de sua casa. De lá tudo ficou sem controle.

SECA NO ACRE EM 2006

SECA EM MAIO É SEVERA: APENAS 1 MM DE CHUVAS!

Ontem (11.05) fui ao ramal Granada, no Projeto de Assentamento Padre Peixoto, para uma reunião com o grupo de produtores "Novo Ideal". Para chegar lá se percorre 85 km em asfalto pela BR-364 (em direção a Porto Velho) e cerca de 20 km de ramal em chão batido. No caminho tive o desprazer de observar minha primeira queimada da temporada 2006. Era uma área de floresta afetada pelo fogo no ano passado. Pior foi ouvir dos agricultores que a seca de 2006 vai ser pior do que a do ano de 2005.

Ao retornar resolvi ver como andam as previsões de chuvas para a nossa região. Como o site do CTPEC-INPE parece estar com problemas, recorri ao site Agritempo, mantido pela Embrapa e a Unicamp. Abaixo apresento os gráficos do site mostrando a previsão de chuvas até o dia 15 deste mês. Se a mesma se confirmar, não teremos chuvas até lá.





Considerando que neste mês de maio só houve o acúmulo de 1 mm de chuvas, podemos afirmar que a grande seca de 2006 já começou. Vale lembrar que até o dia 15 do mês de maio de 2005 a precipitação acumulada era de 16,25 mm. O acumulado de chuvas em maio de 2005 foi de 60,75 mm(CTPEC-INPE*).

Isso significa dizer que - não chovendo nos próximos 3 dias-, teremos que torcer para que chova nos 15 dias que restam de maio de 2006 (praticamente) o mesmo que choveu durante todo o mês de maio de 2005!

O que você acha? Será que "as águas vão rolar"?

(*) Existem diferenças entre os dados do site CTPEC-INPA e do Agritempo.

TRATADO DE PETRÓPOLIS

A INCORPORAÇÃO DO ACRE AO BRASIL E O TRATADO DE PETRÓPOLIS

Tendo em vista a polêmica acendida pelo presidente boliviano com o Brasil, acho importante disponibilizar no blog informações sobre alguns tópicos relacionados à incorporação do Acre ao Brasil que agora estão vindo à tona na grande imprensa brasileira. O primeiro assunto a ser tratatado é o "Tratado de Petrópolis". Tomo a liberdade de reproduzir abaixo o texto de autoria de Ivo de Albuquerque, membro do Instituto Histórico de Petrópolis, que resume de forma competente o mesmo.

TRATADO DE PETRÓPOLIS - 100 ANOS - AS LUTAS PELA POSSE DO ACRE

Ivo de Albuquerque

I - ANTECEDENTES HISTÓRICOS

A luta armada que se travou pela posse do Acre e da qual resultou a assinatura do Tratado de Petrópolis em 17 de novembro de 1903 pelos governos do Brasil e da Bolívia, fato histórico de extraordinária relevância que concretizou a incorporação das terras, hoje acreanas, ao território de nosso País, não constituiu,como muitos julgam, um conflito entre as duas Nações. Em verdade, representou ela, em etapas sucessivas durante o período de abril de 1899 a janeiro de 1903, a manifestação patriótica dos brasileiros que, oriundos de diversos pontos do território nacional, principalmente dos Estados do Ceará e Maranhão, pegaram em armas contra a pretendida cessão, pelo governo da Bolívia, a grupos de capitalistas estrangeiros - alemães, ingleses e norte-americanos - de imensa extensão de terras por eles ocupadas e exploradas desde meados do Século XIX e que eram,já objeto de disputa pela Bolívia e pelo Peru .

Os componentes da crise então verificada tinham raízes na indefinição de limites entre o Brasil e a Bolívia, além da prevalência física dos brasileiros na área contestada.Em torno desses antecedentes, pode-se relatar os acontecimentos em conformidade com a seguinte cronologia:

1 . A descoberta do Rio Aquiri ou Acre em 1861 por um caboclo brasileiro ensejou a abertura de novas fronteiras para a extração do látex, já transformado em matéria prima para a promissora indústria da borracha, com utilização cada vez mais intensa pela produção de bens ligados à moda, aos acessórios de vestuário, ao esporte e, sobretudo, à expansão da indústria automobilística, acelerada pelo processo de vulcanização e pela invenção do pneumático.

2 . Em março de 1867, por insistência da Bolívia, foi firmado com o Brasil o Tratado de Ayacucho, ajustando a questão de limites que apresentava, ainda, controvérsias, em face de prescrições constantes dos tratados anteriores de Madri (1750) e Santo Ildefonso (1777, mas que assegurava àquele País andino a posse de grande parte do território que hoje integra o Estado do Acre. A diplomacia brasileira, no entanto, introduziu no referido tratado a disposição de "reconhecer o UTI POSSIDETIS como base para determinação da fronteira entre os seus respectivos territórios" .

3 . Em setembro de 1898 é firmado o Protocolo pelo qual o Governo brasileiro, baseado em relatórios da 2ª Comissão de Demarcação da Fronteira, reconhecia o território, até então sujeito a discussões, como inquestionavelmente boliviano. Em conseqüência, a Bolívia toma posse oficialmente do território, funda sua primeira cidade (Santo Alonso) na região e ali instala uma alfândega.

4 . Os decretos do delegado nacional boliviano regulando a navegação dos rios, tornados abertos "a todas as Nações que têm amizade com a Bolívia", a taxação de impostos sobre a importação em geral, além dos atos de prepotência que geram hostilidades e revolta entre os acreanos, e que passam, então, a conspirar, considerando os bolivianos como usurpadores.

5 . Em fins de abril de 1899, o advogado José Carvalho, à frente de um grupo de doze seringueiros, "em nome do povo deste rio e do povo brasileiro", intima o delegado nacional boliviano a deixar a cidade, "por não mais tolerar o governo que V Excia representa".

II - 1ª INSURREIÇÃO

Ao mesmo tempo, o Governo boliviano celebrava em Londres um acordo de comércio e exportação de borracha, através de um Contrato de Arrendamento do Território de Colônias com um Sindicato de capitalistas estrangeiros denominado Bolivian Syndicate, presidido pelo filho do então Presidente dos Estados Unidos da América.

O teor do documento fora confiado ao espanhol Luiz Galvez Rodrigues de Arias, redator do Jornal "Província do Pará" e funcionário do Consulado boliviano em Belém, a fim de ser vertido para o idioma inglês. O assunto é por ele levado, em sigilo, ao conhecimento do Governador Ramalho Junior, do Amazonas, juntamente com a revelação de seu intento de promover a independência do Acre.

O Governador concorda com a idéia e passa a apoiá-la clandestinamente, fornecendo recursos financeiros, armas, munições, provisões e até um navio especialmente fretado e equipado com um canhão e uma guarnição de vinte homens.

A 14 de julho de 1899, data de comemoração do 110º aniversário da Revolução Francesa, nascia na localidade boliviana de Puerto Alonso o Estado Independente do Acre, organizado sob a forma republicana. Seu Presidente, Luiz Galvez, é recebido com efusão por trabalhadores e patrões, todos dispostos a lutar contra o que consideravam "uma intromissão da Bolívia". Muda o nome da localidade para Porto Acre; cria a Bandeira do novo Estado soberano; nomeia ministros; mobiliza uma valente milícia; baixa decretos importantes; envia despachos a todos os paises da Europa e designa representantes diplomáticos.

Destronado por um de seus súditos em dezembro daquele mesmo ano, reassumiu o poder dois meses após. O Governo brasileiro, no entanto, não reconheceu os direitos do Estado Independente, por considerar o Acre território boliviano. Assim, enviou uma flotilha composta por duas belonaves com a missão de depor Luiz Galvez, o que foi feito em 15 de março de 1900, sendo o mesmo conduzido preso para Recife, de onde retirou-se para a Europa, não mais se tendo notícias a seu respeito.

III - 2ª INSURREIÇÃO

Afastado Luiz Galvez, o domínio boliviano se consolida, sob a garantia de uma poderosa expedição militar que chegou ao Acre em outubro de 1900, tendo à frente o Vice-Presidente da República, NOMEADO Delegado Extraordinário do Acre, e sob o Comando do Ministro da Guerra. Persistia, no entanto, entre os brasileiros, a chama revolucionária, rio abaixo e até Manaus, onde se conjurava abertamente sob a liderança do engenheiro Orlando Correa Lopes, gaúcho impetuoso, eloqüente, que envolvia com suas pregações o próprio Governador do Estado Silvério Nery, o qual, veladamente, se dispôs a apoiar o novo movimento revolucionário surgido, denominado "Expedição Floriano Peixoto".

O grupo de conspiradores é integrado por jornalistas, advogados, políticos, literatos e homens de sociedade do Amazonas e do Pará, totalizando cerca de cento e trinta homens sem nenhuma experiência militar, praticamente "inocentes em matéria bélica e estratégica", à exceção de um ex-aluno da Escola Militar que participara da Campanha de Canudos e um ex-oficial de Marinha.

A liderança do grupo localiza e tenta, em vão, arregimentar o agrimensor Plácido de Castro, cuja fama de herói da Revolução Federalista a todos entusiasma e anima, mas que, para frustração geral, encontra-se, na ocasião, em precárias condições de saúde. Após a saída de Orlando Gomes e seus companheiros de aventura, Plácido a eles se refere como "Os Poetas", expressão que passa a ser doravante utilizada para denominar a insurreição e seus participantes.

Após a aclamação de Rodrigo de Carvalho como Presidente do Estado Independente do Acre em 02 de dezembro na cidade de Lábrea, e sob o Comando do jornalista Orlando Gomes, a expedição se dirige para Caquetá, último ponto a jusante da linha divisória entre o território ocupado e o Estado do Amazonas, onde se encontravam aquartelados os revolucionários remanescentes dos movimentos anteriores, cerca de 20 a 30 homens armados que ainda efetuavam incursões esparsas contra as tropas bolivianas . Agindo de forma precipitada, os Poetas se lançam no dia 24 ao ataque contra as posições fortificadas de Puerto Alonso, sendo desbaratados, em menos de três horas de combate, frente ao poderoso contingente de tropas adversárias, em cujo poder deixaram até o canhão doado pelo Governador Silvério Nery.

O malogro de mais essa tentativa e a ruptura do bloqueio que vinha sendo imposto às tropas bolivianas possibilitaram a estas assegurar uma nova fase de consolidação da soberania de seu País sobre o Acre, fundamentada no direito gerado pelo Tratado de Ayacucho e, agora, pela imposição das armas.A ação revolucionária desenvolvida pelo "Grupo dos Poetas" serviu, no entanto, para despertar a atenção nacional sobre a dramática situação em que se encontravam milhares de brasileiros, ocupando e explorando economicamente terras longínquas da floresta amazônica, disputando-as a ferro e fogo com um país vizinho apoiado por grupos estrangeiros nelas interessados.

IV - 3ª INSURREIÇÃO

Em abril de 1902 chega a Porto Acre o cidadão boliviano Lino Romero, especialmente designado por seu Governo para efetuar a entrega da região aos delegados do Bolivian Syndicate, conforme convênio de arrendamento firmado em Londres, a 11 de junho do ano anterior. A repercussão desses atos no ânimo dos acreanos não se fez tardar e já em 2 de agosto, após reunião dos próceres revolucionários em Caquetá, foi Plácido de Castro aclamado Comandante-em-Chefe das forças a serem organizadas para o combate aos estrangeiros e, de imediato, à frente de trinta e três homens, parte para Xapuri, onde depõe as autoridades bolivianas, proclama a soberania política e institui o novo País sob o nome de Estado Independente do Acre.

No período de 25 de agosto de 1902 a 15 de janeiro de 1903 foram travados renhidos combates nas regiões de Santa Cruz, Volta da Empresa, Igarapé da Bahia, Montevidéu, Bom Destino, Santa Rosa e Costa Rica, culminando com o sítio das tropas e civis bolivianos armados, na região de Porto Acre, sede da Delegacia Nacional, pelos oitocentos homens que àquela altura compunham as forças de Plácido de Castro.

A Bolívia, em revide, organiza uma expedição militar de grande vulto, sob o Comando do próprio Presidente da República, General Juan Manuel Pando, para combater as forças de Plácido de Castro. Em face da repercussão nacional e internacional da vitória das referidas forças, o novo Governo brasileiro do Dr Rodrigues Alves, por seu Chanceler Barão do Rio Branco, cientificou o Governo de La Paz que o Brasil julgava litigiosa a região. Isso significava que a solução deveria ser buscada através de negociações. Em comunicado ao representante brasileiro acreditado junto ao Governo da Bolívia, informou, ainda o Chanceler Rio Branco, estar o Brasil interessado em adquirir todo o território em litígio, mediante compensações, e que o interesse do País consistia em proteger milhares de brasileiros habitantes daquela região por eles desbravada.

Foi, então, enviada uma força do Exército Brasileiro com cerca de três mil homens sob o Comando do General de Divisão Olympio da Silveira, para proceder a ocupação da zona litigiosa no Acre Setentrional, enquanto que ao Governador Plácido de Castro caberia o território do Acre Meridional. A intenção do Governo, conforme acima dito, era prestar socorro aos acreanos diante da reação boliviana e preservar a autoridade e a glória do Comandante vitorioso e já consagrado como herói nacional.

Diante dos sucessos dos acreanos, os integrantes da comitiva do Bolivian Syndicate que vinham assumir o governo da região regressaram apressadamente para Belém, de onde se retiraram de volta para seus paises. O Barão do Rio Branco entrou em entendimentos diplomáticos com os organizadores do mesmo, que acabaram por concordar com a rescisão do contrato mediante uma compensação financeira. Cabe ressaltar, a respeito, a apreciação retrospectiva do eminente historiador Dr. Geraldo Eulálio do Nascimento e Silva, do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro e da Sociedade Brasileira de Direito Internacional, segundo a qual "... é lícito afirmar que a enérgica reação do Brasil contra a instalação do Bolivian Syndicate foi decisiva na preservação da Amazônia. Os exemplos ocorridos na África, onde contratos similares haviam sido assinados, resultaram na brutal destruição do meio ambiente, além de uma posterior transformação da região objeto do contrato em colônia."

Em 21 de março é assinado em La Paz um "modus vivendi" entre o Brasil e a Bolívia, para a suspensão das hostilidades no Acre até que fossem resolvidas as questões de limites. O conhecimento desse Acordo, no entanto, somente chegou até Plácido de Castro após haver ele transferido, em meados de abril, a sede de seu Governo para Xapuri e a Alfândega para Capatará, em face da aproximação das tropas do Presidente General Pando. Travaram-se, ainda, pesados combates na região de Puerto Rico, onde os bolivianos foram isolados e impedidos de avançar ou recuar. A notícia da celebração do acordo em La Paz chegou no momento em que o grosso das forças acreanas se preparava para marchar contra os bolivianos em Gironda.

Cessados os combates, iniciam-se as negociações diplomáticas e, por fim, a Bolívia concorda em ceder ao Brasil a região do Acre, mediante indenizações de dois milhões de libras esterlinas, uma estrada de ferro ligando os dois paises e um porto no Rio Madeira, além de duas áreas fronteiriças desabitadas do Estado de Mato Grosso.

A 17 de novembro de 1903 foi firmado o Tratado de Petrópolis, de extraordinária importância para os Acordos e para a regularização dos limites das terras acreanas e sua anexação ao território brasileiro.

11 maio 2006

DESTRUIÇÃO AMBIENTAL EM PROJETOS DE ASSENTAMENTO NA AMAZÔNIA

ASSENTAMENTOS DE PEQUENOS AGRICULTORES NA AMAZÔNIA SÃO RESPONSÁVEIS POR MAIS DE 15% DA DESTRUIÇÃO VERIFICADA NA REGIÃO

EM 132 ASSENTAMENTOS DE RONDÔNIA: 71% DA COBERTURA FLORESTAL ORIGINAL JÁ FOI DESTRUÍDA

Em março passado fui entrevistado por Andréia Fanzeres, jornalista do excelente site O ECO, que estava preparando uma reportagem sobre a destruição do meio ambiente em áreas de projetos de assentamentos de pequenos agricultores na amazônia. O resultado final ficou excelente (leia a íntegra do mesmo abaixo) e mostra que pouco mais de 15% da destruição causada na região ocorreu nestes projetos de reforma agrária. Particularmente achei a reportagem informativa e inovadora pois pouco se ouve falar dos efeitos ambientais negativos destes projetos de assentamento.

Pois bem. Na semana passada fui convidado para dar uma palestra em um curso de especialização (UFAC-UFPA) no qual deveria abordar a questão da gestão ambiental, enfatizando áreas de assentamento. Não pensei duas vezes em usar o texto de Andréia Fanzeres como um dos dois textos para fomentar a discussão entre os alunos. O texto de Andréia aborda mais os assentamentos convencionais, muito comuns na amazônia. O outro texto foi uma reportagem de Cristina Ávila, também do mesmo site O ECO, que aborda um outro tipo de assentamento pouco comum: os do tipo extrativista. No caso, ela falou do PDS São Salvador, localizado em Mâncio Lima.

A leitura destes dois textos dá uma boa idéia e contrasta os efeitos benéficos e maléficos da gestão de recursos naturais por parte dos assentados. Infelizmente, por questão de agenda, tive tempo para dar a palestra mas não tive como ficar para o debate. Foi aí que a coisa pegou. Entraram pela noite e tiveram que usar uma manhã inteira para encerrar as discussões. Segundo alguns ex-alunos da UFAC que fazem parte da especialização, a maior parte dos alunos paraenses é extremamente simpática ao MST e por esta razão são extremamente sensíveis quando se "coloca o dedo na ferida" ou se toca em assuntos que possam, mesmo que remotamente, comprometer a validade da reforma agrária preconizada pelo referido movimento: assentamentos para pequenos agricultores tipo os do INCRA. Durante os debates me acusaram de ser simpático aos fazendeiros, aos americanos (porque fiz meu mestrado e doutorado nos EUA).

Pena que não pude estar presente na discussão, mas gostei de ter causado toda a polêmica. O que me intrigou foi o fato deles terem "detestado" o texto de Andréia Fanzeres. Terá sido o (ofensivo) título escolhido por ela? "Assentou, detonou" (Leiam abaixo o texto).
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Assentou, detonou
Andreia Fanzeres [andreia@oeco.com.br]
16.03.2006

Exatos 106.580 quilômetros quadrados da floresta amazônica foram encontrados devastados nos assentamentos do Incra criados até 2002. Trata-se de uma área superior ao estado de Pernambuco (em cinza, no mapa ao lado). Esse é um dos resultados de um estudo inédito do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), ainda em fase de conclusão.

O estudo pretende estimar a contribuição da política de assentamentos da reforma agrária no desmatamento da Amazônia. E, segundo o Imazon, a área identificada é equivalente a 15,2% de tudo o que já foi derrubado na região. Os dados não indicam que o Incra seja necessariamente responsável por todo esse desflorestamento, porque as análises não contaram mapas antigos, de antes e depois dos primeiros assentamentos. Mas para quem conhece o histórico do instituto, a associação entre reforma agrária e desmatamento parece clara.

Os 132 assentamentos de Rondônia, por exemplo, devastaram 71% de suas florestas, que originalmente ocupavam 41.860 quilômetros quadrados. No ranking dos estados, o Pará ocupa o segundo lugar, pois destruiu, em seus 406 assentamentos, 52% das florestas que existiam. Mato Grosso vem em seguida, com 48% de destruição em 34.766 quilômetros quadrados de glebas.

O estudo do Imazon, assinado pelos pesquisadores Amintas Brandão Jr. e Carlos Souza Jr., combinou os mapas de assentamentos do Incra com imagens de satélite do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e revelou ainda que, entre 1997 e 2002, em média 76% de todos os lotes para reforma agrária na Amazônia estabeleceram-se onde havia floresta em pé. Apenas 24% deles foram criados em áreas já desmatadas.

Isso não é um problema para Marco Aurélio Pavarino, coordenador de Meio Ambiente do Incra. Ele diz que o fato de haver cobertura florestal não impede o assentamento. “No ano passado, por exemplo, 75% dos assentamentos foram diferenciados, ou seja, agroextrativistas, projetos de desenvolvimento sustentável ou em unidades de conservação”. Pavarino informa que, daqui pra frente, os novos assentamentos do Incra não serão mais aqueles que incentivavam limpeza total da área — coisa que acontecia até bem pouco tempo atrás. E garante que o instituto vai recuperar as áreas já impactadas pelos assentamentos. Pelos números do Imazon, trabalho é o que não vai faltar.

Desastre sócio-ambiental

Exemplos de projetos de assentamentos catastróficos para o meio ambiente (para não falar nos prejuízos aos próprios assentados) existem aos montes pelo país. Aqui mesmo em O Eco, o ornitólogo Fabio Olmos justificou com vários casos como a união de técnicas rudimentares de aproveitamento do solo, a concessão de contratos de compra e venda de terras em áreas protegidas, a geometria inflexível dos assentamentos e o desrespeito ao zoneamento estadual transformaram Rondônia, Tocantins e Maranhão em colchas de retalhos.

O ambientalista Sergio Ricardo de Lima, que passou sua infância num assentamento do Incra próximo a Altamira, no Pará, conta que, como tantas outras famílias, a sua saiu do Rio Grande do Norte no início da década de 70 atraída pela propaganda militar de colonizar a Amazônia. Ele guarda lembranças de árvores queimando por mais de quinze dias sem parar e de ver seu pai planejando mutirões com outros assentados nordestinos para conseguirem escoar o que produziam no meio da floresta derrubada, sem qualquer infra-estrutura. Em dez anos, o projeto de colonização e reforma agrária degringolou. Quase todos os assentados venderam suas terras para fazendeiros paranaenses, que até o começo dos anos 90 haviam transformado as áreas de agricultura familiar em extensas pastagens para pecuária. “Os produtores empobreceram e muitos se mudaram para as favelas de Altamira”, conta.

Recentemente, Evandro Ferreira, agrônomo da Universidade Federal do Acre (Ufac), denunciou em seu blog Ambiente Acreano como está a situação da cobertura vegetal dos lotes de um projeto de assentamento rural em Brasiléia, no leste do estado. Com base em imagens de satélite, ele mostra que nem as áreas de reserva legal são respeitadas. Além disso, muitos assentados vendem seus lotes antes do tempo mínimo requerido pelo Incra, de dez anos, retornando ao instituto com solicitação de novas terras. Para Ferreira, o Acre está trilhando um caminho sem volta. “Sabe aquele ditado ‘Eu sou você amanhã’? É como o Acre deveria se enxergar em relação à vizinha Rondônia”, diz.

Segundo a engenheira agrônoma da Ufac, Sumaia Vasconcelos, grande parte dos assentamentos no Acre apresenta menos que 50% da reserva legal e mata ciliar totalmente destruída. A imagem de um assentamento no município de Acrelândia não deixa dúvidas. Sumaia, que trabalha com monitoramento de queimadas, diz ainda que nos municípios onde existem projetos de assentamento o número de focos de calor detectados por satélite é bastante elevado. “No leste do estado, onde aconteceram 40 dos 60 assentamentos no ano passado, foram registradas mais de 80% das queimadas do Acre”, informa. E a maior parte das áreas com pastagem também está nessa região, que já tem bacias hidrográficas seriamente comprometidas.

“Se os assentados não tiverem orientação e acesso a técnicas mais avançadas, eles vão continuar com a prática de corte e queima”, opina Idemê Gomes Amaral, engenheira agrônoma e especialista em solos do Museu Goeldi, de Belém. Para ela, a falta de apoio para o cultivo e de suporte para o escoamento da produção, além da precariedade das estradas, motivam os pequenos produtores a deixar suas terras logo depois de serem assentados pelo Incra. E isso tem reflexo direto na manutenção das áreas de reserva legal. “Quando eu trabalhava para o Incra, na década de 70, era comum ver que, com dificuldades financeiras, um produtor vendia parte de sua terra para outro — geralmente a parte da reserva legal. O comprador, por sua vez, fragmentava ainda mais o terreno e vendia a sua metade para outro. Aí o percentual de floresta ia diminuindo rapidamente", conta Idemê.

Nos últimos dez anos, dois terços das terras disponibilizadas para reforma agrária no país foram na Amazônia. O coordenador de Meio Ambiente do Incra garante que essa tendência foi revertida. “A região Norte ainda tem o maior número de terras públicas no Brasil e é a área que tem mais demanda por movimentos sociais organizados. Mesmo assim, dos 1.735 projetos de assentamento criados no país entre 2003 e 2005, apenas 26% referiam-se à região amazônica”, explica Marco Aurélio Pavarino. Gilney Viana, secretário de Desenvolvimento Sustentável do Ministério do Meio Ambiente (MMA), acredita que esse número é muito superior. “A Amazônia continua exercendo forte atração para migração. Temos visto um adensamento demográfico nas áreas de fronteira agrícola”, explica.

Promessas

O Incra garante que, desde 2001, sua postura em relação aos impactos ambientais dos assentamentos mudou. De acordo com Pavarino, em 2005 o instituto passou a acompanhar a situação florestal dos lotes através da inclusão de parâmetros ambientais em seu banco de dados, o Sistema de Informações de Projetos de Reforma Agrária (Sipra). Agora, ao definir um assentamento, o Incra tem em seus registros exatamente o que há de Áreas de Preservação Permanentes (APPs), reserva legal e incidência de espécies endêmicas, por exemplo. Até porque cerca de 90% de todos os assentamentos são georreferenciados, segundo informa Pavarino.

Mas, na prática, não funciona bem assim. “Esse sistema ainda está em implantação e apenas um pequeno percentual dos assentamentos conta com uma avaliação desses fatores ambientais”, diz. Ele conta que, além da licença ambiental obrigatória emitida pelos órgãos estaduais, os assentamentos no futuro serão atendidos por gestores ambientais lotados nas superintendências regionais. Por enquanto, a figura que se preocupa formalmente com o meio ambiente no Incra é o “assegurador ambiental”, que deve orientar o assentado a usar sua área seguindo estritamente diretrizes sobre APP, reserva legal e áreas agriculturáveis.

Se a postura em relação aos próximos anos promete se diferenciar, sobre os milhares de assentamentos que já provocaram impactos ambientais o Incra tem a meta de regularizá-los, concedendo-lhes licenças ambientais. Em 2003, o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) firmou um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com o MMA e o Ministério Público Federal para que todos os assentamentos, dentro e fora da Amazônia, tivessem licença ambiental dentro de três anos. O prazo termina em outubro próximo e, até agora, Pavarino estima que metade dos cerca de 4.800 projetos que se enquadram nos termos do TAC tenham dado entrada no processo de licenciamento. “Estamos dispostos a discutir a situação fundiária desses assentamentos antigos, recuperar as áreas devastadas, negociar compensações ambientais e, em casos extremos, remanejar pessoas”.

Pavarino informa que o Incra tem em mãos 26 milhões de reais para recuperar áreas degradadas e assentar em locais impactados em todo o país. Só não se sabe de que forma esse dinheiro vai ser usado. Aliás, não é porque a Amazônia ainda conserva a maior parte das florestas brasileiras que não existem projetos de assentamento ameaçando outros ecossistemas pelo Brasil. Loteamentos dentro de áreas com as raríssimas florestas de araucárias no sul, ou no entorno de unidades de conservação como o Parque Nacional da Serra da Bodoquena e o Parque Estadual das Várzeas do Rio Invinhema, ambas no Mato Grosso do Sul, ou a Reserva de Poço das Antas, no Rio, são apenas alguns dos exemplos de que, no gabinete, o Incra pode até estar traçando estratégias ambientalmente mais responsáveis. Mas elas ainda não chegaram no campo.

Links para as reportagens citadas:
Assentou, detonou - Andréia Fanzeres
Dos estragos, o menor - Cristina Ávila
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OOPPPSS GRAMATICAL:

Altino Machado escreveu:

Evandro,
volta lá e corrige: é ouve e não houve.

"Particularmente achei a reportagem informativa e inovadora pois pouco se houve falar dos efeitos ambientais negativos destes projetos de assentamento".

Dizem que uma vez, na Expoacre, estavam como locutores o Campos Pereira e o Bezerrinha. Campos comandava a trasmissão, quando de repente se formou uma briga. Ele avistava, de longe, o movimento da multidão. E então perguntou:
- Bezerrinha, o que houve aí?
- Eu ouço a Rádio Difusora Acreana, a Voz das Selvas.

Obs: Altino, obrigado.