ANGELIM PEDRA
Família: Fabaceae








Rafael Carvalho/Agência USP de Notícias
Débora, que chegou a cursar Nutrição, conta que a cozinha ficava fora de casa na época da escravidão. “A comida era feita do lado de fora e levada para a sala de jantar”. Isso acontecia porque as refeições da casa eram preparadas pelos escravos e também porque grande quantidade de sujeira e fuligem se acumulava em torno do fogão, na época, a lenha. Segundo a pesquisadora, foi somente a partir da cultura cafeeira que esse retrato mudou — principalmente na região Sudeste do Brasil, área de principal enfoque em seu trabalho. “O dinheiro proveniente do café impulsionou a industrialização e permitiu, entre outras coisas, a chegada do fogão a gás, a mudança de panelas de barro para panelas de alumínio e água encanada. Então a cozinha pôde ser um dos aposentos internos da casa.”
Com o fim da escravidão, a mulher do início do século XX se deparou com uma cozinha dentro de casa, sem escravos para cozinhar as refeições diárias. “Sem os serviçais e podendo utilizar dos benefícios da eletricidade, a mulher começa a cozinhar de um modo diferente, obedecendo a novas regras e costumes”, aponta Débora. Nesse momento, as indústrias alimentícias começam a evoluir no País. Com elas, as propagandas de preparo de alimentos também: ingredientes mais simples e tempo reduzido para cozinhar foram fatores que ganharam força.
Após a Segunda Guerra Mundial, a industrialização crescente no Brasil levou ao crescimento da produção e venda de eletrodomésticos. Dessa forma, também ficou mais simples adicionar outros elementos à culinária brasileira, como os diferentes sabores trazidos por imigrantes. “Italianos e espanhóis eram alguns dos imigrantes que desistiram de viver do trabalho agrícola e se tornaram pequenos comerciantes no Brasil”, conta Débora. “Essa variedade na alimentação chega até os dias de hoje, especialmente em São Paulo, em que se come todos os tipos de comida.”
Inovações
Com a evolução da gastronomia, chega-se ao que Débora chama de comida contemporânea. Segundo ela, a comida passou a ditar um nível social. “Se você sai de casa para apreciar uma comida que não é usual, você é uma pessoa diferenciada”. Débora também conta que não é só a comida gourmet que dita essa diferenciação. “Um escondidinho de carne seca é nada menos do que charque e purê de mandioca. Ao gratinar a comida e colocá-la em uma porção individual, ela ganha outra identidade”, explica.
A comida orgânica também assume um novo papel. “Uma salada quente, usando ingredientes como quinoa, já define como a cozinha orgânica evoluiu. E a partir daí vão se desenvolvendo ‘tribos’, cada uma com seu gosto culinário”. Débora explica que, por causa disso, as indústrias alimentícias também trabalham o conceito de “comida ética”, que informa o consumidor que a carne vem de um animal que foi criado solto, ou que a industrialização de algum alimento não utilizou mão-de-obra infantil, por exemplo.
Por fim, a pesquisadora conta que as classes sociais também traçam seus perfis por meio dos alimentos que compram. “A indústria de alimentos passa a ser uma indústria de conveniência que quer atingir melhor as classes A e B e também influenciar a crescente classe C”. Segundo Débora, as pessoas com maior poder aquisitivo são aquelas que buscam, nos alimentos semiprontos, uma comida com mais glamour e mais saudável. “São pessoas que leem rótulos e que querem saber o que estão comendo”. A classe C, em contrapartida, busca aquilo que via as classes A e B consumirem. Ela é o grande público-alvo das indústrias de alimentos atualmente, para que essas possam garantir grande volume de compra. “Ao contrário das pessoas que já estão cansadas de comprar lasanhas instantâneas, as que integram a classe C buscam esse tipo de alimento, já que agora podem comprá-lo.”
Josias de Souza
Folha de S. Paulo
Depois da muda, ocorrida há coisa de duas semanas, José Serra voa sobre a campanha com aparência renovada.
De tucano, Serra converteu-se em carcará –aquele pássaro malvado que pega, mata e come.
Em sua nova fornada de números, divulgada na noite desta sexta (10), o Datafolha informa: não funcionou.
Serra vive o seu momento pânico. Já experimentou de tudo. Na fase tucana, o bico grande, bonito e doce revelou-se inútil.
Com o bico de carcará –pequeno, pontudo e perverso— serviu veneno a uma platéia que pede a continuidade do pudim.
O vaivém de Serra pode ser visto de dois ângulos. Num, positivo, o observador é tentado a concluir que o candidato não tinha alternativas.
Enquanto deu, posou de oposicionista light. Quando os amigos e a família foram ao caldeirão da Receita Federal, elevou o tom.
Noutro ângulo, negativo, enxerga-se um candidato errático e oportunista. Errático por tentar se apropriar do legado que o dono do testamento diz ser de outra.
Oportunista por ter alardeado só agora uma violação de sigilo que admite conhecer desde janeiro, quando diz ter “alertado” Lula.
Seja como for, independentemente da lupa que se utilize, o resultado é a visão de um Serra batido.
Considerando-se os grandes números do Datafolha, o quadro é estacionário. Na última semana, Dilma reteve seus 50% e Serra escorregou de 28% para 27%.
Mergulando-se no miolo do relatório do instituto, descobre-se a existência de movimento.
O problema é que, nos pontos em que se mexeram, os números sorriram ora para Dilma ora para Marina, jamais para Serra.
Sorriram para Dilma, por exemplo, em Pernambuco e na Bahia. Entre os pernambucanos, ela foi de 64% para 67%. Serra, de 21% para 18%.
Entre os baianos ela subiu de 60% para 64%. Ele desceu de 22% para 18%.
Dilma caiu cinco pontos percentuais na faixa de eleitores com escolaridade superior. Para onde foram os votos? Quatro pontos percentuais engordaram o cesto de Marina.
Dilma despencou sete pontos entre os eleitores de maior renda familiar. Nesse universo, Marina beliscou seis pontos percentuais.
Disseminou-se a percepção de que, em matéria de sucessão presidencial, Serra é mesmo um político azarado.
Em 2002, época em que sopravam os ventos da mudança, cavalgava a continuidade. Em 2010, tempo de continuidade, encarna a mudança.
Numa leitura condescendente do processo, pode-se dizer que, hoje, o adversário de Serra é Lula, não Dilma. Tomado pelo Datafolha, Lula é um eleitor notável.
Quase metade do eleitorado (45%) declara que, “com certeza”, vota em quem o presidente indicar. Outros 18% afirmam que “talvez” votem no indicado de Lula.
Somando-se os dois percentuais chega-se ao potencial de transferência de votos de Lula para Dilma: 63%.
Sobram para Serra os 29% que rejeitam o nome apontado pelo “dedaço” de Lula. Um contingente que ele tem que dividir com Marina.
Numa análise menos edulcorada da campanha, chega-se à conclusão de que o problema de Serra não é Lula nem Dilma, mas o eleitor.
O dono do voto informa, uma pesquisa atrás da outra, que não deseja Serra. É como se dissesse ao pesquisador: "Não me importune mais com suas perguntas. Já decidi".
A 23 dias do fatídico 3 de outubro, vive-se sob a égide da precipitação. Lula antecipara a campanha em mais de dois anos.
E o eleitor, contente com a atmosfera benfazeja em que se misturam as bolsas e o crescimento econômico, parece ávido por antecipar o resultado.
Há uma semana, 69% achavam que Dilma vence. Hoje, compartilham dessa idéia 72%.
Na conta do Datafolha, somados apenas os votos válidos, Dilma fica com 56%. Ou seja, o triunfo pode chegar no primeiro turno.